quarta-feira, 8 de novembro de 2017

AS ELEIÇÕES NA CATALUNHA

RUI SANTOS
Este ano, o Natal na Catalunha vai ser diferente pois será debaixo das fortes emoções que o escrutínio regional, que ocorrerá quatro dias antes, certamente vai provocar em todos os catalães. Marcadas para o dia 21 de Dezembro, as eleições regionais da Catalunha vão sufragar a independência, ou não, daquela região espanhola. Embora o acto eleitoral em causa diga respeito à escolha de um parlamento regional, os eleitores sabem que aquelas eleições foram transformadas num plebiscito à permanência da Catalunha como parte de Espanha. Todavia, estas eleições encerram em si uma particularidade de certo modo surreal. Foram marcadas por Espanha depois da Catalunha ter declarado unilateralmente a independência e a ter suspendido logo de seguida. Após ser conhecida a data do acto eleitoral, os partidos políticos que apoiam o governo catalão aceitaram participar em eleições realizadas por um país ao qual eles consideram já não pertencerem. Toda a lógica deste raciocínio produzido pelos políticos independentistas catalães tolda-me a mente.

Como resultado das eleições regionais de 2015, o parlamento da Catalunha é composto por uma maioria de deputados independentistas. Contudo, foram os partidos «espanholistas» que obtiveram um maior número de votos. Esta situação deve-se ao facto do sistema eleitoral catalão não ser proporcional, funcionando de forma análoga ao existente nos Estados Unidos da América. Tendo a mesma votação, uns círculos eleitorais elegem mais deputados que outros, o que enviesa o número de parlamentares relativamente à votação obtida pelos partidos políticos. Como tal, quando Carles Puigdemont, o deposto líder do governo catalão, afirmou ter a legitimidade do voto para proclamar a independência não estava a ser totalmente correcto. Sendo assim, creio que deveria ter havido diálogo, por parte de Espanha e da Catalunha, para ser alterada a Constituição espanhola e ser permitido, à luz da lei, a execução de um referendo que reflectisse de forma fidedigna do sentimento catalão.

É sem dúvida importante que o rei e o governo espanhol se pronunciem sobre o que acontecerá no caso de ocorrem dois cenários após serem conhecidos os resultados eleitorais:

a) Parlamento com maioria independentista e maior número de votos em partidos independentistas

b) Parlamento com maioria independentista e maior número de votos em partidos «espanholistas».

Ou seja, se a hipótese a) se verificar, a Espanha estará disposta a dar a independência à Catalunha? E se não der, o que vai então propor? É que a manutenção da actual situação será impossível. Caso ocorra a hipótese b) o que será tido como expressão da vontade popular? Deputados ou eleitores?

De igual forma, os partidos pró-independência deverão elucidar os eleitores sobre alguns assuntos, nomeadamente:

a) Pertença à União Europeia e à zona euro

b) Livre circulação dentro do espaço Schengen

Serem independentes e continuarem na União Europeia e na zona euro é impossível. Nunca tal acontecerá pois iria abrir uma verdadeira caixa de Pandora que, no limite, originaria a implosão do projecto europeu. O impedimento dos catalães circularem livremente no espaço Schengen seria imediato e isso iria levantar barreiras não só à sua mobilidade, como também afectaria fortemente o turismo na Catalunha.

Estas questões são vitais para o dia-a-dia dos catalães, das empresas lá localizadas e daquelas que para lá exportam. Se a saída das sedes empresariais não acarreta grandes alterações em termos de postos de trabalho, uma deslocalização das unidades de produção implicará fortes transformações do tecido económico e social da Catalunha. Até que ponto os catalães estão conscientes do que lhes reserva um futuro fora de Espanha e da União Europeia? Esta é uma pergunta à qual creio não haver resposta.

Finalmente, o que estará também em causa nas eleições de 21 de Dezembro será a posição dos catalães sobre a Europa. Isto porque os apoios à causa independentista têm origem na extrema-esquerda catalã e espanhola, e mais recentemente, na Rússia (via Ossétia do Sul), assim como na extrema-direita belga e de alguns países do leste europeu. Ou seja, o voto pela independência é também um voto contra a União Europeia e o espírito europeu desenvolvido após a Segunda Guerra Mundial. Interrogo-me como é possível os independentistas afirmarem que a Espanha oprime e não deixa a democracia ser exercida na Catalunha, enquanto esta reúne apoios para a sua causa entre forças políticas que não têm a democracia como sua característica. Aliás, nenhum país considera a Espanha um país não democrático. Se assim fosse não poderia, por exemplo, ser membro da União Europeia.

Voto consciente, racional é o que se pede aos eleitores catalães no dia 21 de Dezembro. Objectividade e ausência de demagogia durante a campanha eleitoral é o que se deseja aos partidos políticos.

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