sábado, 10 de junho de 2017

VENI. VIDI. VICI.

HELENA COUTINHO
Dizem que o mundo é dos que mandam mas teimo em questionar. É certo que quem manda tem poder e tem, principalmente, o poder de decidir tudo o que lhe interessar, mas ninguém me "desconvence" de que se soubéssemos dar uso aos nossos poderes seriamos, também, capazes de tornar a vida mais exigente para os que se julgam infinitamente poderosos. O mundo é dos que sabem respeitar e valorizar, a si e aos outros, e isso, desenganemo-nos, é um poder que se conquista. O mundo pertence aos que não permanecem acorrentados ao poder dos outros e que, acima de tudo, sabem que para conquistar a sabedoria da vida é preciso partir, para depois chegar, ver e vencer.

Às vezes, o pensamento adormece derrotado, amarrotado, e depois, quase que por magia, acorda despido de ideias e de ideais. E eu gosto, porque é nesses dias que a vida parece recomeçar, lentamente, como recomeça a vida das sementes que aguardam o subtil sinal da Primavera, para abandonar o refúgio de Inverno, no momento certo. Ao acordar, o pensamento espreguiça a poeira do passado, respira a luz do presente, e escolhe novos rumos para vestir. Frequentemente obrigam-nos a repensar o pensamento, e o corpo que o reveste sorri e agradece. Porque a vida é parente do céu e do mar. É cheia de ventos e de marés, cheia de tudo e de nada. Ironicamente, hoje, como nunca, a forma como nutrimos e vestimos o pensamento depende mais dos outros do que de nós. A sociedade parece vergar-se, cada vez mais, sobre si mesma, em vez de florir e de se expandir, à boleia do conhecimento. E, nos jardins do tempo, podam-se as vontades, as crenças e os sonhos, para que cresçamos na mesma direcção, no mesmo compasso e até à medida considerada certa. Incessantemente aparam-se as pontas soltas, corta-se pela raiz o que interfere na harmonia da normalidade, e adubam-se as maiorias e grilhões inquestionáveis. Afinal, no século XXI, sobrevive-se a uma liberdade tirana.

Num desses dias apadrinhados pela luz da mudança, aconteceu-me uma epifania em forma de poema inacabado. Poucos minutos passavam das sete da manhã, quando os meus olhos tentaram ler os versos sussurrados pelas entrelinhas dos teus cabelos. O preto, outrora nutrido pela juventude, despediu-se do futuro, dia após dia, até dar lugar ao branco amarelado original. Entrançados por aventuras, desventuras e lembranças, os teus longos cabelos teceram e rimaram certezas e dúvidas que tocaram os meus olhos e o meu coração, como se fossem notas musicais a tentar penetrar a minha alma. Naqueles instantes, feitos de eternidade, percebi a beleza e a crueldade da fragilidade humana. Resumiste a história da vida, em poucos segundos, mas foi o suficiente para sentir que ainda querias prolongar a tua viagem. Inspiraste profundamente todas as vitórias e tudo o que te fazia feliz, na tentativa de encontrar forças para parir novos minutos. Não desististe, como sempre, mas não conseguiste aguentar as dores desse último parto. E eu fiquei ali, a segurar as tuas mãos, como se segurasse as mãos da vida, prestes a cair num abismo, até seres tu a deixar de ter força para agarrar as minhas. Perdi-te! Perdemo-nos... Mas jamais largarei a tua mensagem.

1 comentário:

  1. És como um analgésico para mim, as tuas palavras são sempre cheias de emoção profunda, sentidas, mas acima de tudo reconfortantes, chegam sempre no momento certo na minha vida, gosto tanto amiga, continua a escrever, eu sou fã da pessoa que és e das tuas profundas e sábias palavras :)

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