RUI CANOSSA |
O Orçamento de Estado é o instrumento de gestão que contém a previsão das receitas e despesas públicas, apresentado pelo Governo à Assembleia da República, sob a forma de Proposta de Lei, até ao dia 15 de outubro de cada ano.
Este ano a proposta foi apresentada dia 14 deste mês, por ser sexta-feira e com três horas de atraso em relação ao previsto. Sinal do que viria por aí? Este orçamento revela em sim algumas contradições. Vejamos algumas delas.
Com vista a promover a aquisição de veículos movidos a energias alternativas, está prevista uma redução do Imposto sobre Veículos na compra de veículos híbridos "plug-in". Por outro lado, estabelece-se um novo escalão para os veículos usados "importados" com menos de um ano e diferentes escalões para os veículos com mais de cinco anos, com uma percentagem de redução de imposto para os veículos mais usados e potencialmente mais poluidores. Ou seja, é um Orçamento que nem deixa de promover a mobilidade elétrica nem deixa de fomentar a circulação de veículos mais poluidores.
Sob pretexto de incentivar hábitos alimentares saudáveis, alarga-se a tributação do imposto sobre o álcool e as bebidas alcoólicas às bebidas açucaradas sem que o imposto (cerca de 16 cêntimos por litro) possa produzir um verdadeiro efeito de diminuição do consumo. Ou seja, é um Orçamento que nem deixa de sinalizar comportamentos nefastos para a saúde nem produz um verdadeiro efeito dissuasor acompanhado por medidas de regulamentação da composição dos alimentos.
A coberto de objetivos de natureza ambiental, serão tributadas as munições com chumbo (2 cêntimos por cartucho) sem que se perceba o enquadramento desta medida avulsa na política de conservação da natureza. Ou seja, é um Orçamento que nem esquece a importância da Fiscalidade Verde nem obtém receita materialmente relevante que possa ser canalizada para a promoção da biodiversidade.
Com o objetivo de atingir maior equidade e justiça fiscais, aumentam-se (muito) os impostos indiretos e reduzem-se (parcial e gradualmente) os impostos diretos (e neste caso, apenas o IRS). Ou seja, é um Orçamento que nem reduz substancial e imediatamente os impostos diretos nem diminui a carga fiscal global atendendo ao aumento substancial dos impostos indiretos.
Com o propósito de possibilitar um pequeno aumento de (algumas) pensões, é criado um adicional ao Imposto Municipal sobre Imóveis que penaliza fortemente as pessoas singulares e empresas que possuam imóveis, sem cuidar de aferir o impacto que esta medida possa vir a ter no investimento estrangeiro e nacional. Ou seja, é um Orçamento que nem devolve, verdadeiramente, rendimentos aos cidadãos nem incentiva o investimento privado nem estabelece, com o nível de despesa, as condições necessárias à promoção do investimento público nem o crescimento económico do país.
Para garantir a aprovação na Assembleia de República, foram consideradas, com limitações, as propostas dos partidos de esquerda que suportam o Governo à luz das diretrizes do Tratado Orçamental. Ou seja, nem é um Orçamento dos partidos que apoiam o Governo, nem será, seguramente, da Comissão Europeia...
Não sendo nem uma coisa ou outra, nem se percebe o que é este Orçamento.
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