quinta-feira, 1 de setembro de 2016

CRÓNICA DE VIAGEM # AMARANTE - # ZAMORA - # TORDESILHAS - # MADRID

ANABELA BORGES
Desta vez, decidimos fazer a viagem de carro. Deste modo, poderíamos aproveitar para conhecer algumas cidades que nos ficariam em caminho, ou próximas, de Madrid.

Partimos de Amarante, rumo a Trás-os-Montes, em busca de passar essa linha imaginária que separa os dois países ibéricos, vulgo “fronteira”. Já tínhamos realizado alguns percursos Portugal-Espanha, mas nunca o tínhamos feito por Bragança.
A viagem foi rápida, cortando as goelas do grandioso Marão, graças ao famoso túnel, maravilha da engenharia de ponta dos tempos modernos. 
Para trás, ia ficando um rumor de campos desertos, de velho, cenários vazios e secos, de palha, como é costume apresentarem-se no Verão. Tudo ia ficando para trás, rápido e oblíquo, como aves silenciosas. Ficavam também para trás os nomes dos lugares por onde passávamos, uns que já conhecíamos e outros que não, como Mouçós, em Vila Real, a bela aldeia de Romeu, já em Mirandela, a famosa aldeia de Podence, assim como Pinela, Portelo, Quintanilha, Rossas…

Já levávamos cerca de duas horas de caminho. Saíramos cedo e já havia fome. Pelas dez da manhã, eis-nos chegados à primeira paragem: Zamora.
Como íamos destreinados de vocabulário, tivemos logo ali um pequeno embaraço. Entrámos num café-bar. Queríamos pedir o pequeno-almoço, mas a palavra almoço soou estranha ao castelhano, por lhe parecer que seria ainda cedo para o almuerzo. Ora, eu tinha a palavra certa para pequeno-almoço a desenrolar-se debaixo da língua, mas desenrolou-se mal e em vez de desayuno saiu-me desarollo. Como não estava a compreender o desenvolvimento do diálogo, o senhor do café apresentou uma expressão de puro espanto, mas logo associou a palavra trocada ao termo certo, e, pronto, lá fizemos o desayuno com grande satisfação. Não se falou mais do embaraço, não fosse o senhor pensar que eu estava embarazada (enfim).
Naquele mesmo momento, fiz logo o que devia ter feito em casa quando me dediquei a preparar a viagem: instalei, no smartphone, uma aplicação com um dicionário de espanhol, para evitar, futuramente, dizer mais disparates. Esqueço-me sempre de que o castelhano é fácil de compreender enquanto língua, muito semelhante ao português na sua formação, mas muito diverso no vocabulário. Assim, não passei mais vergonhas em terras de Espanha, nem fiz figuras tristes, para pedir um garfo, ou uma faca, ou uma colher, ou assim (experimentem!).

Zamora é uma cidade pequena e acolhedora, na envolvência do românico que a caracteriza. Os seus habitantes são simpáticos e cordiais.
Passeámos por las calles, avistando o belo casario, com tudo muito bem preservado, com o castelo, a catedral, o palácio de Dona Urraca, a imponente estátua de Viriato, e o rio Douro, correndo para o nosso Portugal, ali mesmo aos pés da cidade.
Foi uma visita curta e agradável. Havia ainda muitos quilómetros pela frente.
Continuámos viagem.

Segunda paragem: Tordesilhas.
Ora, Tordesilhas, Tordesilhas, nome sonante da História. Mas: histórias! (Já vos vou contar tudo).
Chegámos a esta cidade por volta das duas da tarde. Levávamos farnel (desconfio que foi a nossa safa) e fomos comê-lo num um belo jardim, com gatos por companhia, num alto da cidade, de onde avistávamos a ponte romana e estávamos, mais uma vez, com o belo Douro aos pés, vagarosamente correndo para o nosso Portugal.
Belo jardim! Bela paisagem!
Depois dessa agradável pausa para almoço, fomos a pé em direcção à Plaza Mayor, em busca de um café. Andando por las calles, fomos verificando a forte influência árabe deixada nessas paragens, por demais marcante, mas não muito preservada, dando sinais de desgaste, em muitos casos com edifícios de rara beleza a necessitar de urgente intervenção.
Azar dos cabrais, como é costume dizer-se na minha terra, não foi fácil encontrar um café que servisse café. Tordesilhas mais parecia uma cidade fantasma àquela hora do dia. Quem nos mandou?
Quem nos mandou querer visitar a cidade àquela hora?
Banhos árabes, mosteiro de Santa Clara, capela de Alderete, Casa-Museu do Tratado, (senhores!), entre outros monumentos, foram todos visitados… por fora. Maldita siesta!
Sempre pensei, tive a esperança, vá, que esses lugares “para turista visitar” se mantivessem abertos na hora da sesta. Mas não. Tudo fechado, igrejas e tudo. É uma situação um tanto ou quanto incompreensível, mas nada poderíamos fazer.
Não deixou de ter o seu encanto o facto de nos encontrarmos no local onde, em 1494, uma embaixada dos reis católicos e outra de D. João II dividiu o mundo conhecido e por conhecer em duas metades, como se de uma laranja se tratasse.
E foi de grande proveito o passeio pelas ruas estreitas e antigas, assim como a apreciação da belíssima escultura “mãos e tronco” de homenagem à princesa Joana, a Louca, que estava ali, imponente, no alto da cidade para nos receber, essa que depois foi rainha e, considerada louca, foi destituída e mantida em cativeiro, num castelo em Tordesilhas, durante 51 anos, até à hora da sua morte.

Seguimos viagem. O dia estava quente e seco, avistávamos planícies e mais planícies a perder de vista, dando, por vezes, a estranha ilusão de que se distinguia o mar no horizonte. Lá fomos, naqueles rumos perdidos na imensidão geográfica. A próxima paragem, e a mais ansiada, estava ainda longe.
Aguardava-nos Madrid.

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