sábado, 30 de setembro de 2017

SUSTENTABILIDADE DO SNS: REALIDADE OU FICÇÃO ?

ANTONIETA DIAS
A exigência na melhoria do acesso à inovação, aos produtos e tecnologias mais adequados para combater a doença passa pelo uso das tecnologias aplicadas de forma racional, segura e eficaz.

Sem dúvida que a sustentabilidade de um sistema credível para cuidar melhor o doente, obriga a investir em tecnologia, em incentivar os profissionais, em dar liberdade de escolha nas opções terapêuticas e a ter uma política do medicamento baseada na evidencia científica.

Obviamente que nenhuma adesão à terapêutica, funciona se não existir credibilidade médica, empatia profissional, ambiente institucional que assegure as condições de promoção e investimento neste modelo de prestação de serviço à comunidade.

Certo é que a saúde é o segundo maior gasto público da comunidade, logo depois das despesas com a proteção social (19,2%).

Em 2015, os dados do Eurostat, revelam que Portugal gastou 6,2% do PIB em despesas da saúde, um valor bastante abaixo da média europeia.

A União Europeia despendeu 7,2% do PIB na saúde [cerca de 1,5 bilhão de euros], o que faz com que o nosso país tenha gasto 1% a menos do que o total do bloco.

Os países que lideram a tabela são a Dinamarca (8,6%), a França (8,2%) e a Áustria e a Holanda (ambos com 8,0%), sendo que abaixo se situa o Chipre (2,6%), a Letónia (3,8%), a Roménia (4,2%) e a Grécia (4,5%). “O ranking é bastante diferente quando os montantes gastos são comparados com a população de cada estado-membro. Em média, em 2015, as despesas com saúde ascenderam a 2.076 euros por habitante na União Europeia”, refere também o relatório.

Segundo o Eurostat, os países europeus que gastaram mais de 3.000 por habitante foram o

Luxemburgo (4112 euros), a Dinamarca (4094 euros), a Holanda (3194 euros), a Suécia (3170

euros), a Áustria (3149 euros), a Irlanda (3138 euros) e o Reino Unido (3020 euros).

Em relação aos que desembolsaram menos, destacam-se alguns países de Leste da Europa

Central, como por exemplo a Roménia (340 euros), a Bulgária (343 euros), a Letónia (468

euros), a Polónia (520 euros), o Chipre (532 euros) e a Hungria (592 euros), cujos gastos

foram abaixo de 600 euros.

Se em 2015 o financiamento do SNS se tinha ficado nos 8,65 mil milhões de euros (mais

0,4%), no ano anterior este valor subiu 3,1% para os 8,93 mil milhões de euros.

Segundo o estudo, desenvolvido pela Nova Information Management School (Nova IMS), da Universidade Nova de Lisboa, o financiamento do SNS subiu 3,1% e a despesa cresceu 1,2%, menos do que tinha acontecido em 2015.

“Com base na definição do mesmo estudo para calcular o índice de sustentabilidade é necessário avaliar não só a qualidade dos cuidados de saúde na perspetiva dos cidadãos, mas também os indicadores disponíveis sobre a qualidade técnica do SNS, a atividade registada e a despesa.

Sob o ponto de vista da atividade, o estudo indica que aumentou o número de doentes

atendidos tanto nos hospitais como nos serviços de saúde primários, mas esta subida

terá sido mais significativa nos cuidados primários (2,1%).”

A Sustentabilidade do SNS está baseadas em três responsabilidades:

1-Responsabilidade Social

2-Responsabilidade Ambiental

3- Responsabilidade Económica

Na conjugação destes três pilares, se a base for de vidro pode falar -se da transparência político social, de partilha de responsabilidades, de seriedade e cumprimento do dever de cidadania.

Sem dúvida que existem algumas mudanças sociais que poderão representar a chave de sustentabilidade, com a parceria da prestação de cuidados informais.

Todos sabemos que o Estado não tem qualquer possibilidade de manter a sustentabilidade do Serviço Nacional de Saúde sem o apoio das Famílias e dos cuidadores.

O risco da Insustentabilidade do Serviço Nacional de Saúde(SNS) é enorme. Para o minimizar há que quebrar o desiquilíbrio entre crescimento forte da despesa pública e crescimento débil da economia.

A distração ou improdência política tem ignorado os sinais preocupantes da situação financeira do SNS, que mantém um crescimento excessivo da fatura dos medicamentos, os défices crescentes dos hospitais, o aumento incomportável da despesa de pessoal, etc..

A sustentabilidade técnica científica passa pela capacidade de prestar os cuidados de saúde necessários à população, pela capacidade financeira, pela capacidade de pagar os cuidados que queremos dar a população e pelo que estamos dispostos a sacrificar para garantir os consumos necessários a um investimento na qualidade dos cuidados de saúde que a população merece.

A sustentabilidade passa ainda pela reflexão e investimento de quanto estamos dispostos a sacrificar de outros consumos para ter mais cuidados de saúde?

Estruturalmente temos que pensar que os Cuidados de Saúde, num modelo de exigência de qualidade implica um aumento do financiamento para que a sustentabilidade seja garantida e naturalmente uma revisão do PIB, sem os quais não teremos capacidade de pagar os cuidados de saúde aos cidadãos.

Importa, ainda referir que será preciso abdicar de “algo” selecionando o que é dispensável em benefício de um investimento real e efetivo que se coadune com o crescimento previsível das despesas em saúde e do Rácio.

Apesar da despesa pública da saúde representar um enorme peso para a economia, os portugueses precisam de ter a certeza que existe sensibilidade e vontade real de manter e garantir a sustentabilidade deste sistema.

Assim, só com uma distribuição mais adequada do PIB é que é possível garantir o Financiamento do Serviço Nacional de Saúde desde que o crescimento das transferências do Orçamento do Estado para o SNS não agrave o saldo das Administrações Publicas.

Elementos cruciais como a taxa de crescimento do PIB , os problemas da sustentabilidade das contas publicas, as dificuldades orçamentais exercem forte pressão sobre a despesa em cuidados de saúde feita pelo Estado.

Se mantivermos as medidas administrativas como estão, permaneceremos em perigo eminente de rotura.

Em suma, a descredibilização dos mecanismos de controlo, o acumular das dividas do Estado, a reentrada nos ciclos de orçamento rectificativos são o fluir da areia movediça, que conduzirá ao aumento da fragilidade do sistema politico-financeiro português.

Todavia existem outros caminhos, que podem ser implementados a médio prazo para aumentar a economia e criar os mecanismos de crescimento da procura, o ajuste da oferta existente, os quais passarão por uma racionalização e reestruturação dos subsistemas de saúde, pela promoção de hábitos saudáveis, melhorando a qualidade de vida dos cidadãos, por uma melhor gestão da saúde, com medidas assertivas da política do medicamento, rigor na avaliação económica dos gastos, cuja meta será a procura da eficiência e da melhoria da taxa de crescimento, necessárias para assegurar a manutenção e a sustentabilidade do SNS.

Sem promoção da prevenção da doença e investimento na educação para a saúde, não conseguimos economizar na saúde.

