domingo, 9 de outubro de 2016

O LIVRO QUE SE PODE TORNAR NUM «FLOP»

MOREIRA DA SILVA
O livro de José António Saraiva “Eu e os políticos” tem na sua capa a seguinte frase muito forte, em termos de marketing: “O que não pude (ou não quis) escrever até hoje – O livro proibido”. É importante este tipo de frases numa capa de um livro, pois hoje compra-se pelo «rótulo». Mas será que vai ser um êxito? Pelas expetativas criadas, o livro tem todos os ingredientes para vir a ser um sucesso de vendas.

José António Saraiva exerceu a atividade de arquiteto durante 15 anos, mas é comentador e jornalista com 40 anos de experiência, 23 dos quais como diretor do “Expresso” e 9 anos como diretor do “Sol”. Na sua atividade jornalística conheceu pessoalmente todos os políticos de primeira linha, com uma única exceção: Sá Carneiro. Manteve conversas privadas com todos os Presidentes da República eleitos desde 1974 e com todos os primeiros-ministros dos Governos constitucionais, excetuando António Costa, que só conheceu em criança.

O autor é um homem politicamente de esquerda e teve a possibilidade de almoçar ou jantar com quase todos, que agora esmiuça em livro, sabendo‑se que as conver­sas se soltam à mesa, onde as pessoas se abrem mais. Entrevistou muitos deles várias vezes, para a televisão ou para a imprensa. Com alguns até manteve longas conversas e frequentes contactos telefónicos. Escreve sobre 42 personalidades. Muito se falou dos segredos que ele pudesse desvendar num livro deste tipo. O medo das inconfidências era enorme, e o barulho feito à volta do livro foi tão grande, que o mundo da política «abananou-se» todo originando que o ex-primeiro-ministro, Passos Coelho, que estava para apresentar o livro tivesse recusado, depois de ter aceitado. Não quis ser «mordomo de tal festa».
São muito diversificadas as personalidades esmiuçadas no livro, começando por Alberto João Jardim e Álvaro Cunhal, passando por Aníbal Cavaco e Silva, António Guterres, António Ramalho Eanes, Jorge Sampaio, José Manuel Durão Barroso, José Sócrates, Leonor Beleza, entre muitos outros e finalizando com Paulo Portas, Pedro Passos Coelho, Pedro Santana Lopes, Rui Machete e Vítor Constâncio.

Ao ler o livro pode-se constatar que é atrativo sob o ponto de vista da “coscuvilhice”, mas sem qualquer conteúdo cultural, o que não é surpresa. Tem revelações duras e outras que roçam a violação da privacidade. No início do livro, na “Apresentação”, o autor tenta aguçar a curiosidade do leitor quando afirma «a jornalista Ângela Silva disse, quando lhe confidenciei que estava a escrever este livro: O melhor do jornalismo é aquilo que não se pode escrever».

O autor adverte: «O leitor não deve esperar ver neste livro memorialista oportunidades de vinganças, ajustes de contas ou história de traições, que não encontrará». Poderá ser verdade, mas podemos ler muitas inconfidências banais, do tipo: «o Paulo Portas usava, de vez em quando, calções e tinha uma mágoa, pois como conservador que era, gostaria de usar sobretudo e de ter uma família, mulher e filhos, mas tal não lhe era possível. Mas lemos algumas inconfidências muito graves, como por exemplo, quando afirma que Miguel Portas, que faleceu há quatro anos, lhe disse: «O meu irmão nunca seria líder do CDS, explicando que o Paulo é homossexual e teme que, com a exposição que o cargo lhe daria, isso pudesse vir a público».

Sobre Marcelo Rebelo de Sousa, o autor considera-o: «Uma criança grande. Brilhante mas leviano. Professor catedrático com a traquinice de aluno da escola primária».

No livro também se pode ler a seguinte afirmação de Mário Soares, sobre o atual Secretário-Geral da ONU: «O problema de Guterres é a falta de “tomates”. E sem “tomates” não vai a lado nenhum».

Quanto a José Sócrates, o autor considera-o um escroque, um farsante, venenoso, frio e mentiroso, e afirma o seguinte: «em privado é uma pessoa muitíssimo diferente — e bastante menos brilhante — do que aparenta ser em público. Direi mesmo que é um homem banal. A diferença entre uma pessoa e outra chega a ser estranha. Não tem grandes ideias e fala às vezes de temas a despropósito. Também afiançou que nele não há qualquer distinção entre a verdade e a mentira. José António Saraiva afirma também que José Sócrates desejava fechar o Jornal “SOL”, que era o jornal que estava a investigar os casos “Freeport” e “Face Oculta”, ou substituir os seus diretores que eram considerados os “maus da fita”, os inimigos a abater. Tal como queria afastar Manuela Moura Guedes da “TVI” e José Manuel Fernandes do “Público”». 

E assim se escreve um livro, que tem tudo para ser um êxito comercial, mas não tem nada para ser um sucesso literário e até poderá vir a ser um grande «flop».

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