RUI SANTOS |
Os direitos humanos são os direitos mais importantes que existem. Permitem-nos fazer as nossas próprias escolhas sem interferência governamental, protegem a nossa dignidade, garantem que somos tratados como iguais, assim como permitem o bom funcionamento da democracia e do Estado de Direito. Ao mesmo tempo, os direitos humanos não podem ser garantidos de forma absoluta. Em sociedades abertas e democracias modernas, não podemos evitar algumas limitações a esses direitos.
Em democracia, a liberdade de se poder demonstrar publicamente as nossas opiniões é, obviamente, muito importante. Contudo, é igualmente importante que as forças de autoridade devam ser autorizadas a agir quando uma manifestação se transforma num motim violento. Utilizando o mesmo tipo de raciocínio, podemos afirmar que as escolhas pessoais devem ser respeitadas tanto quanto possível. Mas quando tais escolhas resultam em danos para os outros, podem ser alvo de restrição. Por exemplo, as crianças devem ser protegidas contra o abuso físico por parte dos seus pais mesmo que estes estejam convencidos que são livres para criar os seus filhos da maneira que bem entendam. Assim, podemos aceitar que os direitos humanos são realmente importantes, mas também que algumas limitações são inevitáveis e ou mesmo necessárias.
É claro que isso levanta duas questões: quem deve ser responsável pela proteção dos direitos humanos, e quem os pode restringir. Esta responsabilidade é geralmente dada aos estados. Os órgãos estatais estabelecem regras e decisões e afectam o modo como nos comportamos. Afinal, é o Estado que pode decidir processar um jornalista por causa de um determinado artigo que ele publicou, ou ordenar a busca numa casa. Mas é igualmente claro que o Estado pode fazer tudo isso para proteger os direitos dos outros ou para proteger o interesse geral. Assim, a acusação do jornalista pode ser necessária porque incitou ao ódio racial. E realizar uma busca numa casa pode ser necessário para combater o crime e proteger os direitos das vítimas. Assim, em relação aos direitos humanos, o Estado tem duas faces. Por um lado, é uma ameaça aos direitos humanos, e os direitos mais preciosos têm de ser protegidos contra o Estado. Por outro lado, e ao mesmo tempo, a acção do Estado pode ser crucial para proteger o exercício livre e efectivo de tais direitos.
A História mostrou que pode não ser uma boa ideia deixar totalmente a proteção, e a limitação, de direitos ao estado. É nesse contexto que a Convenção Europeia dos Direitos Humanos desempenha um importante papel. Esta convenção, e o sistema de monitoramento que lhe está subjacente, são destinados a verificar o comportamento dos estados. Quando alguém sente que os seus direitos foram indevidamente restringidos pelo Estado, pode recorrer ao Tribunal Europeu dos Direitos Humanos.
Há três princípios fundamentais para a compreensão da actividade do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos. Estes três princípios são: a eficácia e a proteção dos direitos humanos; o princípio da proteção primária dos direitos humanos pelos Estados; o princípio da subsidiariedade e da supervisão pelo Tribunal Europeu dos Direitos Humanos.
O primeiro princípio, diz respeito ao facto da importância dos direitos humanos, não dever ser apenas no campo das intenções passadas a escrito. As pessoas devem realmente poder desfrutar da proteção dos seus direitos na prática. Devem ser tão livres quanto possível para fazerem as suas próprias escolhas, e sua dignidade e igualdade devem ser devidamente protegidas.
Em segundo lugar, o Tribunal considera que é da responsabilidade primária do Estado essa proteção efectiva. É o chamado princípio de primordialidade. Significa que as autoridades nacionais devem respeitar e proteger os direitos humanos da forma mais eficaz possível. Significa também que a reparação das violações dos direitos humanos deve, em princípio, ser concedida a nível nacional.
Em terceiro lugar, só quando se revela impossível obter uma reparação a nível nacional é que passa a ser possível recorrer ao Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, isto é, o Tribunal tem um papel subsidiário. A tarefa do Tribunal não é prever a regulamentação nem a proteção directa dos direitos humanos mas sim supervisionar os estados para ver se eles cumpriram as suas obrigações em termos de direitos humanos. Assim, não intervirá quando constatar que o Estado fez uma escolha razoável entre interesses em conflito.
A fim de proteger os direitos humanos, existe uma distribuição de responsabilidades entre os Estados e o sistema de convenções europeias. A principal responsabilidade dos Estados é proteger e regular o exercício dos direitos humanos. A supervisão subsidiária desta proteção e regulamentação é exercida pelo Tribunal Europeu dos Direitos Humanos.
Juntos, Estados e o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, garantem a proteção efectiva dos direitos humanos, na Europa. Que este exemplo europeu se estenda a outras regiões do globo terrestre.
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