ANDRÉ BRUN, UM PORTUGUÊS DE ASCENDÊNCIA FRANCESA

MANUEL DO NASCIMENTO
André Brun, ou André Francisco Brun, nasceu na freguesia de São José, em Lisboa a 9 de maio de 1881, filho de ascendência francesa, de André Regis Brun e de Ana Loudoyska nougaraide. André Brun, foi humorista, guionista de cinema, cronista de jornais, escritor português e militar português, que participou na Primeira Guerra mundial em França, como major. Foi agraciado com a Medalha da Cruz de Guerra. Foi também um dos fundadores da Sociedade Portuguesa de Autores, em 22 de maio de 1925. Em 1899, ano em que se naturaliza português, escreve versos com ilustração de Bernardino Chagas. Em 1901, estreia-se como dramaturgo, ao escrever em colaboração com Carlos Simões, a peça Tabelião do Pote das Almas. Em 1907, colabora no jornal O Século e no jornal Novidades, e, em 1912, no jornal A Capital. André Brun foi um dos portugueses que estiveram nos campos de batalha da Primeira Guerra mundial e a memória que com ele trouxe materializou-se o livro A Malta das Trincheiras, um livro a descobrir ou redescobrir. Desta experiência única e traumática - Uma memória de guerra - onde relata o Corpo Expedicionário Português (CEP) na Flandre de França. em 1918, André Brun assume o comando do Batalhão de Infantaria n.°23, e é condecorado com a Medalha Militar de prata da classe de comportamento exemplar e graduado em major. Retorna a Portugal de licença de campanha. Neste mesmo ano, apontando críticas ao regime, foi preso no quartel do Carmo em Lisboa, é transferido depois para o Forte da Graça, em Elvas, de onde libertado em 1919, ao fim de mais de dois meses de prisão. Ainda em 1919, tomou parte no combate aos monárquicos em Monsanto em Lisboa, e no norte do país, como por exemplo em Lamego, Viseu e Régua. Foi agraciado pelo presidente da República com o oficialato de São Tiago de Espada, por mérito literário, e com a comenda da ordem militar de Avis, pelo combate ao movimento monárquico. Foi também nomeado adido militar adjunto da Legação Portuguesa em Paris e assiste em Versalhes (região e Paris) à assinatura do Tratado de Versalhes. Comanda o contingente do CEP que integra o desfile das forças aliadas na Festa da Vitória, em Bruxelas. Em 1920, cessa funções como adido militar da Legação Portuguesa em Paris, mas continua a residir em Paris, e volta para Lisboa em 1921. Em 1926, publica A Maluquinha de Arroios, uma comédia em três atos.

Morre em Lisboa, em sua casa, na rua Bernardim Ribeiro, n.° 73 r/c. A 12 de março de 1932, é homenageado com a inclusão do seu nome (Rua André Brun), na toponímia de Lisboa, numa rua de Campo de Ourique, antiga rua Particular n° 2 aos Prazeres.


A IMPORTÂNCIA DA VACINAÇÃO E DESPARASITAÇÃO NO CÃO

SUSANA FERREIRA
Ter um animal acarta responsabilidades e despesas, entre as quais a vacinação e desparasitação regular. Porque deve vacinar o seu animal? Para o proteger de patologias graves, evitando o seu sofrimento e mesmo morte. As principais patologias prevenidas através da vacinação básica são a Esgana, Adenovírus canino (Hepatite infecciosa Canina), Parainfluenza canina, Parvovírus canino, Leptospira e Raiva. O plano vacinal começa a partir das 6 semanas de vida do animal. Sim é verdade, não é aos 4 ou 6 meses, mas sim a partir das 6 semanas de vida. É importante começar o plano vacinal o mais cedo possível e evitar o contacto do bebé com animais que não se conheça o historial clínico, evitar parques e zonas onde o bebé possa contactar com fezes de animais infectados com alguma das patologias referidas anteriormente. O plano vacinal pode consistir em 2 ou 3 reforços das vacinas das doenças dependendo dos protocolos utilizados, sendo que o espaçamento entre os reforços nunca poderá exceder as 5 semanas. No caso de ultrapassar as 5 semanas tem de se reiniciar o protocolo, sendo mais dispendioso e retardando as tardes animadas no parque, que os donos tanto anseiam. A vacina da Raiva pode ser administrada a partir dos 3 meses de vida, sendo que esta não necessita reforço. Findo o protocolo inicial, deve fazer o reforço anual que consiste numa associação da vacina das doenças e da Raiva. Relativamente ao reforço da Raiva, este poderá ser anual ou efectuado de 3 em 3 anos, dependendo da vacina usada. Caso um animal vacinado anualmente, por esquecimento ou por outras razões, fique mais de 2 anos sem realizar a vacina, é necessário voltar ao protocolo inicial, para que fique devidamente protegido, sendo que a Raiva não necessita de reforço. A maioria dos animais infectados com Parvovírus morrem. A taxa de sobrevivência em animais afectados com Esgana é baixíssima, sendo que alguns ficam com sequelas para o resto da vida. Prevenir é sempre melhor que tratar.

Quanto à desparasitação interna existem vários protocolos. O protocolo que utilizo consiste na desparasitação a partir dos 15 dias de vida, sendo repetida de 15 em 15 dias até aos 3 meses de vida do animal. Dos 3 aos 6 meses de vida a desparasitação deve ser mensal. Após os 6 meses de vida a desparasitação deve ser feita de 4 em 4 meses até ao fim de vida do animal. Quanto à desparasitação externa, deve ser feita mensalmente, trimestralmente, semestralmente, dependendo do produto utilizado e da sua duração. Não se esqueça, os parasitas internos são uma zoonose e nós podemos ser afectados. Quanto aos parasitas externos são vectores de doenças muito graves, como hemoparasitoses, devendo preocupar-se seriamente em evitar a picada dos mesmos. Mais uma vez a prevenção é a melhor forma de tratar o seu animal. Lembre-se o dinheiro que gasta no tratamento será muito superior ao de prevenção e infelizmente às vezes pode não ser suficiente para salvar o seu melhor amigo.

sexta-feira, 29 de setembro de 2017

IGUALDADE DE GÉNEROS

JOÃO RAMOS
Um dos temas mais “quentes” da atualidade está relacionado com a desigualdade de tratamento entre género, o que se reflete na ausência de mulheres em posições de topo nas empresas, ou inclusivamente em diferenças de rendimento para a mesma categoria de profissão.

Para avaliar a importância do género na evolução na carreira, um grupo de investigadores Sueco e Holandês, pediu a cerca de 2000 mil estudantes, para medir o desempenho dos seus professores. Aos estudantes foram atribuídos, aleatoriamente docentes do sexo feminino e masculino, de forma a garantir a qualidade do estudo.

Avaliados de 0 a 100, os professores do sexo feminino obtiveram, em média, menos 37 pontos, do que os seus homólogos do sexo masculino. Mesmo atribuindo classificações ao material disponibilizado pelos docentes em aula, que foi exatamente o mesmo, as diferenças mantiveram a mesma ordem de grandeza. No entanto, os estudantes que foram lecionados por professores do sexo feminino registaram classificações e tempos de estudo semelhantes. Mesmo, a progressão dos alunos não se encontra relacionada com o sexo do docente, o que significa que homens e mulheres geram igual valor acrescentado para os estudantes. Além disso, a diferença é superior para os professores mais jovens, os quais se encontram numa fase de progressão na carreira vital, determinando o seu salário futuro.

Estas conclusões são preocupantes ilustrando que o problema da desigualdade entre géneros está enraizada na cultura das sociedades ocidentais, obrigando a encetar medidas, não só de carácter regulatório, mas também de cariz informativo junto das populações, com o objetivo de eliminar preconceitos.

ALIMENTAÇÃO SAUDÁVEL PARA PREVENÇÃO DA GRIPE

DIANA PEIXOTO
Sabia que a alimentação saudável amplifica e reforça o seu sistema imunitário? É verdade! Portanto, esta prática pode mesmo impedir a gripe. Como é óbvio, é de salientar que é importante manter esta prática de alimentação saudável sempre, no seu dia-a-dia, ou antes de esperar ficar doente, caso contrário, poderá não ir a tempo de se proteger…

Com isto, é importante referirmo-nos a alimentos saudáveis, não os substituindo por suplementos. Com alimentos conseguimos todo um pacote nutricional ideal. Por exemplo, comer uma laranja oferece-nos um conjunto de nutrientes - magnésio, potássio, folato, vitamina B6 e flavonóides ricos em antioxidantes, que não conseguiríamos com um suplemento de vitamina C.

Toda a gente deve ingerir pelo menos 5 doses de frutos e legumes por dia de modo a obter as vitaminas, minerais, fibras e antioxidantes que necessita - tudo o que precisamos para um sistema imunitário forte e saudável. Portanto, certifique-se que as frutas e legumes fazem parte de todas as suas refeições. Basta adicionar bagas ou fruta fatiada à sua taça de cereais integrais ao pequeno almoço e beber um sumo natural de laranja; juntar uma maçã ao seu almoço e fatias de tomate, abacate e alface às suas sandes. Comece o jantar com uma salada ou sopa de vegetais e habitue-se a manter a fruteira cheia para saciar o apetite entre refeições.

