MOREIRA DA SILVA |
No contexto, por vezes, meloso e hipócrita do mundo atual é mais fácil gostar-se da conversa da treta e fazer proselitismo do que louvarmos e afirmarmos o que o nosso país tem de melhor. A pestilência da política, que muitas vezes utiliza palavras com a violência de farpas afiadas não está interessada nas coisas positivas que temos, que fazemos, que tivemos e que fizemos. E são tantas coisas com que nos podemos orgulhar, mas para isso é preciso termos uma mente aberta. Uma sociedade aberta começa com uma mente aberta.
Todos nós precisamos de vez em quando que o nosso ego seja massajado e também o nosso ego coletivo, o nosso ego de portugueses. Sabe bem lermos um escritor estrangeiro, neste caso inglês a enaltecer algumas fases da História de Portugal. Tudo isto pode ser encontrado num livro muito bem escrito, que numa visita cordial e plena de simpatia, um amigo teve a amabilidade de me oferecer. O livro “A primeira Aldeia Global – Como Portugal Mudou o Mundo” escrito por Martin Page, revela algumas agradáveis surpresas, algumas novidades e também ajuda a dissipar o nevoeiro saudosista do sebastianismo.
Martin Page (1938 – 2005) nasceu em Londres e em 1988 e enquanto escrevia, nos Estados Unidos, o guião para um filme, foi declarado oficialmente cego. Mudou-se para Portugal com a sua mulher, Catherine, uma produtora de teatro para televisão da BBC, e os seus dois filhos e instalou-se na Azóia, uma aldeia perto de Lisboa, onde escreveu “The First Global Village”.
Todo o livro é sobre a Portugal e tem, para um inglês, uma fonte inesgotável de informações importantes, que fazem parte da nossa história coletiva e muitas dessas afirmações massajam o nosso ego de portugueses. No seu livro sobre Portugal, Page narra resumidamente a História de Portugal, desde o período da pré-romanização até aos finais do século XX. É uma interessante narrativa sobre o modo como surgiu o Portugal de hoje. É o resultado de oito anos passados a viver, a trabalhar e a viajar por entre os portugueses, para além das deslocações feita à procura da História, no norte de África, na Andaluzia e na Borgonha.
Embora muitos dos escritos narrados possam ser do conhecimento de muitos portugueses, outros são completamente desconhecidos. São uma agradável surpresa. Por tudo isto é de louvar o trabalho intenso de investigação, que Martin Page efetuou para escrever este livro.
Escolhi apenas alguns nacos importantes que massajaram o meu ego e que quis partilhar com os leitores. Por isso decidi trazer alguns resumos, para esta Crónica. São nacos da nossa história que demonstra muito bem de que têmpera é que os portugueses são formados.
Antes de ser eleito Papa, com o nome de João XXI, Pedro Hispano, escreveu um dos primeiros compêndios modernos sobre Medicina que, um século mais tarde, era livro de consulta obrigatória em quase toda a Europa. Os portugueses levaram as túlipas, o chocolate e os diamantes para a Holanda, introduziram, na Inglaterra, o hábito do chá das cinco e deram a Bombaim a chave do Império. Ensinaram a África a proteger-se contra a malária. Introduziram, na Índia, o ensino superior, o caril e as chamuças e, no Japão, as armas de fogo e a tempura (um prato clássico da culinária japonesa). A área de produção das castas de vinho do Porto tinham de ser obrigatoriamente cultivadas na região do Douro, e esta área tornou-se a primeira região vinícola demarcada do mundo. Portugal tornou-se também um dos primeiros países a inovar nos seguros. Fomos dos primeiros países do mundo a ter fundado o ensino superior em Portugal
No século XV, no reinado de D. João II (1455 – 1495), Portugal tinha então uma população inferior a um milhão e meio de habitantes (um oitavo de Itália, menos de um quarto de que a Espanha e quase metade da Inglaterra), mas mesmo assim conseguiu fazer de Lisboa a nova capital da riqueza e da abastança do mundo moderno, que levou à falência Veneza, o mais importante entreposto de mercadorias da Europa, até essa data.
Os visitantes chegavam a Lisboa vindos de Inglaterra e de outros países, igualmente atrasados, para contemplar a sua opulência, bem como o enorme desenvolvimento no campo das artes, das ciências, na grande ópera, na medicina, na arquitetura e na joalharia. Portugal foi dos primeiros países do mundo a ter praticamente perdido o interesse pelo comércio de escravos, e foi pioneiro no seu abolicionismo, assim como na abolição da pena de morte e nos trabalhos forçados. Portugal chegou a ser o país mais rico da Europa e foi o primeiro a criar a globalização. Para o bem e para o mal. Provavelmente Portugal foi o único país do mundo que teve um golpe militar, em que as armas em vez de balas tinham flores; tinham cravos. Foi em 25 de Abri de 1974.
Perde o direito a ter razão quem cala as suas convicções profundas. Como insubmisso que sou tenho uma tolerância muito baixa para a conversa da treta e como tal, não silencio as minhas convicções profundas. Adoro o meu país!
Num tempo em que se reerguem muros à diferença, puxar pela nossa autoestima é termos orgulho em carregar connosco uma herança genética e um lastro emocional que nos acrescenta competências sociais ímpares. Viva Portugal!
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