sábado, 27 de agosto de 2016

SÓ FALTOU UM BOCADINHO ASSIM…

JORGE NUNO 
Após 19 dias de competição, terminaram os Jogos Olímpicos (JO) no Rio de Janeiro. Estiveram em disputa 42 modalidades, em 306 provas, que valeram 136 medalhas para atletas femininas, 161 para atletas masculinos e 9 para mistos. Neles, estiveram envolvidos os melhores atletas do mundo, de todas as modalidades acreditadas.

Muitas dúvidas pairavam no ar quanto à capacidade organizadora do Brasil num evento desta grandeza – tão só, o maior acontecimento desportivo à face da Terra! Antes da chegada dos atletas à “aldeia olímpica” eram bem visíveis as preocupações relacionadas com a segurança e com as queixas apresentadas por algumas delegações. Houve quem aproveitasse a ocasião mediática do evento para, na cidade de acolhimento, denunciar a insatisfação com políticas internas e com os gastos exagerados com as infraestruturas dos JO. No final dos mesmos, o presidente do Comité Olímpico Internacional (COI) disse ter sido um desafio ganho e deu ênfase ao saldo positivo.   

Reconheço ter vibrado, entusiasticamente, com a cerimónia de abertura, também com algumas modalidades (para referir apenas, a título de exemplo, a espetacularidade e perfeição na natação sincronizada e na ginástica rítmica) e com os feitos desportivos, particularmente, pelos recordes olímpicos e mundiais que foram batidos. Realço modalidades como: ciclismo (sendo aqui, importante o trabalho de cientistas, relacionado com o piso, tecnologias e equipamentos, que redunda numa melhoria da performance e consequente sucesso desportivo, verificado nos 19 recordes olímpicos batidos); atletismo, com recordes nas categorias de 400 m, 3000 m obstáculos, 5000 m e 10000 m; natação, com 24 recordes olímpicos e 7 mundiais, em categorias como 100 m peito, 100 m costas, 800 m e 400 m livre, 100 m borboleta, 400 m medley e 400x100 m livre…

Senti um misto de satisfação e tristeza, por ver uma equipa representativa da autodenominada “Nação de Refugiados”. Satisfação por, em boa hora, o COI ter aceitado a sugestão de dois publicitários brasileiros, a residir nos EUA, de criar esta equipa; haver uma bandeira (ainda não reconhecida oficialmente pelo COI, mas com uma campanha apoiada pela Amnistia Internacional), a qual foi elaborada e proposta pela síria Yara Said (ela própria uma refugiada, a viver na Holanda), sendo cor de laranja o fundo da bandeira, com uma risca horizontal preta, que teve inspiração nos coletes salva-vidas usados por todos aqueles que, em condições de grande fragilidade, veem necessidade de atravessar o Mediterrâneo em busca de segurança na Europa; haver um hino, composto pelo sírio Moutaz Arian (também ele refugiado, a viver na Turquia), que não incluiu uma letra, propositadamente, por entender que a música, ao ser universal, “não precisa de ser traduzida”.
Senti tristeza, por todos os atletas incluídos nesta suposta nação não poderem representar os seus reais países de origem, em paz e nas mesmas condições dos demais atletas olímpicos.
Senti tristeza e preocupação pelo “simples” cruzar de punhos na meta da maratona, gesto feito pelo atleta etíope Feyisa Lilesa, medalha de prata na prova. Viria, de seguida, prestar declarações à imprensa, afirmando tratar-se de um protesto contra a repressão na Etiópia e um “sinal de apoio aos manifestantes do meu país que foram mortos pelo governo”, para completar: “talvez seja morto quando chegar, ou então preso”, deixando escapar [nas entrelinhas] que poderia ser mais um refugiado.