Enquanto se foca em manter, ou aumentar, a quantidade de fruta e legumes que ingere, não se esqueça de complementar com outros alimentos saudáveis que o seu sistema imunitário necessita, ou seja, uma dieta equilibrada com carnes magras, peixe, legumes, lacticínios magros, cereais integrais e frutos secos. Um corpo saudável tende a possuir um sistema imunitário forte.

Para alem disso, claro, deve evitar comida não saudável. Afaste-se de açúcares e gorduras más (saturadas).

E se ficar doente? Bem, se ficar doente, e importantíssimo que mantenha a alimentação saudável, já que é fundamental ir buscar a energia que precisa para a recuperação, sem esquecer da hidratação. Beba muitos líquidos ao longo do dia, preferencialmente água ou chás.



DITADURA DE CORPOS

LUÍS PINHEIRO 
A sociedade está a mudar… A imagem nunca teve um papel tão importante como tem nos dias de hoje. Atualmente dá-se mais valor ao parecer do que ao ser, onde o que é importante é estarmos com corpos dentro dos parâmetros pré estabelecidos pela sociedade do que sermos realmente felizes. Onde fica um mero mortal no meio desta dualidade?

Estamos numa fase onde tudo é transformado em produtos, onde as próprias pessoas são produtos que se precisam de autopromover e vender para atingir os vários objetivos da sua vida (carreira, relacionamentos, etc). Numa simples entrevista de trabalho um dos critérios mais importantes é a imagem que transmitimos ao nosso recrutador. Quando esta imagem reflete os padrões pré-definidos pelas sociedade somos bafejados pela sorte, tendemos a ter mais sucesso no alcance dos nossos objetivos. O que acontece a quem por genética, saúde ou mero descuido não se enquadram nesses critérios?

Desde muito novos somos ensinados a valorizar um conjunto de características física como sendo as certas e a criticar e menosprezar quem não se enquadra nelas. Todos temos histórias do tempo de escola onde criticamos quem fisicamente era diferente de nós. De crítica que podem vir desde a forma corporal até a forma como o corpo de expressa (expressão de género) existem muitas formas de perpetuarmos essa mensagem da imagem padrão.

Apesar de existir padrões de beleza para os dois géneros, é claramente notório que o impacto no género feminino é maior. A sociedade exige que as mulheres apresentem uma imagem muito mais cuidada e trabalhada. Desde muito novas são ensinadas a importância de estarem com peso reduzido, com os pelos corporais invisíveis, maquilhadas e de preferência sempre muito bem vestidas. Desde terna idade, as jovens tentam alcançar corpos idílicos e inatingíveis, tendendo a desenvolver maior sintomatologia depressiva, menor autoconceito, e apresentando maior probabilidade de desenvolverem outras perturbações psiquiátricas, principalmente perturbações alimentares. Esta realidade aplica-se aos homens só que com menor incidência.

Por outro lado é importante ressalvar a relevância de um estilo de vida saudável (alimentação saudável, desporto, etc.) para o desenvolvimento pessoal, e a importância fulcral dos nossos objetivos associados ao nosso corpo. Nada melhor para o nosso bem-estar psicológico do que atingirmos os objetivos que nos Auto propomos a realizar. Contudo tudo tem de ser realizado com peso e medida, o exagero, em regra, nunca conduz a bons resultados.

O meu objetivo com este texto foi deixar-vos a pensar, assim como fiquei ao mesmo tempo que o escrevia, sobre a sobrevalorização que damos á nossa imagem e principalmente as inferências que fazemos sobre a imagem do próximo.

A ditadura imposta, pela sociedade capitalista, aos corpos existe e está cada vez mais forte sendo omnipresente no nosso quotidiano. É importante percebermos a sua importância e influencia na nossa visão sobre o mundo, para que, nos momentos chave, a possamos neutralizar e mais importante deixarmos de ser veículos de reprodução da mesma. A verdade é que a melhor transformação desenvolve-se de dentro para fora e não o oposto.

quinta-feira, 28 de setembro de 2017

O MEU GATINHO TRIPÉ

MARIA AMORIM
O meu Tripé tem três pernas, por isso se chama Tripé. É um gatinho ainda muito pequeno, corre, pula e salta e é um gatinho muito feliz. Sobretudo é a prova viva que a linha que separa a vida da morte é muito ténue e a vida é um presente que nos é dado embrulhado em muita sorte. Então, como apareceu o Tripé na minha vida? Apareceu trazido pela minha filha que o encontrou numa valeta e ele estava tão quieto que ela pensou que ele estava morto, mas não teve coragem de seguir em frente sem ir ver como estava, e chegando-se para ele viu que ele não estava morto, mas tinha uma patinha muito ferida e nem se mexia com as dores. Já não teve coragem de ir embora e levou-o com ela. Trouxe-o para casa numa caminha improvisada numa caixa de cartão. Quando eu vi aquela coisinha tão pequenina, mal tinha dentes, toda pretinha, com uns olhos enormes, peguei nele ao colo para observar a pata e tive um mau pressentimento, aquela pata não tem salvação possível, parece estar em péssimo estado, com a articulação toda esmagada. Soube logo que ia ficar com ele, apesar de já ter dois gatos e liguei ao veterinário, era domingo à tarde. Marquei para o dia seguinte, fiz-lhe uma tala para a pata, para minimizar as dores e uma papa com a ração dos gatos da casa para ele ter que comer. Quando vi a sofreguidão com que comeu tudo e depois explorar a caixa onde o coloquei a arrastar a pata atras dele soube que ele era um lutador. Limpei-o, estava cheio de pulgas e de lixo, deixou-me cuida-lo docilmente, deitei-o a dormir e pensei, amanhã logo se vê, ainda com uma pequena esperança que ia ficar tudo bem com a pata dele. Quando o veterinário o observou, chegou à conclusão que a solução era amputar a pata e apeteceu-me chorar, e senti uma certa angustia, como é que um gato fica só com três pernas? Aí, o Veterinário foi a pessoa mais solidária que eu podia encontrar, como era um gato de rua e eu estava disposta a ficar com ele ofereceu-se para pagar a operação e eu arcava com as despesas de internamento. Explicou-me que um gato ficava bem só com três patas, que ele iria
TRIPÉ
compensar perfeitamente a falta da patinha com as outras três e que ia ser um gato muito feliz. E ficou na clínica, foi operado no dia seguinte, a operação correu bem e dois dias depois foi para casa. Improvisei uma sala de tratamentos numa das casas de banho, todos os dias lhe limpava a ferida operatória e colocava a pomada até que foi tirar os pontos. No entretanto foi crescendo, e andava perfeitamente mesmo só com tês patas. Entretanto, ao escolher o nome, com o sentido de humor que o caracteriza o meu filho sugeriu Tripé e todos concordamos que era um nome muito adequado. E, o Tripé fez jus ao seu nome, mesmo só com três patas, começou a saltar para cima das coisas e de dia para dia saltava mais alto, sem dificuldade nenhuma. Passaram três meses, é um gatinho muito ativo, gosta de se atirar às plantas, de cavar nos meus vasos até me fazer perder a paciência, de subir para a mesa da sala onde cismou com o arranjo, tratando de cavar entre o musgo seco e atirá-lo cá para fora. Corre muito bem, nem se nota que lhe falta uma pata, quando anda coxeia um bocadinho, mas quando resolve correr nada o segura. Desenvolveu uma amizade muito especial com o meu cão, que o adotou completamente, que o protege e que vela por ele quando ele sai para o jardim, enrolam-se os dois, ensina-o a lutar e defender-se, passam horas a brincar. E eu fico feliz a observá-los e penso que valeu a pena salvar o Tripé, mesmo que ele tenha ficado sem pata, acho que é um gato que foi bafejado pela sorte, naquela noite em que a minha filha o encontrou, podia ter morrido ali sozinho, tão pequenino, mas não morreu, porque ela por acaso viu-o, e resolveu levá-lo com ela. E, não é que a linha que separa a vida da morte ou o infortúnio da sorte é uma linha mesmo tremelicante? Ou então não temos também todos nós um papel preponderante no desenrolar da sorte? Eu acho que também tive sorte, contribui para a sorte de um gatinho, ganhei um Tripé malandro, mas meiguinho e amoroso, e como garantiu o Veterinário, parece-me um gato muito feliz.

