Fase de qualificação: uma estreia entre muitos regressos
Foi de facto um elenco com muitas alterações relativamente à edição anterior, sendo que apenas a anfitriã RFA, Espanha e Dinamarca repetiram a presença comparativamente a 1984.
Os espanhóis acabaram por ter que agradecer à Áustria o facto de ter “roubado” um ponto à Roménia no derradeiro jogo do grupo, sendo que uma vitória colocava a Roménia na fase final. O jogo terminou com um nulo e a Espanha, que tinha ganho cinco jogos e perdido apenas um (precisamente contra os romenos) acabaria por amealhar mais um ponto do que os seus rivais directos na classificação, que tinham ganho 4 jogos e empatado na Áustria, o que era insuficiente para o apuramento. Estava-se numa altura em que o domínio interno do Real Madrid (em plena campanha do «penta», entre 1985 e 1990) se traduzia na importância dos seus jogadores na selecção, com destaque para homens como Chendo, Sanchís, Míchel ou Butragueño, sendo as excepções praticamente duas, Zubizarreta e Víctor Muñoz, ambos do Barcelona, estando o último dos dois já perto do final do seu percurso como internacional espanhol.
A Dinamarca acaba por vencer sem brilho o Grupo 6, já com Berggreen e Elkjaer-Larsen menos eficazes na frente, e até com Michael Laudrup algo apagado, apesar do enorme talento e capacidade criativa. O jovem jogador do Liverpool, Jan Molby, seria a figura mais em destaque, tendo marcado dois dos quatro (!) golos com que a Dinamarca assegurou o apuramento, deixando pelo caminho País de Gales, Finlândia e Checoslováquia.
No grupo de Portugal, o Grupo 2, quem se qualifica é a Itália, superiorizando-se tranquilamente a Suécia, Portugal e Suíça, com Malta fora das contas. Foram os dois últimos jogos dos italianos que ditaram o regresso transalpino a uma fase final – em Nápoles, Gianluca Vialli «bisa» na vitória sobre a Suécia (2-1), e diante de Portugal Vialli voltaria a fazer o gosto ao pé, juntamente com Giannini e Agostini, na vitória expressiva dos italianos (3-0) em Milão.
O Grupo 3 marca o regresso da URSS a uma fase final, numa selecção que faria a sua última aparição enquanto União Soviética num campeonato europeu. Evoluída técnica e tacticamente, a equipa soviética foi vencedora num grupo em que a RDA, segunda classificada, se tentou manter sempre por perto, sem no entanto pôr em causa a superioridade dos soviéticos. Desastrada foi a campanha dos franceses, que longe da magia mostrada quatro anos antes, e ainda contando com Platini, Tigana, Fernandez ou o guardião Bats, ganhou apenas um jogo em toda a fase de grupos.
No Grupo 4 aparece uma Inglaterra em grande nível, com Gary Lineker, Bryan Robson ou Glenn Hoddle a ser as grandes figuras de uma selecção que aniquilou a concorrência formada por Jugoslávia, Irlanda do Norte e Turquia e que terminou a fase de grupos com um fantástico «score» de 19 golos marcados e 1 sofrido.
Saudado regresso foi também o da Holanda, onde um conjunto de jovens jogadores augurava uma década de 90 bastante promissora para o futebol holandês. Numa campanha em que a turma “laranja” não deu hipóteses a Grécia, Hungria, Polónia e Chipre, Rinus Michels deve ter ficado igualmente agradado com as afirmações futebolísticas de jovens como Ronald Koeman, John Bosman, Ruud Gullit ou Marco van Basten.
Acabamos com o primeiro apuramento da República da Irlanda, que assim se estreava na fase final de um Europeu. O Grupo 7 revelou-se extremamente equilibrado, com as quatro primeiras classificadas separadas por apenas dois pontos. Acabariam por ser os dois últimos jogos da Bulgária a decidir o grupo – no seu penúltimo jogo sairia de Dublin com uma derrota por 2-0, num jogo que se tivessem ganho poderiam ter dado um passo decisivo no apuramento; ainda assim os búlgaros dependiam apenas de si próprios, e tinham a possibilidade de, ganhando em casa à Escócia, celebrar o apuramento, que no entanto não se veio a verificar por força de um golo escocês aos 86’ de Gary Mackay, que daria a vitória aos escoceses e o apuramento aos irlandeses. Para grandes nomes do futebol irlandês como Kevin Moran, Paul McGrath, Liam Brady, Tony Galvin ou Frank Stapleton seria o seu momento de consagração inicial. Para jovens como Ronnie Whelan, Ray Houghton seria uma óptima oportunidade para se projectarem a nível internacional.
