RUTE SERRA |
Vermelha, de acesso árduo e beligerante. Como o planeta e o deus romano Marte. Assim é a Coreia do Norte. Formatados ao estilo de vida ocidental, de país desenvolvido, europeu, democrático, é impossível olhar para a Coreia do Norte, sem ficar com os olhos em bico. A peça teatral a que o país se submete, para a qual o Ocidente paga bilhete para assistir, de plateia, desenvolve-se num cenário de praça de armas, com figurantes absortos, e personagens principais abduzidas de um livro da Marvel.
O país sobrevive, envolto numa mentalidade oclusa, estigma dos sucessivos traumas causados pelos interesses geopolíticos e económicos, a que países como a Rússia, a China, o Japão e os Estados Unidos da América (EUA), a submeteram.
Com efeito, foi no colonialismo japonês que a Coreia “encontrou a sua cor”. Em plena Segunda Guerra Mundial, face ao ataque russo, perpetrado aos japoneses naquela região, entretanto derrotados pelos EUA, a Coreia foi dividida, tendo a linha divisória, ficado historicamente conhecida, como paralelo 38.
Os comités revolucionários, nascidos da guerrilha anti-japonesa, levaram à proclamação do Estado Comunista da República Democrática Popular da Coreia (Coreia do Norte), em 6 de setembro de 1945, liderada pelo jovem revolucionário Kim Il-Sung. Foi o início de uma sucessão dinástica de poder.
A ocupação do sul da Coreia pelos norte-americanos, deu origem ao extermínio massivo de cidades, infraestruturas e pessoas. Intoxicados em “napalm”, ameaçados por corredores radioativos de quilómetros, junto à fronteira com a China e coagidos com a presença de armamento atómico estacionado na Coreia do Sul, os coreanos sofrem de trauma de guerra. Foi este processo traumático, que provocou o emergir de uma liderança, fortemente marcada pelo culto de personalidade.
No rescaldo do conflito, encontramos uma Coreia do Norte apoiada pela China e pela Rússia, -por necessidade, mais do que por convicção - que afirma dois conceitos, um de natureza política, o outro militar, fundamentais para a definição daquela que é a sua matriz identitária mais genuína: o conceito ideológico de socialismo “juche”, idealizado pelo “Grande Líder” e “Presidente Eterno”, enfático dos valores da independência e da autoconfiança; e o conceito de s”ongun”, estandarte da prioridade militar como estratégia de sobrevivência.
Mas afinal a que Marcha Penosa, a plataforma dita civilizada, votou aquele Povo? Para além da física, a emocional é a mais impactante. Carecidos de noção sobre as reais ameaças, marcham por aquela Via Láctea, unidos - assim protegidos, com destino a um vácuo, onde, acreditam, encontrarão uma espécie de nirvana. Imbuídos da doutrina sobre estratégia política, de desenvolvimento de armas nucleares, conhecida como “linha byungjin”, anunciada pelo “Grande Sucessor” Kim Jong-Un, em 2012, creem de modo puro.
De facto, não assistimos, para além de condenações retóricas e sanções simbólicas, a ações substanciais que se demonstrem eficazes a findar a atitude propagandista de programas nucleares, alardeada pelo “Estado Pária” - como os EUA, à Coreia do Norte, preferem referir-se - ainda que com respeito pelos direitos humanos. Serão as ameaças norte-coreanas aptas a legitimar a presença dos EUA na região? Existirá uma verdadeira intenção, de estabelecer uma ativa agenda política?
Do congresso do Partido dos Trabalhadores, não se esperam laivos de discernimento do “Grande Sol do Século XXI”, mas tão-só uma festa de confirmação da sua coroação oficial. E a impossibilidade, enquanto aquele durar, de casar ou morrer.
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