LÚCIA GONÇALVES |
E eis que, lentamente, o outono vai chegando…
Os dias vão amanhecendo menos risonhos e terminam já com aquele friozinho gostoso que lembra o cheiro a castanha assada e...a infância!
As árvores despem-se da folhagem colorida pelo envelhecimento e transformam, o meio envolvente, num autêntico tapete macio e escorregadio. Gosto do outono, apesar da sua conotação mais tristonha.
Nas aldeias começam as colheitas próprias da estação, entre elas as vindimas. As uvas gradas e doces, uma delícia de serem colhidas e comidas diretamente das videiras.
Hoje em dia é uma atividade monótona, executada apenas pelas populações idosas que por lá permanecem. Perdeu-se o movimento e alegria de antigamente, em que as mulheres enchiam os cestos que, os homens carregavam para o lagar.
As crianças, após o regresso da escola, eram incumbidas de apanhar os bagos que iam caindo por entre os dedos das vindimadeiras… Nos ouvidos a frase todos os anos repetida: “fulaninho de tal fizera, com os vagos, várias pipas de vinho, no ano anterior…”.
Santa inocência! Sim, claro que faziam, mas com a soma de todos os bagos. Claro!
As mãos pegajosas e doces… Quão doces eram as vozes que ninavam as canções que entoavam campos fora…
À noite, os homens lavavam os pés, arregaçavam as calças e, de braço entrelaçado, pisavam as uvas lentamente, camada a camada. E nem um duro dia de trabalho esmorecia a boa disposição noturna, riam e brincavam como só o consegue quem está tranquilo na vida.
E porque a tarefa atrasava o jantar, que as gentes da aldeia chamavam de ceia, a meio faziam uma pausa para petiscarem alguma coisa: por norma nozes e pão, acompanhadas de um bom bagaço. E claro, à saída do lagar, a prova do vinho doce não podia faltar!
Na cozinha, as mulheres preparavam uma refeição melhorada e as crianças cirandavam por ali, felizes com a quebra da rotina.
Ah o outono… que inundava de expetativa os rostos de toda a gente, afinal trazia a reboque, a época em que todas as famílias se juntavam, apenas pelo simples e grande prazer de estarem juntas…O natal!
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