Festa “laranja” na afirmação de van Basten
Foram oito as cidades que acolheram os jogos das oito selecções participantes, tendo-se a expectativa de, a avaliar pelos conjuntos presentes, se assistir a um grande evento. Seria em Munique, Frankfurt, Hamburgo, Estugarda, Hanover, Gelsenkirchen, Colónia e Dusseldorf que os «craques» presentes iriam entrar em acção entre os dias 10 e 25 de Junho.
O Grupo 1 abriu a 10 de Junho com a RFA a ser surpreendida em Dusseldorf por uma defensivamente competente Itália, em que o jovem avançado da Sampdoria Roberto Mancini chegaria a colocar Itália na frente do marcador (52’). No entanto, uma boa assistência de um tecnicamente talentoso Littbarski seria aproveitada por Andreas Brehme para fazer o golo do empate com que acabou a partida. No outro encontro, a Espanha cumpriu a tarefa de começar o Europeu da melhor maneira, com Míchel, Butragueño e Gordillo a facturarem os tentos com que se derrotou a Dinamarca (3-2), de nada valendo os golos de Laudrup e Povlsen aos nórdicos, que ainda viram o seu guardião Rasmussen a defender uma grande penalidade, falhada por Míchel.
Na segunda jornada os alemães acabariam praticamente de vez com as aspirações dinamarquesas às meias-finais, com o jovem Klinsmann e Olaf Thon a repartirem entre si a responsabilidade pelo afundamento da armada dinamarquesa. Em Frankfurt Vialli assegura a continuidade da Itália na luta pelo apuramento, marcando o único golo que deixou os nossos vizinhos geográficos em dificuldades.
Na última jornada duas vitórias por 2-0 fixam as passagens da anfitriã e da Itália. Perante 72.000 pessoas em Munique, o «bis» de Voller afasta a Espanha, e em Colónia Altobelli e Agostini aplicam a terceira derrota a uma selecção dinamarquesa pouco competitiva durante o certame, claramente a necessitar da afirmação de uma nova geração de bons jogadores. Com melhor «goal-average» a RFA passa o grupo em primeiro, e a Itália fica com a segunda posição.
No Grupo 2 a Inglaterra estreia-se em Estugarda com Glenn Hoddle no banco mas com Lineker e o capitão Bryan Robson preparados para um sempre interessante duelo britânico contra a estreante República da Irlanda, que era aliás orientada por um inglês de nome Jack Charlton, irmão do mais famoso Bobby Charlton, e que se tinha notabilizado como jogador no Leeds United, clube onde fez toda a sua carreira de futebolista. Este técnico inglês, que levaria a Irlanda aos Mundiais de 90 e 94, veria surgir no jogo o médio do Liverpool Ray Houghton que, com um golo madrugador, fixaria um resultado que uma pouco eficaz Inglaterra não conseguiria modificar, o que criou a primeira grande surpresa no grupo. Não deixou de surpreender a derrota da Holanda frente à URSS, com um golo da organizada equipa soviética apontado por Vasyl Rats a derrotar a mais empolgante equipa “laranja”. Marco van Basten, que viria a ter tanto destaque no torneio, ficou no banco e só entrou no decorrer da segunda parte.
No jogo da segunda jornada Inglaterra-Holanda, já Bobby Robson colocava na equipa titular o seu competente médio com vocação ofensiva Glenn Hoddle, de modo a colocar a melhor equipa possível para conseguir os dois importantes pontos em disputa. Só que do outro lado também Rinus Michels lançou a jogo van Basten, e o jovem jogador do AC Milan respondeu com um «hat-trick». O golo do capitão inglês Bryan Robson não evitou a eliminação de uma equipa que tão bem jogou na fase de qualificação, mas que se despedia de forma inglória da fase final. Na outra partida o empate a uma bola entre irlandeses e soviéticos garantia a ambas as selecções a possibilidade certa de qualificação para as meias-finais em caso de, pelo menos, o empate.
