ELISABETE SALRETA |
Pela ponta do pé sentia a vibração das cordas retesadas até à exaustão.
Com os olhos fechados, cega para o mundo, tentava que o bater do seu coração seguisse o compasso da música.
Só então soltava-se e deixava o seu corpo voar pela sala, naqueles braços que a seguravam e nem a pareciam tocar.
Aquele tempo tinha a duração de um compasso, e era nesse tempo que a história tinha lugar.
Esticava os dedos do pé a sentir o chão e a deixar que a vibração subisse pela sua perna, devorasse o seu corpo milímetro a milímetro, numa obsessão escrava.
Sim, era escrava daquele ritmo. Era a sua fome, a sua cede e transformava-se no ar que necessitava de respirar.
E o ritmo continuava tomando conta de tudo, transformando o tempo na sucessão de notas que perfazem a música.
Deitava a cabeça para trás e sentia o vento que lhe levantava os cabelos, misturando o seu perfume com o ar.
Já não se agarrava, pois confiava cegamente no seu par. Tinha as pernas presas como se fosse um abraço. Chegava para se sentir segura.
Quando já estava tonta de tanto rodopio, manifestava a sua vontade de sair da pista. Mas a música voltava e a dança continuava.
Depois fugia, cambaleando, desnorteada com o volteio. Descansava, alisava o vestido, e voltava o olhar vazio no sentido da música. Pensava voltar, mas sem forças, dava apenas um passo, sem que o par notasse e a voltasse a levar aos céus, ao som daquela música e a voltar a voar.
Mia dança ao colo da sua amiga, seguindo a música apoiada nos seus braços.
Outras vezes, sozinha, deambula pela casa sem ter destino, acompanhando a música que se espalha. Percebe-se o ritmo de que gosta mais. Cada um dos meninos gosta de um ritmo diferente e demonstram prazer ao escuta-los. São todos diferentes, mas nenhum é indiferente ao ritmo, à vibração a que chamamos música.
Sem comentários:
Enviar um comentário