ELISABETE SALRETA |
A minha filha é a minha maior crítica. Lê os meus textos e detesta histórias que acabam mal. Detesta as histórias em que mato os bichos, como ela diz.
Porque a perda de um animal é um sentimento real.
Para muitas pessoas não diz mais do que um qualquer objecto ou papel velho que se deita ao lixo. Para outras, é uma familiar que parte e ficam realmente doentes com essa dor.
Muitas vezes, o animal substitui aquele amigo, aquele irmão, aquele filho do qual temos uma necessidade de cuidar e que nos cuide. Nós somos tudo para eles e por vezes, não temos o menor problema em os decepcionar. Mesmo assim, não se afastam de nós. Como as crianças não têm como se afastar dos seus pais, apesar das sovas que posam apanhar. Está escrito na nossa informação genética a necessidade de cuidarmos e sermos cuidados. É essa a relação entre pais e filhos, independentemente do lugar que cada um tenha a dada altura. Os animais são os nossos filhos, e nós acabamos por ser tudo o que têm. Para os cães, pertencemos e somos uma matilha (família), em que somos dominantes. A esses seres ditos superiores, existe a obrigatoriedade de providenciar alimento e segurança. Tantas vezes falhamos. Mesmo assim, não somos escorraçados do seu coração e de bom grado nos perdoariam por tamanhas omissões.
Os animais são grandes, bem mais desenvolvidos que os humanos imperfeitos que ainda guardam mágoa, rancor e tantos sentimentos que nos puxam para o abismo. Para eles, importa o agora. Vivem o momento.
O cão só se sente feliz quando está a ser útil ao seu tutor, mentor, dominante na família. E faz tudo. Até esquecer-se de si próprio. Dá até à última gota de sangue pelo bem maior que é a família. Não seriamos capazes de o fazer. Apenas o sentimento de uma mãe pela sua cria pode ser comparado a esta sensibilidade tão nobre.
Não admira que para muitos, perder um animal de companhia seja uma dor tão grande.
É lamentável que não sejamos nobres o suficiente para compreender este tipo de dor e que tantas e tantas vezes utilizamos a crítica para desculpar, camuflar a nossa falta de sensibilidade.
Certo é que tantos entram em depressão após tamanha perda. A sociedade não está preparada para o sentimento. Ainda hoje o sentimento é tido como sinal de fraqueza.
Não será fraqueza a inexistência de nobres sentimentos?
Para onde caminhamos?
Como sempre um relato interessante e actual da poetisa Elisabete Salreta. Parabéns!
ResponderEliminarMuito bem escrito. Somos assim. Capazes de compreender a razão das coisas e o lugar que nos compete. Porém a prática, embora não geral, deixa muito a desejar...
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