MOREIRA DA SILVA |
Na língua portuguesa, como língua viva que é, aparecem de vez em quando algumas inovações linguísticas, como as palavras que surgiram, com a democratização das novas tecnologias, mas também com a dinâmica da política que originou a necessidade de uma nova palavra, para suavizar um conceito já existente (mentira). Foi assim que surgiu uma nova palavra (inverdade).
Os termos mentira e inverdade são sinónimos e fazem parte integrante dos dicionários da língua portuguesa. Enquanto a mentira significa o ato de mentir (um engano propositado), já a inverdade é uma característica do que não é verdade. Vem isto a propósito da mentira ou mentirinha, aliás da inverdade, que o primeiro-ministro utilizou para defender o «seu» ministro das finanças, Mário Centeno, no acordo que fizeram com António Domingues, para aceitar a nomeação como presidente da administração da Caixa Geral de Depósitos (CGD), que ficaria isento de apresentar a declaração de rendimentos ao Tribunal Constitucional, assim como todos os membros nomeados para a administração do referido banco público.
Foi numa enorme trapalhada que os referidos políticos, primeiro-ministro e ministro das finanças, com um enorme défice de humildade, não assumiram e por isso recorreram à inverdade, quando foram convidados, na assembleia da república, a contarem a verdade do que se passou. A confirmar este imbróglio está uma carta, que o banqueiro António Domingues enviou ao ministro das finanças, Mário Centeno, a lembrar as condições negociadas para aceitar o lugar na CGD, que incluíam a desobrigação de entrega das declarações de rendimentos.
A não existência de um acordo, pelo menos nada se sabe sobre ele, fez com que se utilizasse a inverdade, para dizer que não era uma mentira, as afirmações que o ministro das finanças proferiu na comissão parlamentar de inquérito ao banco público. O que veio a público foi a referida carta e não o acordo e, por isso, o primeiro-ministro afirmou que o ministro das finanças não mentiu, porque não fez qualquer acordo. Esse é desconhecido. O ministro Mário Centeno afirmou que houve, por parte do banqueiro, “erros de perceção”, É obvio que o ministro mentiu ou utilizou a inverdade!
Atente-se também a esta afirmação do primeiro-ministro, quando saiu a terreiro a defender o «seu» ministro das finanças: “Eu não tiro conclusões sobre a posição do ministro com base em compromissos que terceiros alegam que ele tem”. Mas o secretário de estado adjunto e do Tesouro, Mourinho Félix, foi mais longe, quando declarou: “As afirmações sobre a existência de um acordo são falsas, não têm nenhum fundamento, não existe nenhum acordo, esse acordo não existe”. Estas inverdades, este jogo de cintura, este habilidoso jogo de palavras é uma característica dos políticos.
Depois desta trapalhada era mais que óbvio o pedido de demissão apresentado pelo banqueiro, que garantiu haver um acordo explícito, um acordo com o governo, que foi quebrado pela força do Parlamento. Para a governação, como não houve qualquer resposta aos emails enviados por António Domingues, não houve qualquer acordo. É o argumento da omissão que os responsáveis políticos utilizaram para dizer que o ministro das finanças não mentiu. É o «assobiar para o lado», quando faltou a humildade para assumirem um erro mais que evidente.
A descredibilização dos políticos é uma realidade, mas a culpa só tem um destinatário: a classe política. Infelizmente!
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