terça-feira, 9 de janeiro de 2018

ALVURAS DA ALMA


Branco.
Gélido.
Pela luz do dia,
não te vejo.
O que piso não é o que desejo.
O que voa não é o que conheço.
Será que,
perto de estar longe,
olhamos o mesmo céu?
O meu espírito não sente
o calor da saudade.
Sinto apenas nada
do que mais me faz sentir.
Será que também sentes?
O vazio dos dias brancos...

INÊS LOPES
Olho o céu sozinho no mundo. Vazio de qualquer forma, assenta branco nas névoas que me trespassam. Hoje vejo o mundo pelos meus olhos e sinto-me feliz.

Sou a eterna companhia da minha solidão. Só assim me sei compreender. Abraço o mundo em solitude e sei exatamente para onde devo ir. Mas se devo, não vou, pois conheço a preocupação constante de quem vive atrás do real, de quem segue os caminhos mais definidos. Quem sonha com pessoas que estão presas na memória, fabricadas pela nostalgia e romantizadas por um coração desfeito. Preocupação traz duplo sofrimento, e tenho pena de quem é tão cheio de ser vazio, tal como este céu que observo, preenchido até ao último canto de um branco, ora brilhante, ora opaco. Não o sinto bonito. O conceito de beleza é manufacturado, o céu não é. Tal como nós não somos. O desaparecimento de um branco que torna os dias reconfortantes, é o desaparecimento do branco que preenche a minha alma, e que outrora me reconfortou. Mas já não reconforta. E logo vem o escuro... E depressa, ou devagar, ressurge um branco ainda mais límpido, de uma forma que ainda não se sobrepôs àquilo de que sou feita, mas que, no final de um dia vazio, me reconforta.

Os pássaros dão movimento a esta branquidão que me consome, voando no céu que acabou de se formar, tentando dizer-me ao ouvido o que é feito do branco que restou. Digo-lhes que não quero saber, enquanto presto atenção a cada pormenor que me contam. Estranhamente ou não, será para sempre esta a minha realidade. Serei para sempre esta sobreposição de telas brancas, umas mais riscadas do que outras, mas todas intactas até ao meu último dia.

Esta sou eu. A minha alma tem a cor mais pura, embora nem sempre o seja, mas é feita dos mais puros momentos.

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