RAUL TOMÉ |
Quantos "eus" tenho em mim, não sei… nem sei se algum dia saberei. Sou demasiada gente conhecida, desconhecida, viva, morta, apaixonada, perdida.
Sou apenas pedaços, fragmentos de passados e de presentes sem futuro, porque a rasgados sonhos, já nem sequer me aventuro.
Sou um caleidoscópio de mágoas, de sorrisos, de paixões avassaladoras, de abandonos destruidores, de pessoas inspiradoras e, em cada dia, um pouco menos do que era e um pouco mais do que me semearam.
Nesta cada vez mais desfragmentada existência, vou-me desfazendo do que era e tapando as fendas com o que me dão. E esta peça tosca em que me transformei, simboliza aquilo que um dia fui, e hoje, nesta figura disforme, desconexa nos contornos e nas cores, pouco me resta para esculpir.
Pois que não sou, a dada altura, mais do que a lava que o vulcão expeliu das suas incandescentes vísceras, que se libertou e se transformou numa montanha disforme, fria e sombria. Sou a lava e sou o gelo numa só pessoa, que os outros, só dão por mim, quando o meu corpo queima e as peles alheias se contraem.
E há na agonia dilacerante um grito de dor, reclamando por mais uma peça que cai e que se perde, sempre que um sentimento se destrói.
Aguça-se o engenho e de martelo em punho há quem tente encaixar à força o que não me pertence e, de palavra em palavra, faz-se a injustiça e da revolta acende-se o dia em que a vítima vira ré.
Naquilo que sou, cada um de vós semeou a sua parte, mas quando chega o dia da colheita, divide-se por todos, que de amor sem mágoa só vivem os tolos.
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