JORGE NUNO |
Em plenos Jogos Olímpicos (JO), antecipo algo que me toca profundamente: os Jogos Paralímpicos (JP)! Num dos cartazes dos JP pode ler-se a seguinte mensagem: “Atletas paralímpicos: A pista é igual, a dedicação é igual. O objetivo é igual. Enfim, é tudo igual”.
Entendo que este Jogos “especiais” são o expoente máximo para pessoas com deficiência, seja física ou mental, já que são a oportunidade de uma vida. Tento imaginar o seu forte empenhamento pessoal, ao longo de anos, na prática de uma modalidade desportiva, para a qual terão talento e muita paixão, sempre com a esperança de conseguirem essa oportunidade. Tento imaginar o estupendo trabalho dos seus mentores e equipas de apoio, para os fazer sentir pessoas completas, apesar das suas deficiências. Tento imaginar os sonhos que irão carregar nas malas e que mantêm “vivos” estes atletas “especiais”. Tento imaginar a sua felicidade e dos seus familiares quando, em nome de Portugal (ou de outro país natal), recebem as merecidas medalhas.
Portugal participa regularmente nos JP desde 1984, embora a primeira participação seja de 1972. A cada quatro anos, a seguir aos JO, os atletas paralímpicos portugueses superam todas as expetativas, pois tem sido corrente conquistarem uma medalha por cada três atletas. Bem se pode afirmar que “estamos na elite do desporto para pessoas com deficiência”. No site do Comité Paralímpico de Portugal, além de apreciar o bom gosto da capa, que refere a frase “Igualdade, Inclusão e Excelência Desportiva”, fica-se a saber que participámos em 9 JP, com 264 atletas e já conquistámos 25 medalhas de ouro, 31 de prata e 25 de bronze. Fica-se também a saber que a distribuição das medalhas obtidas nas várias modalidades é a seguinte: 51 no atletismo; 24 no boccia; 9 na natação; 2 no ciclismo; 1 no futebol e 1 no ténis de mesa.
Ao fazer esta referência elogiosa à entrega e feitos desportivos dos atletas portugueses, portadores de deficiência, é evidente que a mesma será extensiva aos atletas de todo o mundo, nas mesmas circunstâncias e em igualdade de oportunidades. Daí estranhar, até certo ponto, que o Comité Paralímpico Russo (CPR) tivesse sido suspenso dos JO do Rio 2016, provisoriamente e como solução radical, pelo Comité Paralímpico Internacional (IPC), com base no Relatório McLaren. Este relatório foi elaborado por uma comissão independente da Agência Mundial Antidoping (WADA) e revela a existência de “doping organizado” na Federação Russa. O canadiano Richard Mclaren, responsável do relatório, refere o seguinte: “O Estado russo, através do ministério dos Desportos e contando com a assistência da polícia secreta (FSB) organizou, entre finais de agosto de 2011 e agosto de 2015, pelo menos um sistema que pode designar-se como metodologia de positivos que desaparecem para proteger os desportistas submetidos ao doping organizado”, fazendo constar que terão desaparecido 35 amostras no desporto paralímpico entre os anos mencionados. Deste modo, os atletas paralímpicos russos (na totalidade) ficam impedidos de participar nestes JP, que se realizam entre 7 e 18 de setembro de 2016.
Tento imaginar como aqueles atletas se sentirão agora, ao ver cair por terra a possibilidade de participação. Ainda mais ao saberem que Philip Craven, responsável do IPC, terá referido que “esta situação não tem a ver com atletas trapaceiros, mas de um sistema estatal que trapaceia”.
Entretanto, o presidente do CPR, Vladimir Lukin, não concorda com a decisão, que considera “desumana” e “injusta” [para os atletas] e disse que vai recorrer para o Tribunal Arbitral do Desporto (TAS). Ficaremos a aguardar a decisão do TAS…
O cientista Ronald Evans, a desenvolver atividade no Gene Expression – Laboratory Genetics, nos EUA, afirmou que há medicamentos específicos [leia-se “drogas legais”], que “melhoram a circulação sanguínea, melhoram o oxigénio nos músculos, logo, melhoram aperformance”, para rematar: “se não forem proibidos, os atletas usam-nos”.
