SÉRGIO LIZARDO |
Fui comprar uma agenda. E procurei nela o dia de SER FELIZ. Comecei pelo fim: olhei para a última marca de hora do último dia do ano, na esperança de ali ver a menção “SER FELIZ”. Mas não vi. Pensei que talvez o que há poucas horas vi, na viragem de um ano para o outro, não foi, afinal, felicidade. Procurei, então, o mês de fevereiro. No dia 28, está escrito “Carnaval”. Mas não dia de “SER FELIZ”. Obviamente, são automáticas, imediatas e indissociáveis as imagens de alegria e diversão, quando se lê a palavra que dá nome àquela quadra, mas nem aí colocaram o “SER FELIZ”. Concluí que não há dia de SER FELIZ – que, se nem a passagem de ano nem o Carnaval são esses dias, não há dia marcado para se SER FELIZ. Acontece é que se age como se houvesse dia desses, como se houvesse dias no calendário especificamente nascidos para trazer felicidade às pessoas e elas tivessem que seguir à risca tal expressa e prévia determinação. Pensei na fugaz felicidade que muita gente sente, como se lha racionassem. E imaginei pessoas infelizes todo o ano, mas que em certas datas não são infelizes. E Imaginei pessoas sozinhas todo o ano, mas que em certas datas não estão sozinhas. E imaginei pessoas com fome todo o ano, mas que em certas datas não ficam com fome. E imaginei que não havia datas para as pessoas colocarem de lado as tristezas, as perdas, os vazios e as expectativas goradas – e não gostei de imaginar tal coisa. Não gosto de felicidade com data marcada, não gosto de felicidade esporádica, mas gosto menos de felicidade que nunca acontece. Tinha que acontecer mais, é certo. Tinha que se celebrar cada motivo para sorrir e o nascer de cada dia com o mais breve sorriso no rosto, mas nem sempre se pode, nem toda a gente pode.
Serve este texto para deixar apenas esta pergunta: Felicidade é preciosa; tem que, por isso, ser rara?
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