quarta-feira, 14 de dezembro de 2016

AS COMUNIDADES DE IMIGRANTES E A DIVERSIDADE ÉTNICA

RUI SANTOS
A presença de imigrantes num determinado país implica a coexistência de uma, ou várias, culturas distintas da do país de acolhimento. Podem ser oriundos de diferentes tipos de sociedades, com diferentes tradições, religiões, sistemas e instituições políticas. Na maioria das vezes falam línguas diferentes, utilizando-as durante algumas gerações, e têm práticas culturais distintas. Podem ser visivelmente diferentes pela aparência física ou pela maneira de vestir. Essa diferença conduz muitas vezes a atitudes de discriminação por parte da sociedade de acolhimento. Jurjo Torres Santomé distingue sete modalidades de discriminação:

1) Discriminação legal – Quando a legislação outorga direitos distintos em função da pertinência, e não dos cidadãos, a uma determinada raça, género, nacionalidade ou classe social.

2) Discriminação científica – Sustenta-se em discursos científicos que argumentam e naturalizam comportamentos humanos distintos por pertencer a uma determinada raça, género, nacionalidade ou classe social.

3) Discriminação social – Manifesta-se nas reais dificuldades que determinados colectivos sociais enfrentam para obter determinado posto de trabalho e salário, viver em determinados espaços geográficos, aceder a determinados lugares, ser respeitado e valorizado. A situação de marginalidade em que vivem reforça-se com os estereótipos e juízos de valor que o resto da população tem sobre cada um dos integrantes destes grupos e que contribui para reproduzir as actuais situações de pobreza e exclusão.

d) Discriminação cultural – Apoia-se em determinadas hierarquias e avaliações acerca da superioridade de determinadas culturas e línguas em relação a outras.

e) Discriminação económica – É uma das principais formas de discriminação e que incide directamente em todas as demais. Nas sociedades capitalistas, o ter menos possibilidade de obter dinheiro suficiente para viver com dignidade é algo que os imigrantes experimentam com demasiada frequência.

f) Discriminação religiosa – Manifesta-se mais acentuadamente naqueles países nos quais não existe uma clara independência entre os poderes públicos e as igrejas e religiões. Um estado confessional tem muito mais probabilidades que um laico de gerar discriminações sobre as pessoas ou colectivos sociais que não partilhem essa religião ou sejam ateus.

g) Discriminação psicológica – É a modalidade de exclusão que se produz quando as pessoas interiorizam um auto conceito negativo sobre si mesmas ou sobre algum outro colectivo social. Quando as pessoas interiorizam uma imagem negativa de si mesmas, através das suas interações com outras pessoas, limitam as suas expectativas pessoais porque se sentem sem direitos nem reconhecimento. (Santomé 2008: 37-39).

Este tipo de diferenciações nas modalidades de discriminação estão muito interrelacionadas e muito dificilmente se encontra um grupo humano ou pessoa discriminada como fruto de uma só destas modalidades. A distinção destas diferentes formas é útil, principalmente no momento em que se tenta resolvê-las e eliminá-las, pois indicam a necessidade de se tomar diversas medidas, como reformas legislativas, culturais e educativas, científicas, sociais, económicas e laborais; medidas que, por sua vez, exigem potenciar uma maior participação democrática da cidadania na gestão dos assuntos públicos.

Para os países de acolhimento, a principal dúvida consiste em saber se a imigração levará ao estabelecimento definitivo, à formação de comunidades étnicas e à emergência de novas formas de diversidade étnica e cultural. Esta questão é extremamente importante uma vez que, como refere Anthony Giddens: «As formas aceites de comportamento variam grandemente de cultura para cultura, contrastando frequentemente de um modo radical com o que as pessoas das sociedades ocidentais consideram “normal”. Por exemplo, no Ocidente moderno as crianças de doze ou treze anos são consideradas novas para casar. No entanto, em outras culturas são arranjados casamentos entre crianças dessas idades. No Ocidente, comemos ostras, mas não comemos gatinhos e cachorros, e tanto uns como os outros são considerados, em algumas partes do mundo, iguarias gastronómicas. Os Judeus não comem carne de porco, enquanto os Hindus, embora comam porco, evitam a carne de vaca. Os Ocidentais consideram o acto de beijar uma parte natural do comportamento sexual, mas em muitas outras culturas, esse acto ou é desconhecido ou considerado de mau-gosto. Todos estes diferentes tipos de comportamento são aspectos das grandes diferenças culturais que distinguem as sociedades umas das outras.» (Giddens 2010: 24).

Independentemente das políticas governamentais, as migrações podem provocar fortes reacções por parte das populações nativas, sobretudo se estiverem a ocorrer alterações a nível económico como aquelas que actualmente se verificam em virtude da globalização. São inúmeros os casos de choque entre a cultura do país de acolhimento e muitos dos seus imigrantes, uma vez que estes trazem consigo valores das suas culturas que divergem da cultura dominante. Para que o estabelecimento de comunidades étnicas ocorra de forma a causar o menor impacto possível na sociedade do país de acolhimento é importante que se verifique uma interacção entre ambas as partes envolvidas no processo, isto é, entre as várias instituições do país de acolhimento e as do país de origem.

O significado social da diversidade étnica depende em grande medida do significado que lhe é atribuído pelas populações e pelos países de acolhimento. Verifica-se que em muitos casos, a imigração vem contribuir para o aprofundamento de divisões étnicas ou raciais em sociedades onde já existem antigas minorias. Independentemente das medidas tomadas pelos governos, a imigração pode originar reações, nem sempre positivas, por parte de alguns segmentos da população. As migrações e as minorias são vistas como um perigo para os padrões de vida, para os estilos de vida e para a coesão social. Na Europa, a ascensão dos partidos de extrema-direita deveu-se muito à utilização de um discurso anti-imigração. É necessário que os agentes políticos preparem as populações para estes desenvolvimentos prevenindo o aparecimento de conflitos que podem levar anos a terminar.

Literatura de apoio:
Giddens, Anthony (2010): Sociologia. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian.
Santomé, Jurjo Torres (2008): Multiculturalismo Anti-Racista. Porto: Profedições.

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