A URSS, mesmo perante uma Inglaterra na máxima força e a procurar sair condignamente do torneio, venceu categoricamente (3-1), com Aleinikov, Mykhaylychenko e Pasulko a carimbarem a passagem às semi-finais, e com a Inglaterra a regressar a casa humilhada pelo peso de contar por derrotas todos os jogos que realizou. No outro jogo, os irlandeses vislumbraram de forma bem nítida as meias-finais no seu ano de estreia, mas o sonho dos irlandeses esboroou-se quando Ronald Koeman assistiu para golo Wim Kieft, que aos 82’ garantia a passagem holandesa às «meias».
O primeiro jogo das meias-finais ocorreu em Hamburgo, num ambiente espectacular com mais de 60.000 espectadores a conferir uma enorme magia adicional ao evento. O primeiro golo surge apenas na segunda parte para a equipa da casa, na sequência de uma excelente jogada individual de Klinsmann, apenas travado em falta na grande-área. Hans van Breukelen ainda tocou no esférico após conversão de Matthaus, mas a acção foi insuficiente para travar o golo alemão. O golo do empate surgiu na sequência de uma outra grande penalidade, esta a castigar uma pretensa carga de Jurgen Kohler sobre Marco van Basten, numa decisão muito contestada pelos alemães. O certo é que Ronald Koeman não perdoou, tal como não perdoaria van Basten aos 88’, finalizando da melhor forma uma jogada de ataque da sua equipa, com uma RFA algo permissiva em termos defensivos.
Na outra meia-final, após um domínio italiano durante a primeira parte, na qual o guarda-redes Dasaev esteve em evidência, o segundo tempo ficou marcado pela superioridade técnica dos soviéticos na construção de jogadas de ataque nas quais, apesar do pouco espaço existente e da intensa pressão defensiva dos italianos, Lytovchenko e Protasov descobriram forma de alvejar com sucesso a baliza de Zenga, conduzindo novamente a URSS à final do Europeu.
Na grande final, momentos-chave do jogo como o cabeceamento certeiro de Gullit para inaugurar o marcador ou a defesa de uma grande penalidade por parte do guardião holandês van Breukelen foram determinantes na conquista do título de campeão europeu por parte da “Laranja Mecânica”. Mas o momento alto em Munique foi o grande golo de van Basten que, após um cruzamento aparentemente pouco tenso e desviado para a direita de Arnold Muhren, remata forte de pé direito sem deixar a bola chegar ao solo, numa excelente manifestação de qualidade técnica e potência de remate.
Um golo que ficará para sempre como um dos melhores momentos de sempre em finais de Europeus, na consagração dos novos campeões europeus.
A participação portuguesa no Euro’ 1988
O famoso e não muito bonito “caso Saltillo”, ainda bem presente à partida para uma nova fase de qualificação, transformaria bastante a composição da selecção nacional, destituída de alguns jogadores bastante interessantes da geração de 80, e em profundo processo de melhoria da organização estrutural, técnica e logística da FPF.
No meio deste ainda turbulento processo de transformação interna do funcionamento da estrutura directiva da
FPF, e tendo ainda em conta a presença de uma bastante mais competente Itália no grupo, Portugal ainda conseguiu o terceiro posto, embora completamente afastado de discussões pelo primeiro lugar. Aliás a primeira vitória apareceria apenas no quinto jogo, quando um golo de João Pinto surpreendeu a Suécia em Estocolmo. Antes disso Portugal já tinha empatado com a mesma Suécia em casa (1-1) e com Malta (2-2), além de ter “arrancado” novo empate fora de portas na Suíça a uma bola, que viria às Antas empatar a zero bolas.
A derrota em Itália por uns esclarecedores três golos sem resposta e a vitória diante de Malta na pequena ilha mediterrânica pela margem mínima marcaram o fim de uma campanha sem história onde Portugal, em função das possibilidades existentes, deu o melhor de si.
Nota: Este artigo foi realizado graças à informação facultada publicamente pela UEFA, no seu site oficial.
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