domingo, 2 de outubro de 2016

O BURNOUT NOS CUIDADORES FAMILIARES

CARLA SOUSA
O processo de envelhecimento 

“Tenho 65 anos, fui emigrante em França e na Alemanha e cá em Portugal trabalhei em várias zonas. Sempre gostei da vida! Reformei-me há sete anos e pensei que ia continuar a ter uma vida bonita, mas enganei-me...há sete anos que não tenho descanso... a minha esposa teve uma trombose e está acamada. Ela berra toda a noite, passo a minha vida lá fora, naquela mesa de pedra, a ver os outros a passar e sempre à espera que chegue o domingo, para ir dar uma volta. Vivo com a minha filha mais nova, os outros filhos estão casados e têm os seus empregos e as suas casas. Quando as empregadas do Apoio Domiciliário chegam, aproveito para ir a Barcelos. Nunca pensei acabar os meus dias assim (choro). Vou morrer em casa, à porta! Dantes um maço de cigarros dava para dois dias, agora... Nunca tomei remédios na minha vida e estou a tomar agora. Nunca sofri de nada e agora estou preso de pés e mãos...”
(Entrevista n.º 6: indivíduo do sexo masculino, 65 anos) 

(Barbosa, F. & Matos, A. (2008). Cuidadores familiares idosos: Uma nova realidade, um novo desafio para as políticas sociais. Configurações [Online], 4, posto online no dia 12 de Fevereiro 2012. URL : http://configuracoes.revues.org/491. doi: 10.4000/configuracoes.491)

Cada vez mais constatamos que na nossa sociedade existe um intenso movimento no sentido de adiar ou de tentar evitar o processo de envelhecimento.

O ageism, ou preconceito da idade, é um processo de marginalização onde os interesses e as necessidades dos idosos recebem menos atenção do que os das pessoas mais jovens.

A forma mais comum de discriminação cultural tem sido o estigma do “descartável”, “passado” ou “peso sociais. “Nos dicionários emocionais da população, velhice é sinónimo de decadência, perda e de perda de dignidade.” (Charazac, 2004)

Envelhecer é uma experiência que pode suscitar medos: medo da solidão, da morte, de doenças, da dependência física e psicológica, de perder espaço nos diversos papéis conquistados (afetivo, familiar, profissional, social). Costuma-se a associar a idade ao conhecimento e sabedoria. Envelhecer significa tornar-se num ser maduro, experiente, mas conservar esta maturidade nem sempre é fácil. O envelhecimento afeta o funcionamento físico e a saúde. Os sistemas e os órgãos deterioram-se, tornando-se mais susceptíveis a problemas. 

No entanto, ao processo de envelhecimento também estão associadas doenças neurodegenerativas – demências.

É bastante comum ouvir-se familiares dizerem do seu idoso que está “cheché” sem que percebam que pode estar doente e deve ser avaliado por um profissional da saúde. Isto tem contribuído para um desgaste e burnout dos cuidadores que se tornam bastante vulneráveis a perturbações psiquiátricas, como a depressão. É importante o diagnóstico precoce pois pode favorecer o próprio paciente e os seus cuidadores a compreenderem e a lidarem de forma adequada com a doença. 

Cuidar de um idoso exige tempo, energia, capacidade, disponibilidade e afetividade. 

Segundo Karsch (1998) um dos factores determinantes para o familiar se tornar cuidador é a obrigação e ou dever que tem para com o idoso. Os cuidadores atribuem a sua vontade e o seu compromisso de cuidar ao desejo de retribuir os cuidados recebidos na infância e ao pânico, medo de poder sentir culpabilidade.

Os cuidadores familiares são normalmente familiares diretos, como o cônjuge, filho/a, nora, neto/a, qualquer membro da família, que voluntariamente assume a tarefa de cuidar do seu familiar.

A Síndrome de Burnout nos cuidadores familiares não é raro, é muito mais comum do que pensamos.

Como identificá-lo? O cuidador pode sentir fadiga, palpitação, aumento da ansiedade, dor de cabeça e tensão muscular; depressão; apatia; tédio; declínio no desempenho do trabalho; hipertensão; insónia; irritabilidade; aumento no hábito de beber e fumar; desinvestimento afetivo e emocional na tarefa de cuidar; aumento no consumo alimentar; tensão familiar e com amigos. Sente-se exausto física e emocionalmente.

O quotidiano do cuidador familiar do idoso com dependência ou demência pode provocar, por vezes, comportamento agressivo de ambas as partes. A sensação de exigências excessivas, as constantes repetições e queixas por parte do idoso cuidado pode levar ao desenvolvimento desta síndrome.

As formas de análise e de averiguação deste desgaste são diversas, pois os sintomas poderão ser diferentes de indivíduo para individuo. 

A demência bate à porta e vem de maneira silenciosa…

Reforçando a ideia de que os cuidadores devem ter o apoio necessário para exercer sua tarefa de forma adequada. 

Usando-se estratégias de coping adequadas pode reduzir-se e prevenir-se o stress. 

É importante que o cuidador se cuide e deixe-se cuidar.

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