Um duelo à partida sempre desigual
DR REUTERS Crónica de Gonçalo Novais |
Deixemos de olhar para o resultado e constatemos dados factuais que nos permitem olhar para este confronto como opondo duas equipas de níveis competitivos à partida bastante distintos, com Portugal a surgir neste Europeu como uma equipa que, conjugando o aparecimento de jovens de grande potencial com outros companheiros de larga experiência internacional, surge na competição como uma equipa e uma estrutura já com larguíssima experiência em competições de alto nível futebolístico (experiência essa que se estende aos clubes), perante uma Hungria que, exceptuando o jovem Adam Nagy que se destacou no Mundial de Sub-20 realizado no ano passado, tem em veteranos como o quarentão Kiraly, Zoltán Gera, Richárd Guzmics ou Szalai, estes dois últimos já com 29 anos, as suas grandes figuras, a par da grande «estrela» da equipa que foi brilhando nos últimos anos por terras holandesas, russas e agora turcas sem que se tivesse dado muito por isso: Dzsudzsák.
Era por isso um confronto desigual entre duas equipas a fazerem campanhas europeias distintas da maioria das previsões. A Portugal augurava-se um domínio absoluto sobre o grupo, atribuindo-se-lhe a responsabilidade de, salvo o devido respeito pelos adversários, contar por vitórias os três jogos realizados. À Hungria previa-se que tivesse, pelo menos, de se superiorizar frente à Islândia para garantir uma margem de erro que lhe permitisse não colocar o apuramento em risco mesmo nos jogos contra uma mais acessível Áustria e o favorito Portugal, no qual tentaria surpreender para ver se chegaria mais longe.
O grupo desenrolar-se-ia completamente contra as previsões, chegando os favoritos Portugal e Áustria em situação bem mais aflitiva do que os não-favoritos islandeses e húngaros, ambos em boa posição de apuramento para a fase seguinte.
Mais um jogo, o mesmo de sempre, e a qualidade colectiva a não aumentar
Se havia quem partilhasse da quase que omnipresente esperança portuguesa de ver a selecção nacional a aumentar a sua qualidade exibicional, viu mais uma performance colectiva em linha com as anteriores duas, com a equipa a revelar mais uma vez problemas em termos de fluidez e desenvolvimento do seu processo ofensivo, dependendo de Cristiano Ronaldo e Nani para tentarem desequilibrar na frente de ataque. Pouco fluído e baseado numa progressão em direcção à baliza adversária feita de forma algo trapalhona e bem distante das exigências qualitativas impostas por uma prova como um campeonato europeu, o perigo criado por Portugal durante a primeira parte assentou em lances de bola parada, a partir dos quais saíram oportunidades de golo, como o foram as da autoria de João Mário (5’), Pepe após canto de Moutinho (7’), e duas de Cristiano Ronaldo em livres directos, aos 28 e 35 minutos do primeiro tempo.
Porém acabaria por ser a Hungria a aproveitar a performance tremida e algo nervosa da selecção nacional, marcando os 18 minutos do primeiro tempo um momento simbólico destes problemas defensivos – tudo começa com uma investida pela direita do ataque húngaro de Lovrencsics, que após se ter desenvencilhado de Eliseu, cruza para a finalização de Szalai, felizmente interceptada no momento decisivo por Pepe; no canto que se seguiu, a defesa de Portugal alivia a bola para a zona central à entrada da sua grande-área, e Zoltán Gera nem quis acreditar na benesse que lhe foi dada, podendo aplicar o seu potente remate de pé esquerdo que só parou no fundo das redes portuguesas. Quem sabe nunca esquece, e Rui Patrício sentiu na primeira pessoa a potência e precisão do pontapé de um dos jogadores mais carismáticos da Hungria nas duas últimas décadas. Claramente intranquila e com os seus processos de jogo a não saírem bem, a equipa portuguesa podia ter sofrido novo golo, após uma perda de bola comprometedora no meio-campo ter dado a Lovrencsics nova oportunidade para executar um bom cruzamento a partir da direita, e com Pepe novamente em bom plano na neutralização do perigo, isto aos 40 minutos.
Até que apareceram aos 41 minutos os únicos desequilibradores da selecção durante a primeira parte que se possam registar na primeira parte. Perante uma defesa húngara em atitude de espera face ao que iria fazer o capitão, Cristiano Ronaldo faz um bom passe em profundidade para a desmarcação de Nani, que isolado frente a Kiraly, empata a partida, num empate que apesar de tudo é justo, por força de um equilíbrio entre duas equipas a realizar uma performance de pouca qualidade colectiva.
O surgimento de duas «estrelas» no meio de uma chuva de golos
Os primeiros dezoito minutos da segunda parte foram marcados pelo aparecimento em grande nível das “estrelas” Ronaldo e Dzsudzsák, que estiveram em grande plano neste período com um «bis» para cada um. O extremo-direito da Hungria, jogador explosivo e com um remate potente e preciso com ambos os pés, além de possuir razoável competência técnica no transporte de bola em velocidade e no drible, tem espalhado qualidade e competência por relvados holandeses, russos e turcos, sendo finalmente de sublinhar a transposição dessas suas aptidões para um campeonato europeu. É certo que, nos seus golos (marcados aos 46’ e 55’), beneficiou de desvios que traíram Rui Patrício, mas a força dos remates tem só nele todo o mérito. Responderia de igual maneira Cristiano Ronaldo, com dois golos que por duas vezes vieram restabelecer a igualdade no marcador, sendo que o toque de letra que originou o segundo tento é de uma grande beleza.
Após este período frenético, Szalai enviaria aos 63’ uma bola à trave após cruzamento da esquerda, e a partir daqui assumiu Portugal as rédeas do jogo, com as presenças de Renato Sanches e Ricardo Quaresma na segunda parte a darem à selecção nacional maior capacidade de manutenção e circulação de bola a obrigar sistematicamente os húngaros a deslocarem-se como um bloco em reacção aos passes em maior profundidade que conduziam a variações dos centros de jogo mais rápidas e mais capazes de explorar espaços eventualmente deixados pela Hungria no seguimento destas movimentações. As oportunidades surgiram naturalmente, mas sem obrigarem Király a aplicar-se aos três lances de perigo protagonizados por Ronaldo e ao remate cruzado de Quaresma.
Manteve-se o empate no final do confronto, e a imprevisibilidade do grupo relativamente aos prognósticos iniciais manteve-se até ao final.
A Hungria surpreende-se a si mesma com o primeiro lugar final que conquistou, tendo agora pela frente a ofensivamente poderosa Bélgica, com Portugal a ter uma tarefa igualmente difícil frente à praticante de algum do melhor futebol que se viu na competição, a Croácia, num jogo que se disputará já no próximo sábado às 20 horas, e para o qual Portugal terá que mostrar bem mais do que o que tem mostrado caso queira manter a tradição cem por cento vitoriosa nos jogos já disputados em toda a história contra os croatas, que nunca venceram ou empataram contra os portugueses em toda a sua história futebolística.
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