LUTO

VANESSA MIMOSO
O Luto pode ser encarado como um processo posterior à morte de um ente querido; um processo de adaptação à perda, envolvendo um conjunto de tarefas ou fases para que tal aconteça. 

Perante a perda de um ente querido, há um conjunto de sentimentos que são comuns num processo de luto: choque (mais frequente no caso de morte inesperada; que pode durar horas ou dias, onde existem sentimentos de desespero, irritabilidade, amargura); tristeza (muitas vezes manifestada pelo choro); raiva (pode advir da sensação de frustração por não existir nada que se pudesse fazer para prevenir a morte e por vezes é direcionada erradamente para outras pessoas, culpabilizando-as pela morte do ente querido); culpa e auto-censura (por achar que devia ter feito mais); ansiedade; solidão (particularmente na perda de um cônjuge); fadiga; torpor(algumas pessoas relatam uma ausência de sentimentos após a perda;bloqueiam as sensações como uma espécie de defesa) e por vezes há um sentimento de alívio (quando a pessoa querida sofria de uma doença prolongada ou dolorosa, porém, o sentimento de culpa acompanha esta sensação).

A pessoa enlutada sente um vazio no estômago, um aperto no peito, uma sensação de falta de ar, falta de energia assim como uma sensação de despersonalização (nada parece real). Após a perda, normalmente, aparecem alterações no sono assim como no apetite; um isolamento social; choro; o comportamento de procurar e chamar pelo ente querido; visitar sítios e/ou guardar objetos que lembrem a pessoa perdida.

Cada pessoa vivencia o luto de forma diferente, existem determinados fatores que podem alterar a forma como as pessoas o vivenciam: natureza da relação de vinculação com o falecido, o próprio contexto e circunstâncias da perda, história pessoal, personalidade, o meio em que a pessoa está inserida entre outras variáveis sociais.

O luto leva tempo e a duração do processo de sofrimento é muito variável, não progride de forma linear. As mudanças de estação, períodos de férias e datas de aniversário podem contribuir para relembrar a perda, sendo novamente necessário trabalhar este processo.

Existem dois tipos de luto: o normal e o patológico. O luto considerado normal está associado ao facto de a pessoa enlutada conseguir ultrapassar o processo de luto através da realização de diversas tarefas ao longo de um continuum, isto é, primeiramente o sujeito passa por sentimentos de choque, descrença e negação; a fase seguinte é marcada por um desconforto somático e emocional bem como pelo isolamento. Por fim, numa última fase há um período de reconstituição. Quando estas fases não são vividas e ultrapassadas num determinado período de tempo, muitas das vezes, poder-se-á estar perante um luto não adaptativo, em que a intensidade e duração destas ações são mais marcantes.

Para se compreender melhor a origem da dor e todo o processo de sofrimento que advém da perda de alguém, é fundamental entender porque é que se estabelecem fortes laços entre as pessoas. A Teoria da Vinculação explica-nos isso muito bem; os laços afetivos que são criados pela familiaridade e proximidade com as figuras parentais no início de vida surgem devido à necessidade que se tem de se sentir seguro e protegido. Este sistema de vinculação mantém-se ao longo da vida e quanto mais forte for o vínculo/laço estabelecido entre duas pessoas, maior será o impacto e sofrimento quando há uma ameaça ou rutura real desse mesmo laço.

O papel do psicólogo é fundamental pois ajuda a pessoa enlutada a lidar ou encarar a perda de forma ajustada e adaptativa. Ajudar o enlutado a aceitar a realidade da perda, fazendo-o entender que a morte efetivamente ocorreu; tentar promover a sua capacidade de lidar com os seus sentimentos bem como encontrar estratégias de coping para conseguir viver de forma mais ajustada e saudável. Pretende-se que adquira um novo equilíbrio que lhe permita não propriamente ultrapassar a perda mas, aprender a viver com ela.

20 ANOS E 20 QUILOS DEPOIS

ANABELA BORGES
Deparei-me, uma vez, com esta expressão – 20 ANOS E 20 QUILOS DEPOIS – e confesso que fiquei, por alguns instantes, a matutar no assunto. Não deixa de ser uma expressão curiosa e, do pouco ou muito que conheço, verdadeira. E creio que as coisas que assumimos como verdades tocam-nos sempre mais fundo na alma.

Pensei em mim. Pensei nos vinte anos passados desde que tive esse inquestionável prazer de habitar a casa dos vinte anos – essa casa de abismos e de espantos, década doirada de juventude e alvoroço. Pensei, de imediato, nas transformações do corpo, na questão fisiológica, hormonal e dos metabolismos. O corpo é esse abismo que decliva nas fendas incontornáveis do tempo. Ninguém lhe foge, a esse bicho esfomeado de vida que é o tempo. E, bom, pensei: os 20 anos depois já cá cantam; os 20 quilos depois, não exactamente... mas é qualquer coisa que anda próxima disso.

E tudo isso – toda essa reflexão – trouxe-me velhas e novas questões, que a cada passo analiso.

Não há dúvidas de que (e creio que desde sempre) vivemos na ditadura da imagem.

Porque é que nos custa tanto envelhecer? Porque teimamos em manter o sonho da eterna juventude? Até que ponto idealizamos trucidar e moldar o corpo em busca da perfeição? beleza. perfeição. corpos esculturais. ser capa de revista.

A tal ponto inundam os nossos dias de imagens a ditar ideais de beleza, que qualquer um de nós, tantas das vezes inconscientemente, tem pretensões de se parecer com um famoso, um actor ou actriz, um modelo ou um cantor, daqueles que constantemente aparecem na TV, nas revistas e na internet. A beleza é ditada pelas tendências da moda, dos artistas, das estrelas de Hollywood. Qualquer um de nós, mesmo inconscientemente, tem preocupações com a aparência (é quase impossível não as termos). É claro que há pessoas que se sentem bem com o que são fisicamente, pessoas que (pelo menos assim dizem) não estão preocupadas com a imagem, a aparência, que dizem não se importar com as rugas, os quilos a mais, os cabelos brancos. Mas creio que, de uma ou de outra forma, todos procuram um modo “confortável” de estar perante os outros, seja assumindo-se como são (porque isso é também, por si só, uma preocupação – a de estar de determinada forma decidida e assumida perante os outros), seja esforçando-se por ter uma aparência dita “na moda”. Sim, porque no que toca a expressões como “aparência cuidada”, a coisa já muda de figura, podendo levar a diferentes leituras. Afinal, o que é uma aparência cuidada? Creio que qualquer pessoa que se preocupe em manter um determinado corte de cabelo, em aparecer de rosto escanhoado, em decidir vestir esta e não aquela roupa... traz em si uma preocupação com a aparência. E é tudo, então, bastante relativo, neste aspecto como em tantos outros da vida.

A verdade é que quando verificamos uma mudança mais forte no visual de alguém, estranhamos, e isso acontece porque estamos a ver aquilo como uma “imagem” e deixamos de ver a pessoa por detrás da imagem. Fazemos logo uma espécie de julgamento à imagem. Senão vejamos: porque tinha o cabelo loiro, castanho, preto... e não ruivo; tinha a pele mais morena, mais envelhecida... e não tão pálida, tão lisa; era mais gorda, mais flácida... e não tão magra e com tudo no sítio. O problema é que temos uma imensa necessidade de fazer comparações, de ter referências. E ao comparar estamos a dizer: “vês? ela também não está nova / fez uma plástica para esconder a idade / está gorda / tem barriga / tem celulite.

Actualmente, não há lei para a “imitatio”. Diria mesmo que reproduzir está na moda, e isso reflecte grande falta de criatividade... e revela muitas mais coisas, que deverão ser alvo de análise numa outra oportuna ocasião.

A imagem comunica brutalmente e quase dispensa palavras. (“Palavras”: outra matéria em vias de extinção. Mas isso já será mote para outra discussão).

