PAULO SANTOS SILVA |
Na altura, questionei os leitores se estes programas seriam um princípio, um meio ou um fim. Hoje, a abordagem será mais contextualizada num programa em concreto, que neste momento passa na nossa televisão pública. Estou a falar, obviamente, do “The Voice Portugal”.
Qual foi, então, o “acontecimento” que despoletou esta crónica e quais as questões que me suscitou?
O “acontecimento” foi a interpretação de uma Ave Maria de Caccini. Surge, logo aqui, o primeiro grande reparo. A produção de um programa deste tipo, não pode cometer um erro de palmatória como o de inserir como autor do tema, um “tal” de Caccine. Uma pesquisa básica e rápida no Google, demonstraria facilmente que tal compositor não existe. Falha grave.
Posto isto, a principal questão que a interpretação da concorrente me suscitou foi, muito simplesmente, até onde é que a liberdade interpretativa pode ir num tema como este. Será que pode ser interpretado em qualquer estilo, tendo como único limite a vontade do cantor em mostrar o máximo de dotes vocais no pouco tempo de que dispõe, tentado que se vire uma cadeira que seja?
Na minha modesta e pessoal opinião, não. Claramente que não.
Giulio Caccini, foi um compositor que viveu entre 1551 e 1618, ou seja, em pleno Renascimento. Mas Bach, expoente máximo do período Barroco, funciona lindamente interpretado de uma forma “jazzística” ou misturado com ritmos africanos (pesquise no Youtube por Lambarena…). É verdade, mas a questão não esteve no estilo, esteve no caráter. Uma Ave Maria, como cântico religioso que é em honra de Nossa Senhora, não pode ser interpretado aos “berros”, como na minha opinião foi. Ainda que pudesse não ser cantado de forma lírica, deveria ter respeitado a essência da música e da sua mensagem.
Pior do que isso, foi perceber que para os jurados tudo isto foi absolutamente irrelevante, uma vez que alguns carregaram no botão para virar a cadeira, o que se por um lado, confirmo as minhas suspeitas de que pouco ou nada entendem do que estão ali a fazer (basta ouvir os “chavões” que alguns utilizam sistematicamente nas apreciações que fazem…), em relação a outros a quem reconhecia algum mérito e conhecimentos musicais, me dececionou.
Valha-nos, no entanto, que as alternativas nos canais generalistas a este programa se resumem a novelas ou reality shows onde se revelam segredos de malta que, aparentemente, só tem dois neurónios e um deles já deixou de funcionar há algum tempo!...
Bendita RTP2 e todos os outros canais das operadoras por cabo, fibra e satélite!!!
No caso de ter ficado curioso relativamente ao tema, deixo-lhe um link para o ouvir numa interpretação “à séria”, de entre as muitas que felizmente se podem encontrar.
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