PAULO FERREIRA |
A novela em torno da ida de Durão Barroso para a Goldman Sachs tem enchido as páginas dos jornais durante as últimas semanas. Antes mesmo de tecer a minha opinião sobre toda esta novela, entendo ser meu dever fazer uma breve declaração de interesses: não tenho o mínimo respeito por este banco de investimento. Entendo, sinceramente, que se trata de uma instituição composta por um bando de gente sem o mínimo de escrúpulos, capazes de tudo para ganhar uns “trocados”. A forma como este banco se relaciona com agentes políticos é por si só reveladora que, para os seus responsáveis, todos os meios justificam os fins.
Aliás, o número de escândalos em que a Goldman Sachs se envolveu no passado recente e menos recente, são um belo e real retrato desta instituição financeira. O caso mais recente e que teve as consequências que todos nós bem conhecemos, foi o da ocultação do deficit grego. Mário Draghi, atual presidente do Banco Central Europeu, era vice-presidente do Goldman Sachs para Europa, com funções executivas, durante esse período. O melhor comentário sobre a promoção de Draghi para as funções que atualmente desempenha no BCE tem como autor o economista Simon Johnson: “Colocar Draghi à frente do BCE é como deixar a raposa a vigiar o galinheiro".
Assim sendo, a um político que, como Durão Barroso, esteve durante muitos anos à frente da Comissão Europeia, não basta vir alegar que cumpriu escrupulosamente o período de nojo imposto pela legislação europeia. Há determinados cargos e funções que, convenhamos, não podem ser assumidos por quem desempenhou funções deste nível. Por outro lado, o conhecimento de um conjunto vasto de informação confidencial obtido durante os dois mandatos de Barroso, colide claramente com o core business da Goldman Sachs.
Finalmente, existe sempre a nunca despicienda questão ética. E, neste ponto, não há qualquer argumento ou justificação que nos permita concluir que, também neste caso, a decisão de Barroso não é absolutamente censurável. Não está em causa a possibilidade de um ex político poder e até dever fazer a sua vida, profissionalmente falando, depois de deixar os seus cargos. Mas tendo em conta o que passou a Europa nestes últimos anos, os casos dramáticos vividos na Grécia, Irlanda, Portugal, Espanha e Itália, aceitar dar a cara por um grupo financeiro que teve uma quota parte de responsabilidade na crise das dívidas soberanas, é uma vergonha.
Mas o mais surreal de toda esta história é o último argumento avançado por Barroso relativamente às razões que levaram a que esta polémica atingisse tão grandes proporções. Segundo o próprio, tudo se deve ao facto de ser português. Pois bem, mesmo que tal fosse verdade, o que apenas por mera hipótese académica se concebe, isso não altera o cerne da questão. E essa é, para mim, absolutamente clara: um ex Presidente da Comissão Europeia jamais deveria aceitar integrar os quadros da Goldman Sachs. Seja ele português, alemão ou francês. Mas Barroso, entre a ética e os euros, preferiu estes últimos. E a história recordá-lo-á, para além de um Primeiro Ministro que abandonou o país logo que lhe acenaram com um cargo mais alto e de um irrelevante Presidente da Comissão Europeia, como um simples e triste “pesetero”.
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