ARMANDO FERREIRA DE SOUSA |
A figura do velho do restelo, introduzida por Luís de Camões no Canto IV da obra “Os Lusíadas”, resultou certamente de uma acertada leitura da idiossincrasia Portuguesa, evidente à data, mas que ainda hoje perdura.
Luís de Camões logrou personificar nessa personagem o pessimismo, a crítica, a inveja e a acomodação que certamente encontrou pelo menos numa franja da população Portuguesa daquela data, a qual, escudada numa aparência de moralidade, se manifestava contra a empresa que o nosso pequeno país levava a cabo, os descobrimentos.
Acontece contudo, que passados tantos séculos, continuamos a ser um país assolado por velhos do restelo, alguns deles tão jovens…
E se o velho do restelo acusava os seus corajosos compatriotas de vaidade e cobiça, os velhos do restelo de hoje em dia não se inibem também de acusar os seus pares de pecados sociais como falta de solidariedade e falta de sensibilidade social.
E podemos facilmente encontrar finos exemplos do que se vem explanando em dois assuntos tão díspares como a crise dos refugiados ou o atual jogo “Pokemon Go”.
Ora, se na sequência da crise dos refugiados, logo apareceu uma horda de gente caridosa a afirmar que antes de atender aos refugiados deveríamos ajudar os nossos sem-abrigo, no que toca ao jogo “Pokemon Go”, outra horda de velhos do restelo apareceu, reclamando que antes de ir procurar animais virtuais, deveríamos olhar pelos animais abandonados.
Pensei logo que, perante tanta crítica e vontade de ajuda deixássemos logo de ter pessoas sem-abrigo ou animais em situação de abandono. Mas afinal isso não aconteceu, isto porque aqueles velhos do restelo na verdade não pensam nem nunca pensaram na situação do sem-abrigo, ou do animal abandonado, mas tão só os usam como reforço da sua pretensa moralidade e como arma de arremesso para criticar algo que simplesmente lhes apetece criticar.
E é este conjunto de velhos do restelo que nos vai corroendo o espírito, que vai ridicularizando e menorizando mentes empreendedoras que devem ser valorizadas e acarinhadas.
Entretanto a empresa proprietária do jogo “Pokemon Go” vai faturando milhões com um produto de distribuição gratuita…
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— "Ó glória de mandar! Ó vã cobiça
Desta vaidade, a quem chamamos Fama!
Ó fraudulento gosto, que se atiça
C'uma aura popular, que honra se chama!
Que castigo tamanho e que justiça
Fazes no peito vão que muito te ama!
Que mortes, que perigos, que tormentas,
Que crueldades neles experimentas!
(Luis Vaz de Camões “Os Lúsiadas”)
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