GABRIEL VILAS BOAS |
Um jornal titulava «Já é nosso», outro agradecia com um sentido «Obrigado» - no mundo da cultura portuguesa vai uma alegria pueril e incontida pelo sucesso do peditório nacional para a compra, por parte do Museu Nacional de Arte Antiga, do quadro de Domingos Sequeira “A Adoração dos Magos”.
É, de facto, uma boa notícia, mas a satisfação generalizada que perpassa nos jornais e nas redes sociais é cruelmente esclarecedora quanto à realidade da cultura portuguesa.
O sucesso desta operação pública desta de mecenato popular mostra que a sensibilidade artística dos portugueses tem uma base social mais alargada, que a sociedade se consegue mobilizar economicamente para aquisição de uma obra de arte de autor português. E não há nada de melhor quando o público “constrói” o espólio dos seus museus porque isso revela interesse, amor à arte, capacidade de decisão quanto aquilo que é importante para o bem comum.
No entanto, a “salvação” do quadro de Domingos Sequeira expõe também toda a fragilidade económica do mais importante museu português assim como a inexistência de uma política cultural, por parte do governo, que evitasse este espetáculo deprimente de um peditório nacional para comprar um quadro de pouco mais de meio milhão de euros. Pode até ser enternecedor, mas certamente também é caricato e humilhante.
Estamos a falar de 600 mil euros! Como é possível um ministério da cultura não ter um plano de investimentos que permita aos museus nacionais adquirir obras de arte com algum valor de mercado, de molde a enriquecer o seu acervo e assim atrair mais visitantes? O valor em causa era tão baixo que que o MNAA nem deveria precisar de qualquer ajuda estatal ou privada para fazer esta aquisição, mas a nossa realidade económica, quando falamos de cultura, é esta.
Quando comparo este heroísmo popular na aquisição da tela de Domingos Sequeira com os “azares” dos nossos bancos privados (que fomos obrigados a resgatar), não deixo de sentir uma enorme revolta, porque Portugal só não tem dinheiro para investimentos necessários e úteis, já que para acorrer a trafulhices que correram mal há sempre verba.
Hoje passam 151 anos que nasceu o grande pintor naturalista José Malhoa. A sua obra-prima, Fado, datada de 1910 ilustra bem o seu génio e essa mentalidade pequenina e submissa dos portugueses, que os impede de avançar.
Mantemos aquele fatalismo e saudade que Malhoa pintou há cem anos e por muito cosmopolitas que sejam os nossos banqueiros não deixamos de ser uns pobres magos enganados que continuam a adorar o menino errado.
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