20 ANOS E 20 QUILOS DEPOIS, sou uma pessoa, fisicamente, diferente. Não que essas diferenças me incomodem, já que aprecio bastante o ser físico que sou. Mas sou, essencialmente, uma pessoa diferente no meu ser – não na essência do que sempre fui – mas no que me foi acrescentado no SABER (não digo conhecimento, pois isso será outra questão). Essas são as verdadeiras mudanças que o tempo opera em nós. Esperemos que seja para melhor.

quarta-feira, 27 de setembro de 2017

BUNDESTAG 2017

RUI SANTOS
Os resultados das eleições legislativas alemãs, realizadas no passado domingo, reconduziram Angela Merkel na liderança do governo alemão. Este será o quarto mandato para uma mulher que passou de alguém «a prazo» alguém cujo reconhecimento como líder da Europa é incontestado. Mais que qualquer outro líder europeu, nacional ou referente às instituições europeias, é Merkel quem guia a Europa nestes tempos conturbados. Aliás, não se vê qualquer outra pessoa que lhe possa fazer frente a curto prazo. Isso é mau para a Europa. Significa que as lideranças são fracas, e quando elas são fracas…

No entanto, os alemães penalizaram Merkel e a sua CDU, assim como os socialistas alemães do SPD e o seu líder Martin Schulz (antigo presidente do Parlamento Europeu). Aliás, tanto a CDU como o SPD obtiveram os seus piores resultados desde 1949 (33% e 20,5% respectivamente). Isso revela um descontentamento com os partidos centrais do sistema político alemão. Quem beneficiou foi a extrema direita alemã reunida na AfD (12,6%) e Partido Liberal (10,7%) que tinham sido varridos do Parlamento nas eleições de 2013. Uma vez que não era possível voltar a ser feita a aliança entre a CDU e o SPD, restou a Merkel aliar-se aos Verdes (8,9%) e aos liberais. Todos os partidos recusaram aliar-se com a AfD e Merkel rejeitou os populistas de esquerda do Die Linke (9,2%).

No entanto, penso que estas eleições ficam marcadas igualmente por um facto. A diferença percentual entre a extrema-direita e os socialistas é bem menor que aquela registada entre os socialistas e os democratas-cristãos de Merkel. Isso deve dar que pensar não só aos alemães mas a todos nós que vivemos na Europa.

O clássico combate entre a esquerda e a direita tem de começar a ser posto de lado em muitos países europeus. O que agora importa é unir esforços para estancar a subida da extrema-direita na Europa, nomeadamente em países como a Alemanha e a França, mas também na Polónia, Hungria, República Checa, Eslováquia, Áustria, Holanda… O combate tem de ser entre a democracia e o autoritarismo, entre a liberdade e a opressão. Muitos dos que votaram na AfD votaram como forma de protesto perante o actual sistema político alemão. Não tenho nada contra o voto de protesto, mas votem em partidos democráticos. Proteste-se sim mas não em quem possa vir mais tarde a retirar-nos a possibilidade de votar e escolher livremente.

O perigo para a Europa não são os refugiados que fogem das maiores atrocidades. O perigo para a Europa está cá dentro e chama-se xenofobia, discriminação, desrespeito pelos direitos humanos.

A PRIMEIRA VEZ… LEMBRAS-TE?

TÂNIA AMADO
A primeira vez que conduzi um carro foi como se tivesse subido ao pódio, ainda que tenha ficado em último lugar. Foi bastante mau, confesso. O carro desligou-se minuto a minuto. Cada vez que parava num semáforo ligava o carro ainda com a segunda engatada. Não conseguia dar atenção a tudo ao mesmo tempo: piões, sinais e manetes do carro. 

O meu ex-companheiro continha-se, calado e a respirar mal. O carro era dele e zerado (como dizem os nossos irmãos brasileiros). 

Tirei a carta em 45 dias. Na época ainda era híper-eléctrica, acordava com uma energia capaz de abanar o mundo. O suficiente para ter aulas de manhã e à noite após o trabalho.

O facto de o meu companheiro ter ficado com a carta suspensa por três meses foi o combustível premium da minha motivação.

Dia 13 de Agosto fiz o exame de condução às 7h30 da manhã. Cheguei a casa às 8h e ainda no duche, antes de sair para trabalhar:

Eu - o teu carro está à porta?

Ele - (silêncio)

Eu - mor…?

Ele - sim. (diz ele, de voz meio esganiçada)

Eu - fixe, queres que te leve ao trabalho?

Ele - (silêncio)

Eu - ouviste?

Ele - queres mesmo levar o carro já hoje?

Eu - sim.

Ele - vais apanhar muito trânsito. Se calhar seria melhor conduzires mais logo...

Eu - ok. Se preferires podes ir com o teu colega.

Ele - Não, não! Pode serrr…

Meia hora depois despedi-me dele, pelo retrovisor, ainda de mão no ar a acenar com um “até logo”. Bloqueado, suado e a meio a tremer.

Dentro de um carro a gasolina. de embraiagem bastante baixa, em plena segunda circular entupida de trânsito e com os condutores maldispostos a buzinarem cada vez que eu deixava desligar o carro, lá cheguei inteira ao trabalho. 

Imagino que o meu trauma não tenha sido menor do que o do meu excompanheiro, nem da minha vitória por ter conduzido o carro primeiro que ele. 

A primeira vez, seja com o que for, pode ser uma atrapalhação. Raramente ser a melhor. Pode saber a pouco, ser desconfortável, ficarmos nervosos e estranhos. É expectável saímos com a sensação de que fizemos tudo mal.

Afinal, a primeira vez é o nosso desconhecido a lidar com algo que desconhece. Há quem chame isto a adrenalina de saltar fora da zona de conforto. Há quem fique viciado nela, tal como no primeiro café da manhã.

Se é apenas a primeira de tantas. Se é a que menos usufruímos. Se é a que menos fizemos bem - porque é que é a que melhor registamos? 

Recordem-se do vosso primeiro dia de aulas, de trabalho, paixão, carro, casa, filho, da saída à noite … é a que mais pormenor conseguem descrever?

Terá a ver com a experiência em si ou com a motivação que nos levou a ela? 

Ou ambas?

Podemos repeti-la por ter sido bom ou não por ter sido melhor do que esperávamos. Podemos não repetir por ter sido mau ou repetir por sabermos que pode ser melhor.

Partindo do pressuposto que é algo saudável: a motivação poderá ser o medo de falhar?

Precisamos de rir mais, dormir melhor, comer menos, perdoar mais, enfrentar mais os medos e sermos menos patetas, para sermos mais felizes e experientes.

Arrisque a descobrir-se mais!

ANSIEDADE INFANTIL NO REGRESSO ÀS AULAS

VERA PINTO
Depois de dias e dias sem horários que obrigassem a levantar da cama, desprovidos de obrigações e com demasiado tempo livre, éis que chega Setembro. Com ele chega também o regresso às aulas para muitas crianças ou o início para outras. Embora não seja regra, é esta a realidade da maioria das crianças que se encontrava de férias. Este (re)começar nem sempre é fácil para as crianças nem mesmo para os seus pais e, por isso a primeira porta de acesso ao canal da saúde abre-se para simplesmente ouvir desabafos dos progenitores, ou noutros casos, para oferecer uma resposta aos seus pedidos de ajuda. De facto, o regresso às aulas não deixa de ser um motivo preocupante, quer para os pais quer para os alunos. Desta forma a farmácia torna-se o caminho de mais fácil acesso para distinguir as situações ligeiras, daquelas que exigem mais atenção e, eventualmente ajuda farmacológica. Pais ansiosos criam filhos ansiosos e filhos ansiosos tornam os pais ansiosos. Esta frase, dita desta forma, parece dar a entender que a ansiedade é contagiosa ou então, uma qualquer doença hereditária. Embora alguns estudos possam apontar para uma predisposição genética ligada à ansiedade ou seja, filhos de pais ansiosos apresentam uma probabilidade maior de ser ansiosos, é verdade também que a ansiedade está directamente relacionada com o meio envolvente. No seio familiar torna-se um círculo vicioso de muito difícil resolução. As crianças são ansiosas por natureza. Quem nunca presenciou o típico “já chegamos” a cada 5 minutos durante uma viagem? Ansiedade nas crianças trata-se de uma emoção bastante frequente e protectora face a ameaças ou situações perigo, desde que não seja excessiva. Quando exagerada torna-se numa combinação complexa de sentimentos de medo, apreensão e preocupação, geralmente acompanhada de sensações físicas como palpitações, dor no peito e/ou falta de ar. Ansiedade pode existir como uma desordem cerebral principal, ou pode estar associada a outros problemas médicos incluindo distúrbios psiquiátricos. Infelizmente, os distúrbios de ansiedade não são um problema exclusivo do universo adulto, estes afectam 13 em cada 100 crianças e adolescentes entre 9 e 17 anos de idade. As meninas são mais atacadas que os meninos e, em metade dos casos, as crianças apresentam ansiedade associada a depressão.

