sábado, 20 de janeiro de 2018

ETERNAS PERSEGUIÇÕES RELIGIOSAS?

JORGE NUNO
Todos nós, se aprofundarmos a essência de cada religião, verificamos que a maioria dos seus “fundamentos” podem ser aceites, pois falam em amor, humildade, fraternidade, tolerância, respeito, fé, humanidade… isso mesmo, dando pistas para que o homem se torne mais humano e, paradoxalmente, poder fazer a sua ascensão e aproximar-se da “divindade”! Mas não deixa de ser curioso: nas mais antigas religiões conhecidas, já se ouvia falar em deuses mitológicos que perseguiam outros deuses; os relatos veem-nos da antiga Grécia, Egipto e também da Babilónia. E o que espanta é como religiões de amor acabam em expressões de ódio, que fomentam e levam à prática autênticos genocídios; foi verdade antes do surgimento do cristianismo, manteve-se ao longo de séculos, sendo ainda mais evidente nos dias de hoje, com todo o mediatismo dos meios de comunicação e passagem de informação em tempo real.

Já em meados do séc. XVII, Blaise Pascal terá dito: “Os homens nunca praticam o mal de modo tão completo e animado como quando o fazem a partir da convicção religiosa”.

Não deixa de ser estranho que a fé – que era suposto unir –, mantenha numerosos grupos separados, muitas vezes alienados e dispostos a manter vivo o seu fundamentalismo, capaz de aniquilar os que não têm a mesma visão ideológica ou professam uma “fé” que não a sua. A disputa pelo poder e controlo de supostas religiões, conduz ao controlo de vastas regiões e de outros interesses, como se se tratasse de jogos geopolíticos estratégicos. No maior fanatismo, há sempre quem se sinta honrado em morrer como mártir, e pior é quando se pretender arrastar consigo o maior número de “infiéis”.

À sua maneira, cada confissão religiosa pretende enaltecer os seus mártires, mesmo que à distância de mais de dois milhares de anos muitos dos relatos possam ter sido adulterados, pela passagem de boca em boca, e transformados em convenientes mitos. No entanto, em muitas dessas estórias, parece haver alguma consistência na forma ou processos correntes de execução, à época, dos “traidores” ou inimigos a abater.

Dentro do cristianismo, em cada dia 20 de janeiro comemora-se o dia de São Fabiano e de São Sebastião. O primeiro é mais desconhecido; o segundo é uma figura mais popular, reconhecida como mártir, sendo mostrada a imagem de um jovem, seminu, amarrado a um tronco de árvore e com flechas a trespassá-lo. Tratava-se de um soldado romano, que chegou a integrar a guarda pretoriana, a qual protegia o próprio imperador Diocleciano. Consta que esse imperador fez-lhe um julgamento sumário, considerando Sebastião um traidor, por ajudar cristãos, condenou-o à morte, com flechas, e depois atirado ao rio. Sebastião terá sido encontrado por Irene (mais tarde considerada Santa Irene), mas como não estaria morto, esta cuidou dele até Sebastião ousar apresentar-se novamente perante o imperador. Com nova ordem de Diocleciano, foi espancado até à morte e o seu corpo atirado para um esgoto, em Roma. Luciana (mais tarde considerada Santa Luciana), recolheu e limpou o corpo, fazendo com que fosse sepultado nas catacumbas, em Roma. Há dúvidas quanto ao ano da sua morte, mas aponta-se a data de 286 d. C.

Recuando ao ano de 250 d. C., terá sido num dia 20 de janeiro que o imperador Décio iniciou uma perseguição generalizada aos cristãos, a começar em Roma pela aniquilação do papa Fabiano. Sobre este, consta que não pertencendo ao clero e numa altura em que se procurava ultrapassar o impasse na escolha de um novo papa, surgiu uma pomba branca sobre a cabeça de Fabiano, o que levou à unanimidade na sua escolha para suceder ao papa Antero, um sinal entendido como se se tratasse de “ordem sagrada”. Pela sua morte violenta, também foi considerado mártir e levado para as catacumbas de São Calisto, em Roma.

Cerca de 90 anos após a morte de São Sebastião, foi a vez dos cristãos passarem de perseguidos a perseguidores. Estava-se no tempo do imperador Teodósio I[1], em que este, um ano após o exercício do cargo, instituiu o “credo niceno”, através do Édito de Tessalónica. O cristianismo teria a exclusividade em todo o império – como religião de estado –, passando a haver tolerância “zero” a quem não fosse cristão. Deste modo, à força, foram abolidas práticas politeístas e fechados templos pagãos, comuns em várias partes do vasto território. Esse Édito dizia: “Queremos que todos os povos governados pela administração da nossa clemência professem a religião que o divino apóstolo Pedro deu aos romanos, que até hoje foi pregada como a pregou ele próprio (…). Isto é, segundo a doutrina católica e a doutrina evangélica cremos na divindade única do Pai, do Filho e do Espírito Santo sob o conceito de igual majestade e da piedosa Trindade. Ordenamos que tenham o nome de cristãos católicos que sigam esta norma, enquanto os demais os julgamos dementes e loucos sobre os quais pesará a infâmia da heresia. Os seus locais de reunião não receberão o nome de igrejas e serão objeto, primeiro da vingança divina, e depois serão castigados pela nossa própria iniciativa que adoptaremos segundo a vontade celestial”. Só em Tessalónica terão morrido mais de 6000 pessoas, por via do referido Édito. 

Serão eternas as perseguições religiosas? Segundo a perspetiva de Diana Cooper[2], “Os computadores vão usar frequências mais rápidas e levar informação de luz, possibilitando uma comunicação global instantânea e facilitando a compreensão entre culturas e os países. A tecnologia será contrabalançada pela ligação próxima com a natureza. (…) Por toda a parte, as mulheres estão a começar a assumir o seu poder. Elas estão a reconhecer a sua própria luz. Ao mesmo tempo, algumas religiões vão abrir-se para a espiritualidade, o que vai suavizar o dogma. Isto permitirá às pessoas que se unam, que se enalteçam e que respeitem as culturas umas das outras”.

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[1] Exerceu de 379 a 395 d. C., sendo o último imperador a governar todo o espaço do império romano, tanto a Oriente como a Ocidente.

[2] In “2032 - A Nova idade de Ouro, sendo autora de 20 livros na área da espiritualidade, traduzidos em mais de 30 línguas.

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