Uma das substâncias, considerada agora dopante, que viria a ser proibida a partir de 1 de janeiro de 2016, é o Meldonium, que viria a original um controlo positivo e o afastamento da tenista russa Maria Sharapova, impedindo-a de participar nestes JO. Curioso, no mínimo, é o facto do cientista Ivars Kalvins – licenciado pela Faculdade de Química da Universidade da Letónia, membro da Academia de Ciências da Letónia e inventor do referido “medicamento” – ter assegurado, em abril de 2016, que “os atletas masculinos tomaram a substância, não como potenciador desportivo, mas para melhorar o seu desempenho sexual”. Um estudo científico publicado pelo Centro Nacional para Informação Biotecnológica (NCBI) revela que o Meldonium provoca o “aumento da resistência dos atletas, o melhoramento na recuperação após os treinos e funciona como um anti-stress, melhorando ainda as ativações do sistema nervoso”.
O presidente da Rússia, Vladimir Putin, afirmou a uma estação de televisão russa, já depois de rebentar o escândalo, que este produto “não é uma substância dopante”, mas apenas “mantém em boa forma o músculo cardíaco, quando este é submetido a grandes esforços”.
Apetece dizer: mas se este ”medicamento” tem vindo a ser comercializado no mercado negro… certamente, não será apenas para fins medicinais!
Como seria fácil de prever, nestes JO não há tréguas, com tanta suspeição e acusação, relacionadas com doping. É o caso na modalidade de natação, com a nadadora russa, Yulia Efimova. Esta, tem antecedentes de doping, esteve inicialmente suspensa dos JO Rio 2016 e depois viu admitida a sua participação. Ao subir ao pódio para receber a medalha de prata, foi vaiada pelo público e, depois, criticada por vários atletas da modalidade, com destaque para a vencedora da final de 100 m bruços – a americana Lilly King – que referiu: “As pessoas que foram apanhadas com doping não deviam fazer parte dos Jogos”; e algo semelhante disse o mítico nadador Michael Phelps (que já ganhou 25 medalhas, sendo 21 de ouro).
Também o nadador chinês, Sun Yang, foi verbalmente atacado por um coro de protestos, após ter ganho a medalha de ouro nos 200 m livres e prata nos 400 m livres, de que é exemplo a frase do nadador francês, Camille Lacourt: “Enoja-me ver aldrabões no pódio”.
Outro caso preocupante – e que ainda vai dar muito que falar – centra-se na modalidade de ginástica artística e na estratégia usada para que atletas mantenham altura e peso baixíssimos para a idade. É disso que a China é acusada: forçar para que atletas não tenham um crescimento normal. Pegando apenas em 4 exemplos, com indicação do nome, idade, altura e peso de ginastas chinesas que obtiveram a medalha de bronze, por equipas: Wang Chunsong – 20 anos, 1,40 m e 35 kg; Wang Yan – 16 anos, 1,40 m e 33 kg; Tan Jiaxin – 19 anos, 1,48 m e 36 kg; Yilin Fan – 16 anos, 1,48, 37 kg.
Para ajudar a entender, registo a pesquisa feita pela Escola de Educação de Educação Física e Esportes, da Universidade de São Paulo, tendo como elemento de estudo 51 ginastas, ex-atletas de alto rendimento e respetivos familiares. O estudo revelou que “a grande maioria alcançou ou superou o potencial de estatura esperado”. O investigador, Raul Alves Ferreira Filho – que preparou a dissertação de mestrado sobre esta matéria e foi técnico de ginastas durante 15 anos – disse não haver “ligação entre a modalidade e problemas de crescimento. O que acontece é que as ginastas que são mais baixas por uma caraterística própria apresentam um biótipo mais favorável à execução dos movimentos (…) um físico de menor porte atende melhor às exigências da biomecânica para fazer alavanca e vencer a inércia.
A China, sabendo disso, tudo fará para manter a estatura das atletas, mesmo que seja contranatura, e assim conseguir lugares no pódio.
Trapaça atrás de trapaça, vaias quando soa o hino na hora de receber medalhas, acérrimas críticas aos prevaricadores por adversários, estratégias governamentais prejudiciais à saúde e ao desenvolvimento harmonioso do atleta…
Atletas paralímpicos, ainda vão a tempo. Falta menos de um mês. Mostrem a vossa garra e a grandeza de competir de forma limpa. Está na hora de dar o exemplo e fazer acreditar no espírito olímpico!
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