JOANA BENZINHO |
As mascaras, a estatuária e alguns instrumentos musicais são na Guiné Bissau uma parte importante da cultura, da vida social e religiosa de certas etnias e, essencialmente, de certas crenças animistas.
Para o animismo, religião maioritária entre os guineenses, mesmo se por vezes professem outros credos, os espíritos encarnam na natureza, nas árvores, em objectos de madeira que são esculpidos depois de uma autorização divina e só por algumas mãos especialmente dotadas para o efeito.
É igualmente comum encontrar animais esculpidos em madeira, sobretudo na arte Bijagó, como cabeças de vaca ou tubarão e que são usados em cerimoniais muito específicos, sendo um espectáculo digno de registo ver os homens a dançar ao som dos batuques mascarados com estas cabeças de animais.
A arte Bijagó é uma das mais procuradas pelos colecionadores de arte africana e uma das mais raras de encontrar. Como poucos estão predestinados esculpi-la, não abundam os exemplares.
Também os instrumentos musicais como o bombolom, a Kora e o balafon são esculpidos em madeira e entram em diversas cerimónias do quotidiano guineense. O bombolom foi, desde sempre, o meio de transmitir informações para aldeias distantes através de uma espécie de código morse entendido e praticado pela população em geral. Quando morria ou nascia alguém o bombolom era tocado e lá longe a noticia era recebida de imediato. Diz-se até que no tempo da guerra colonial os portugueses foram vitimas de algumas emboscadas por desconhecerem a utilidade do bombolom que ressoava quando eram avistados. Julgavam tratar-se de boas vindas quando na realidade metia em guarda a população vizinha alertando-os da presença dos militares. Hoje em dia tem um papel muito importante nos funerais e no "toca choro", cerimónia de evocação do morto e que se traduz numa festa que dura vários dias e se oferecem animais para serem sacrificados. Deixou no entanto de ser um veículo de transmissão de informação, substituído pelo poder das rádios comunitárias existentes um pouco por todo o país. Já o balafon ( espécie de xilofone) e a Kora permitem aos griots (uma espécie de jograis) habitantes da aldeia de Tabatô, manter a tradição ao transmitirem a sua história, desde os seus ancestrais no Mali que viajaram para a Guiné até aos dias de hoje, através de vários actos musicados e sempre sob o ouvido atento de quem chama a atenção ao narrador, caso este se afaste da verdade.
Por todo o país ou na cidade de Bissau é ainda possível encontrar alguns homens que diariamente domam a madeira, com artefactos bem rudimentares e seguindo à risca as tradições, como é o caso de pedir autorização aos espíritos para fazer uma determinada estátua. Eles estão no mercado artesanal dos Coqueiros, onde também encontramos joalheiros a trabalhar a prata de uma forma arcaica mas impressionante, e ainda no Centro Artesanal Juvenil que agrega artesãos de vários pontos do país e de distintas etnias.
Este artesanato guineense é detentor de uma pesada carga simbólica e histórica pelo que deve ser preservado de massificações que ambicionam dar resposta à procura por parte de colecionadores e turistas. Já merecia um museu nacional. Quem sabe um dia.
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