“Mãe, dói-me a barriga”, "Mãe, acho que tenho febre", “Mãe, não quero ir à escola”, medo de ficar sozinho e de falar são alguns dos sinais e sintomas de ansiedade nas crianças, muitas vezes confundidos com desculpas para não ir a escola. Podem parecer os típicos pretextos para ficar a brincar e faltar às suas obrigações, mas não podem ser ignorados.

terça-feira, 26 de setembro de 2017

17 COISAS QUE APRENDI EM 17 ANOS

INÊS LOPES
Este mês, no passado dia 19, celebrei o meu 17.º aniversário. 

17! Tão poucos anos e ao mesmo tempo tantos. Dentro da minha cabeça parece imenso tempo. Talvez porque nestas idades carregamos tanto dentro de nós: tantas dúvidas, tantos sentimentos, tantas descobertas... A vida pesa-nos. E no meio de tanta confusão interior, existe um espaço reservado para as coisas que consideramos mais importantes. Olhamos para mais longe e chegamos à conclusão de que ainda temos muita vida pela frente, mas a vida que fica para trás nunca é em vão, e já nos ensinou mais do que aquilo que pensamos poder aprender algum dia. 

Eu sei que em 17 anos já aprendi MUITO! Aprendi com as pessoas, aprendi com o mundo e aprendi comigo. Aprendi coisas que jamais abandonarão o meu ser. 

Assim, decidi desafiar-me a mim mesma e tentar listar as 17 coisas mais importantes que aprendi ao longo destes anos.

Deixo, aqui, a lista das “17 coisas que aprendi em 17 anos”:

- Não procrastinar é uma das melhores decisões que podemos tomar ao longo da vida.

- Acreditar sempre nas nossas intuições pode levar-nos por caminhos incertos, mas que não se compara a nenhum outro caminho.

- Dizer às pessoas aquilo que sentimos realmente por elas proporciona uma paz interior que mais nada consegue proporcionar.

- Dinheiro gasto em livros, concertos ou viagens nunca é desperdício, devido às sensações que provocam na nossa alma.

- Pessoas negativas não merecem aquilo que temos de mais precioso: o tempo.

- Devemos lutar sempre por aquele sonho que parece impossível de alcançar, pois ele só “parece” impossível... Não é.

- Todos os males que passam por nós servem para tirar algo de bom.

- Por vezes, o silêncio diz mais do que qualquer palavra. 

- Os nossos sentimentos são sempre válidos, e merecem a dedicação que lhes for necessária. 

- O melhor da vida são momentos e sentimentos, devemos respirá-los profundamente e usá-los para definir quem somos. 

- A comparação com outra vida, ou com outra pessoa pode trazer (apenas) infelicidade.

- Se dermos sempre o nosso melhor, nunca poderemos sentir desilusão ou angústia. 

- Devemos tratar-nos da mesma maneira que trataríamos alguém que amamos. 

- Opiniões de outras pessoas são importantes, mas não podem impedir-nos de sermos aquilo que desejamos. 

- A vida começa a ter um significado na sua plenitude a partir do momento em que nos aceitamos a nós próprios. 

- Por vezes, é necessário tirar um tempo para estarmos sozinhos. Para fugirmos do mundo, e nos encontrarmos. 



- A vida não é uma corrida. Não há nenhum sítio para ir, nem nenhum sítio para estar. Apenas existe um momento que nos é concedido para ser vivido.

DAS MARIAS - PROPRIETÁRIAS E DE OUTRAS MARIAS

PEDRO MONTERROSO 
Num episódio recente, numa pesquisa genealógica dos “Registos de Baptismos” anteriores a 1900, que hoje se encontram digitalizados e disponíveis no site do Arquivo Distrital do Porto[1], deparei-me com documentos de um valor imprescindível, para quem quiser fazer um rastreio dos seus antepassados. Alguns destes estão ainda em bom estado, outros estão mais deteriorados, seja pela passagem do tempo, seja pelo descuido no tratamento arquivístico. Hoje, todos podemos aceder a documentos que, para tal, teríamos antes de fazer marcação nas instâncias responsáveis pela manutenção dos arquivos, esperar dias e, com tempo limitado, poder, finalmente, ter acesso a parte da história das nossas famílias, para lá das nossas bisavós (batizados, casamentos, óbitos…).


Nos ficheiros, sobre os quais debruço a minha análise, do século XIX, atento, desde logo, à letra cuidada e até caprichosa do pároco da freguesia. Em abono da verdade, invejo-lhe a caligrafia, por comparação aos meus gatafunhos, que só são salvos pela ascenção da datilografia. Nos livros anuais de batismo, repetem-se as Marias. E os Maneis, portanto. Há uma certa equidade em relação ao género na repetição dos nomes atribuídos, seguindo-se a legitimidade da mesmas, a hora de nascimento e o nome dos pais e respetivos padrinhos.

Por defeito de fabrico, quero dizer, de socialização e formação, dou-me conta de questões que são subjacentes aos documentos, encontrando-me com o pensamento andejo na significação das palavras. Não deixo atentar no tratamento pessoal, aquando dos batizados dos indivíduos em questão e de como esta questão pode, por exemplo, ser extrapolada para a época contemporânea.

A legitimidade dos filhos é uma expressão em desuso na atualidade, fruto da laicização social e da perda da força moralizadora da Igreja Católica. Os ilegítimos, a menos que tenham sido legitimados por um casamento a posteriori, por um pároco, que a troco de algo (não há almoços grátis, lembrem-me!), daria legitimidade social, teriam de viver com o peso da marginalização social. A designação da prole nascida dentro dos laços do matrimónio, era indicada nestes documentos, assim como as profissões dos progenitores, onde se poderá vislumbrar, desde o nascimento, a posição social da recém-nascida.

Ou seja, Maria, com a desvantagem de ser mulher, teria sorte na vida se fosse legítima, não sendo filha de Guilhermina mas de Senhora Dona Guilhermina, proprietária de terras. O marido de D. Thereza, Jozé não-sei-quantos-nomes, não seria certamente lavrador ou tecelão ou jornaleiro. Tão-pouco, como o outro do livro que o pároco lia, poderia ser carpinteiro, mas, sim, proprietário ou industrial, com três ou quatro ou cinco nomes de família, que mui notavelmente lhe ilustravam o estatuto social. Maria, logo à partida, como qualquer Manel, seria filha de um título e não meramente de duas pessoas. Título esse que constava nos nomes de família, que abdicaria em prol do marido após o casamento, sendo o garante de propriedade de um Manoel, industrial.

Já a outra Maria, nascida em mil oitocentos e picos, era filha de Manoel, lavrador e de Anna, lavadeira, enquanto que a Albertina, era filha de Jozé, jornaleiro e Justina, fiadeira. Todos ao serviço de proprietários rurais, que eram os pais de Maria não-sei-quantos-nomes. Por cada novo nado vivo, que dava entrada no livro da freguesia, repetiam-se os autografados nomes, do padrinho e da madrinha, num Portugal rural e feudal que o pároco da freguesia copiosamente resgistava e abençoava. Todos apadrinhados pela Exma. Sra. Dona Guilhermina, proprietária, abaixo assinado, dona dos confins da freguesia de Santa Maria de não-sei-onde, na comarca de nenhures, num país chamado Portugal.

