quinta-feira, 2 de novembro de 2017

140 ANOS DE TEIXEIRA DE PASCOAES

Nascido a 2 de novembro de 1877 na freguesia de São Gonçalo de Amarante, morreu a 14 de dezembro de 1952 no Solar de Pascoaes em Gatão, pertença da sua família, de onde retirou o seu nome literário pelo qual ficou conhecido. Joaquim Pereira Teixeira de Vasconcelos, de batismo, é filho de Carlota Guedes Monteiro e de João Pereira Teixeira de Vasconcelos, deputado às Cortes por Amarante e abastado agricultor. Era tido como um homem de cultura e inteligência notáveis bem como um brilhante conversador pelo que exerceu uma profunda influência na orientação intelectual e espiritual do seu filho.



AUSENCIA

Lúgubre solidão! Ó noite triste! 
Como sinto que falta a tua Imagem 
A tudo quanto para mim existe! 

Tua bemdita e efémera passagem 
No mundo, deu ao mundo em que viveste, 
Á nossa bôa e maternal Paisagem, 

Um espirito novo mais celeste; 
Nova Forma a abraçou e nova Côr 
Beijou, sorrindo, o seu perfil agreste! 

E ei-la agora tão triste e sem verdor! 
Depois da tua morte, regressou 
Ao seu velhinho estado anterior. 

E esta saudosa casa, onde brilhou 
Tua voz num instante sempiterno, 
Em negra, intima noite se occultou. 

Quando chego á janela, vejo o inverno; 
E, á luz da lua, as sombras do arvoredo 
Lembram as sombras pálidas do Inferno. 

Dos recantos escuros, em segredo, 
Nascem Visões saudosas, diluidos 
Traços da tua Imagem, arremêdo 

Que a Sombra faz, em gestos doloridos, 
Do teu Vulto de sol a amanhecer... 
A Sombra quer mostrar-se aos meus sentidos... 

Mas eu que vejo? A luz escurecer; 
O imperfeito, o indeciso que, em nós, deixa 
A amargura de olhar e de não vêr... 

A voz da minha dôr, da minha queixa, 
Em vão, por ti, na fria noite clama! 
Dir-se-á que o céu e a terra, tudo fecha 

Os ouvidos de pedra! Mas quem ama, 
Embora no silencio mais profundo, 
Grita por seu amor: é voz de chama! 

E eu grito! E encontro apenas sobre o mundo, 
Para onde quer que eu olhe, aqui, além, 
A tua Ausencia tragica! E no fundo 

De mim proprio que vejo? Acaso alguem? 
Só vejo a tua Ausencia, a Desventura 
Que fez da noite a imagem de tua Mãe! 

A tua Ausencia é tudo o que murmura, 
E mostra a face triste á luz da aurora, 
E se espraia na terra em sombra escura... 

Quem traz o outomno ao meu jardim agora? 
Quem muda em cinza o fogo do meu lar? 
E quem soluça em mim? Quem é que chora? 

É a tua Ausencia, Amôr, que vem turbar 
Esta alegria etérea, nuvem, asa 
De Anjo que, ás vezes, passa em nosso olhar! 

O Sol é a tua Ausencia que se abrasa, 
A Lua é tua Ausencia enfraquecida... 
Da tua Ausencia é feita a minha vida 
E os meus versos tambem e a minha casa. 

Teixeira de Pascoaes, in 'Elegias'

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