A delegação portuguesa foi a terceira maior de sempre em JO, sendo a maior de sempre no setor feminino. Só o facto de merecer o direito de estar nesta grandiosa competição e representar o país, é uma oportunidade, uma honra e motivo de orgulho, por ser apenas acessível aos melhores. Depois da recente vitória de Portugal no Campeonato da Europa de Futebol, os holofotes e a esperança estava em cerca de uma dezena de atletas portugueses, que têm revelado um alto rendimento nos últimos anos, medalhados em campeonatos europeus e mundiais. Em termos de resultados finais da participação portuguesa no JO, pode afirmar-se que se esperava mais; e pelo seu esforço e dedicação, bem mereciam. Numa das provas de canoagem, mesmo ao meu lado, ouvi o comentário: “Eia… só faltou um bocadinho!”. Naquele momento, intimamente, também foi isso que pensei. Curiosamente, vim a saber que o canoísta João Ribeiro (envolvido na prova) também disse que “faltou um bocadinho”. Na verdade, bastavam poucos milésimos de segundo para uma medalha em K2 1000 m.

José Manuel Constantino, presidente do Comité Olímpico Português, assumiu total responsabilidade perante os resultados alcançados, que ficaram “aquém das nossas expetativas”, disse, uma vez que “dos três objetivos [traçados] apenas um foi cumprido”. Já José Garcia, chefe de missão, disse estar “extremamente orgulhoso” com a comitiva portuguesa, liderada por ele, e referiu que “o balanço é positivo”, realçando que esta “foi a melhor prestação de sempre em termos de resultados nos seis primeiros”, com dezanove atletas no “top 10” e dez entre os seis melhores.

O saldo da participação portuguesa, em termos de medalhas, ficou por uma de bronze, obtida pela Telma Monteiro, em judo, categoria de – 57 kg (cerca de cinco meses depois de uma lesão, que obrigou a uma operação ao joelho esquerdo, mostrando que é uma mulher com garra). Também, foram atribuídos dez diplomas olímpicos aos seguintes atletas portugueses: Emanuel Silva e João Ribeiro, 4.º lugar em canoagem / K2 1000 m; Fernando Pimenta, 5.º lugar em canoagem / K1 1000 m; Marcos Freitas, 5.º lugar em ténis de mesa; João Pereira, 5.º lugar em triatlo; equipa composta por Fernando Pimenta, Emanuel Silva, João Ribeiro e David Fernandes, 6.º lugar em k4 1000 m (batendo o recorde nacional); Ana Cabecinha, 6.º lugar em 20 km marcha; seleção olímpica de futebol; Patrícia Mamona, 6.º lugar em triplo salto (com recorde nacional, apesar de se sentir prejudicada pela excitação no estádio, com a atuação simultânea do velocista jamaicano Usain Bolt), e Nelson Évora, 6.º lugar em triplo salto (apesar das várias lesões que teve, desde 2012, uma delas com gravidade, que faz deste atleta um exemplo de tenacidade perante a adversidade); Nelson Oliveira, 7.º lugar em ciclismo /contrarrelógio. 

Como bom compatriota e amante do desporto, cheguei a pensar na alegria coletiva se retirasse 29,5 segundos à minha esperança de vida, e os pudesse transferir para benefício da performance de um reduzido número de nossos atletas olímpicos, nas modalidades de canoagem, triatlo e 20 km marcha. Bastaria meio segundo da minha vida para a prova de Emanuel Silva e João Ribeiro; dois segundos para a de Fernando Pimenta; sete segundos, para a prova da nossa equipa de k4; nove segundos para a de João Pereira; e onze segundos para a de Ana Cabecinha. A ser assim, hoje estaríamos profunda e egoisticamente orgulhosos dos nossos atletas, por ver Portugal subir noranking das medalhas olímpicas. O saudoso professor Moniz Pereira, seguramente, seria um deles, ainda mais se o atletismo se destacasse.

Acredito que os atletas para obterem alta performance necessitam de talento, paixão pela modalidade, apoios e muito… muito treino. Com um pouco mais de apoio oficial, os nossos atletas terão estes ingredientes. Parece que “só faltou um bocadinho assim…”, mas da minha parte só posso dizer: Parabéns, atletas olímpicos!

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