Diz-se que a família tivera relação com barcos negreiros idos para o Brasil, mas isso não me confessa a história, e muito menos estes documentos. Apenas que era excelentíssima, senhora e também dona de três títulos que precediam o nome Guilhermina que à época estaria de moda. Entre as Claudinas, Josefinas, Albertinas, Marinas, Armandinas e Afonsinas estariam todas as outras Marias com nomes terminados em “ina”, permitidos pela onomástica portuguesa. Restam algumas Catarinas, Carolinas e Cristinas. Como que no seguimento, da lei[2], de que “tudo que vicia começa pela letra ‘C’” também os nomes estarão viciados por este mistério!

Tendo estes registos prestado-me auxílio para fazer o rastreio dos meus antepassados até meados do século XIX, tiveram de ser interrompidos, pela dificuldade de rastrear a origem de certos elementos da família, que teriam vindo de outras freguesias. É que, às vezes, lá vinha um forasteiro de outra freguesia, dar continuidade à família, para que tudo não acabasse em relações incestuosas. Tudo parecia mais fácil se se pregasse sempre na mesma freguesia, entre famílias conhecidas, que culminava tudo numa grande família, numa diversidade singular de toda a família Oliveira, ou Pereira. Ou dos Santos, ou Silva, ou Ferreira.

O “Zeitgeist”, conceito alemão para “espírito da época”, ou por outras palavras, os sinais do tempo, pode ser ser vislumbrado também nestes documentos, embora haja muito que ficou por contar. Há, no entanto, histórias diluídas em contos, que as avós ainda contam, um tanto difusas, outro tanto imaginadas, enfim, que poderiam ser mais e melhor registadas. Para falar de todas as Marias, e não apenas das Marias-proprietárias, das quais, a história já reza suficientes ladainhas. É nosso dever conhecer a história, que é uma forma de saber donde vimos e para onde vamos.

Como exemplo admirável na história mediática portuguesa, e na história em geral, sugiro a visualização do trabalho de Michel-Marie Giacometti, realizado por Alfredo Tropa, apresentado e divulgado pela RTP, com o título de “Povo que canta”. Nesta série, apresentada durante três anos pela televisão pública, o etnolólogo francês, junto com a sua equipa e equipado de uma bibliografia e um rigor de investigação, pouco comum no contexto do Estado Novo, faz uma recolha de cantos populares portugueses, de norte a sul do país, que nos leva a refletir sobre os percursos da nossa identidade, enquanto povo. Nesta série, é recuperada uma boa parte da memória musical popular, desses que de outra forma seriam esquecidos, mas que tanto contribuíram para a nossa identidade coletiva. Para que não caiamos repetidamente no perigo de não conhecermos as nossas raízes enquanto povo – diferenciado por questões de classes sociais, de género, de gerações, com com a falsa ideia de que somos uma massa homogénea. Das Marias e dos Maneis, dos Faustinos, Claudinas e Albertinas, pouco fica narrado na história, conquanto, isso seja uma decisão nossa, numa sociedade que, ainda hoje, continua muito desigual, também pelo preconceito de olhar para si mesma.

Vírgilio Ferreira afirmava que a eternidade dura, enquanto não se é esquecido, remetendo para a memória dos homens a responsabilidade do eterno, memória essa, que, quer queiramos, quer não, será sempre e invariavelmente efémera, dado o tempo de vida dos homens. Mesmo 100 gerações, na escala da Vida, no seu conceito mais amplo, se resume a menos que a duração de vida de certas árvores. No entanto, há que colocar o eterno, enquanto objetivo. Será, talvez, mais razoável medir a eternidade da memória dos homens, como Vinícius de Moraes mediu a duração do amor, que é eterno enquanto dura[3]. Pois, então, que ousemos que ele dure e que nele caibamos todos.

----------------------------------------------------------------------------------------------


[2] “Tudo que vicia começa pela letra C”, vídeo de Ricardo Mallet, que deu origem ao texto, com o mesmo título que, falsamente, se atribui a Luís Fernando Veríssimo. https://www.youtube.com/watch?v=5NoXW48uw1Y

[3] Vinicius de Moraes, Soneto da Fidelidade, 1960, http://www.releituras.com/viniciusm_fidelidade.asp

VENHO DE LONGE

REGINA SARDOEIRA


Venho de longe
o perto nada me diz
por ele desvairo
por ele me arrasto
por ele rodopio
em circunvoluções de inépcia

sim venho de longe
das longínquas estrelas
(talvez desvanecidas)
dos fundos oceanos
(decerto enegrecidos)
do alto das montanhas
(se calhar mergulhadas
em névoa entretecida)

o perto
não tem poder para agarrar-me
nele me vou perdendo
(sombriamente)
como um eco de mim
um simulacro de rosto
uma sombra
uma esfinge

vou para longe
nessas sendas ignotas
(até de mim própria)
em desvios agrestes 
por rochedos inóspitos
e areias movediças
arrastarão meus passos

o perto
causa-me náuseas
trepido de ansiedade
bocejo de angústia
(o perto)
tem o travo das lágrimas
e o gosto do sangue
e arde
e dói
como espartilho gasto


venho de longe
(porque sou de longe)
vou para longe
(porque é lá que pertenço)
e quando estou perto
(neste perto de aqui)
é o longe que anima
os meus passos
de agora

segunda-feira, 25 de setembro de 2017

44 ANOS DE GUINÉ-BISSAU

CRÓNICA DE JOANA BENZINHO
Celebrou-se, ontem, o 44.º aniversário da independência da Guiné-Bissau, declarada unilateralmente pelos combatentes do PAIGC nas colinas de Boé, no Leste do País, tendo sido a pioneira entre todas as ex colónias portuguesas.

Esta independência da Guiné, muito invejada à época pelos outros territórios ultramarinos, trazia com ela todos os sonhos do mundo, não tivesse sido idealizada e burilada pelo grande homem da história da África Ocidental, Amílcar Cabral.

Já não viveu para a saborear, traído que foi por um dos seus que lhe ceifou a vida na Guiné Conacri, 8 meses antes deste dia, mas tudo fez para que ela acontecesse. 

44 anos passados, não tenho qualquer pretensão ou mesmo legitimidade para julgar se os guineenses estão melhor ou pior, apenas me cabe constatar que quatro décadas de independência foram claramente insuficientes para assegurar o mínimo de bem estar e de futuro aos seus cidadãos. 

Os ensinamentos e desejos de Cabral, apesar de serem uma constante na discursata oficial de todos os quadrantes sociais, militares e políticos, ainda esperam por quem os consiga por em prática. Os cidadãos, na sua grande maioria jovens, encontram no seu país escassas oportunidades de acesso aos bens mais básicos como à alimentação, à educação ou à saúde. Os salários são baixos, quando existem e são pagos, e os bens essenciais são comercializados a valores ocidentais, incomportáveis para muitas das magras bolsas guineenses. O Estado é frágil.

Mas o país, a independência, a soberania são bens inalienáveis e inquestionáveis e representam um enorme motivo de orgulho para os seus. Comove-me sempre ao ver o sentimento com que as crianças, desde tenra idade nos jardins infantis, de olhos fechados e mão ao peito cantam a plenos pulmões o hino nacional: "Viva a pátria gloriosa! | Floriu nos céus a bandeira da luta | Avante, contra o jugo estrangeiro | Nós vamos construir | Na pátria imortal | A paz e o progresso!"

São estas meninas e meninos, "as flores da nossa luta e a razão do nosso combate", como dizia Amílcar Cabral, que irão um dia herdar os destinos deste país. Aos avós e pais das muitas crianças guineenses, em mais este aniversário, ficam os votos de que façam da Guiné um país melhor, apetecível, de onde não se tente fugir numa onda migratória de contornos incertos por falta de oportunidades junto dos seus. Que consigam ser o garante da paz, do progresso e da estabilidade da Guiné-Bissau, não defraudando os preceitos inscritos no seu hino e permitindo aos mais novos sonhar um futuro de sucesso para si e para a Guiné-Bissau.

A FREE WORLD OF STRINGS

CAROLINA CORDEIRO
One of my favourite university Professors once told me that I should only write about the things that I know. And I’ve been faithful to this premise ever since. No matter how fictional my sentence is, its basis will always be of truth. And, bearing that in mind I’ll write you today about my holiday’s experiences. I will start with my last, since it is the one which is most alive in my self: my stay in Pico Island and what I have learnt about the world of strings to which I was introduced by the Cordas Festival. 

For those who know me, this is not news: I love Pico Island. Had I not been born in S. Miguel and given the possibility of choosing my birthplace, unquestionably I would have chosen Pico. Not that it’s more beautiful than my island but I would have, gladly, been born there. Naturally, you may think and say that had that happened I would not feel the same. Who knows? The fact is that Pico’s beauty lies not only by being the island of the highest Portuguese mountain — one I have never climbed but wish to do so, quite soon; nor because of its gorgeous black lava rocks contrasting with the bright red windows and doors, but it’s the island’s aura. Even if you don’t believe in such a thing, rest assured that you will feel something extra coming from the soil as you walk by. I cannot explain it better than this: a feeling comes from within the earth core, travels up to surface and enters your body like love and passion do. And, as such feelings, it consumes you as no other.

When you are a tourist, there are still a lot things you can do to improve your stay. A lot more information could be given, for isntance. However, I’ve been coming and going to Pico, for different reasons, and I can, hands down, tell you that it has changed — for the better — in the past five years. Why? Art came in to being in Madalena and it has been growing and spreading around the streets of this island. When you are part of something new, you are always afraid. But, nonetheless, you try and you push and you grow and then something magical happens: you make dreams come true. This is what MiratecArts has done to me.

Last year, I participated in the first Cordas World Music Festival as the winner of the literary short-story contest. But that was not the “wow” factor. The “wow” part was meeting people from other places and see how the artists enchanted the audience with their string melodies. If last year was a “wow” year, then this year I have no adjective for it, since it transcended my expectations. Apart from the local and already known artists like Rafael Carvalho, Luís Alberto Bettencourt and Ruben Bettencourt, I (and those who were lucky to attend the concerts at the new Madalena’s auditorium) have met artists from Brazil (Maninho), China (Lu Yanan), Mozambique (Michel William), Cape Verde (Tcheka) and Israel (Eran Zamir). I have met the way they are gentle, creative and giving people not only throughout their own personalities but also about their music. What a sound! I could go on about what memories and which chords (no pun intended!) they have struck in me but that would be attempting to reach a level I am not able to. I can only say that I and the audience — “we few, we happy few” — and our minds were blown away and can only hope for the same for next year’s festival, which is already in the making. If you are planning to pay a visit to the Azores, around September, please check if there is a way to stop by Pico Island so that you can be part of this Cordas Festival. It’s worth every penny you spend on the flight ticket because the festival is open to the public and it’s free. Free! Can you imagine that? Having these artists (some have never been to Portugal before) performing in a tiny middle atlantical island for free? Yep! It’s Cordas Festival. It’s what MiratecArts offers you: art for everyone, in every possible way, for free. Free!

DEFINITIVAMENTE, TALVEZ

DIANA RAMALHO
Talvez não precisemos de razões e nos bastem os ideais.
Talvez as ideias que levam às ações sejam mais do que meios
e consigamos atingir os fins usando só o que o inconsciente nos mostra
mas raramente somos capazes de perceber.
Quem sabe.
Talvez seja mesmo amor ou estejamos perto dele, sem o saber.
Porque hoje acordei a pensar em ti mas,
por outro lado, não me recordo se sonhei contigo.
Não sei se somos feitos de saudade mas a saudade faz parte de nós
e chega a tornar-nos parte dela.
Não sei, sequer, se é sempre nossa.

Definitivamente, é amor.
Ou isso, ou estamos perto dele. No fundo, eu sei.
Somos feitos de saudade que não é nossa,
de saudade que se começa a fazer sentir quando começamos a ser dela.

Tenho saudades tuas.
Talvez acabe por matá-las ou elas me matem a mim.
Definitivamente, não precisamos de razões.
Eu amo-te e acordo a pensar em ti como se tivesse sonhado contigo.

domingo, 24 de setembro de 2017

CRÓNICA. CINEMA. CULTURA

JOÃO PINTO
Uma vez o Woody Allen disse naquele que é um dos seus clássicos que sentia que a vida era dividida entre o horrível e o miserável e que eram essas as duas categorias, onde o horrível são os casos terminais, e os cegos e aqueles que jamais voltarão a andar, e que o miserável são todos os outros, e que nos devíamos dar como gratos pela sorte de nascermos miseráveis.

Nascemos em berços estranhos onde se ecoam notícias de um "homem" laranja, de mísseis e de diplomacias bélicas que retiram qualquer sentido diplomata da expressão em si. Mais do que nunca existe um bombardeamento de informação que alude a massas mudarem de opinião conforme a subserviência que é pixelizada seja onde for, como for e sobretudo a quem convém. Não usamos os recursos para fundamentar mas sim para alimentar uma opinião mal formada acerca de tudo o que nos rodeia. É estranha a geração que é alimentada por sonhos fabricados por aqueles que com eles irão lucrar. Ainda mais estranho é perceber que esta alienação não atinge uma geração mas sim um mundo delas. Sem esquecer o mundo daqueles que diariamente se contrariam à formatação e que contribuem para tanto que para o povo parece tão pouco. Esses que são os esquecidos, pois não têm em mente aquilo que parecem ser os pontos fulcrais no final do dia: lucro e luzes. É fácil esquecer que essas luzes conseguem cegar qualquer tipo de liberdade que supostamente nos é dito termos. É por isso que é importante projetar uma visão abrangente sobre tudo o que nos envolve. E sobretudo, ser capaz de olhar para além do panorama geral. Ser capaz de olhar para o que está à nossa frente da nossa própria forma, por mais promiscua ou insignificante que possa parecer, se há coisa que o cinema nos pode ensinar, é que nada é insignificante se for olhado da forma certa. Este texto, crónica ou o que quer que seja não vem a propósito de cinema, vem a propósito de cultura, e do quão desprezada ela é. Não falando de dinheiro ou de percentagens mas falando da mentalidade perante o cultivo do nosso futuro.

Começava eu a redigir sobre o Woody Allen. Lembro-me de ver o Manhattan pela primeira vez e como qualquer filme do Woody Allen me fascinar por o quão comum qualquer linha de diálogo poderia parecer não fosse ela escrita por quem foi. E que qualquer beco de Nova Iorque tinha a sua história, o seu traço e a sua própria vida. Pois não se tratavam de diálogos comuns, mas sim de temas comuns, do nosso quotidiano. Pequenas conversas e pequenos momentos que se projetam ao comportamento do humano. E pouco a pouco pela história do cinema e francamente de qualquer forma de arte se percebe que se pode tornar o comum em matéria merecedora de ser apreciada, desde que não caia no erro de ser vulgar. O comum e o vulgar, o banal são diferentes. E cabe-nos a nós perceber isso. Perceber que a nossa pequena contribuição para um mundo voraz está na facilidade inquietante do atrevimento de pensar. Pensar em desassossego. Transformar o pouco que está à nossa volta numa ideia que virá ou não a promover-se perante todos nós. E se tal não acontecer, promover-nos a nós mesmos. Quer seja o perfeccionista Kubrick com a sua inquietude na representação do comportamento humano e nas odisseias do mesmo, o colorido Wes Anderson com histórias que fazem trazer ao de cima todos os elementos por vezes esquecidos pelo público na sétima arte, o peculiar David Lynch cuja imaginação será apenas compreendida pelo próprio, seja o cinema feito onde for, como for, de que ano, género ou temática abordar há algo em comum que se retira de qualquer obra, e é de que qualquer tema, qualquer ideia, sem pensar no tamanho da mesma, é um contribuinte para aquilo que enquanto humanos vamos tentando fazer, ou pelo menos deveríamos. O afastamento da ilusão de que tudo o que está à nossa frente é o que acontece. Pois bem, nós vê-mos uma fração imaginária daquilo que acontece à frente de uma câmara. Não nos ousemos a esquecer o que está por trás dela. Vamos praticar a ousadia de nascermos miseravelmente capazes.