“
(…) Corri os riscos de haver sido professor durante quase meio século. Se pudesse
recomeçar a minha vida, professor me queria, nessa aventura, entre afetiva e
criativa que é aprender ensinando.” (Ilídio Sardoeira)
TEÓFILO BRAGA |
Em texto anterior, publicado no passado
dia 4 de abril, dei a conhecer um pouco da vida e da obra do Dr. Ilídio
Sardinheira, distinto professor da hoje denominada Escola Secundária Antero de
Quental.
No mencionado texto, inseri o depoimento
de dois dos seus alunos, o Doutor José Medeiros Ferreira e o Doutor João
Vasconcelos Costa, que a ele se referiram em termos elogiosos. Hoje, antes de
escrever um pouco sobre o seu pensamento enquanto professor, divulgo o
depoimento do escritor picopedrense Cristóvão de Aguiar que no seu livro
“Relação de Bordo, escreveu: “Ilídio Sardoeira era poeta e um grande “devoto”
de Teixeira de Pascoais, que nos deu a conhecer no quinto ano do Liceu,
levando-nos poemas do Poeta de Marânus, nas aulas de Ciências Naturais…Que belo
que isto é! E que ventura é ter bons mestres na quadra genuína da vida…”
Depois de escrever que o Dr. Ilídio
Sardoeira era “professor de Ciências Naturais e de sonho e de poesia, ou de
tudo junto”, Cristóvão de Aguiar dá a conhecer o que pensava o mestre sobre o
ofício de ensinar: “Um professor é um semeador. Não sabe quais as sementes que
realmente ficam, mas não ignora que ele mesmo é uma parte da semente. É
semeador e semente”.
De acordo com João Manuel Ribeiro, autor
do livro “Ilídio Sardinheira: o caçador de madrugadas”, publicado em 2016, o
Dr. Ilídio Sardinheira teve uma vida dedicada ao ensino, tendo lecionado
“primeiro no Colégio de S. Gonçalo de Amarante durante quatro anos; depois, no
Liceu Normal de Pedro Nunes, em Lisboa, onde fez o seu estágio de habilitação
para a docência; finalmente, em muitos lugares do país: Évora, Figueira da Foz,
Braga, Porto (Liceu D. Manuel II), Ponta Delgada (Liceu Antero de Quental),
Viseu e Vila Nova de Gaia.”.
Como tive a oportunidade de conhecer
através dos depoimentos dos seus alunos, o Dr. Ilídio Sardoeira estava longe de
ser um professor tradicional, agarrado aos manuais, seguidor do conhecimento
espartilhado pelas áreas de ciências e de letras e preso no interior das quatro
paredes de uma sala de aula.
Sobre o ensino confinado à sala de aula,
João Manuel Ribeiro, no livro citado, escreve que Ilídio Sardoeira “não queria
que a escola fosse uma prisão para crianças onde se aprende amarrado às
carteiras, ou um canteiro de plantas floridas cercado de arame farpado!”
Para se conhecer o pensamento do Dr.
Ilídio Sardoeira sobre o ensino é importante a leitura do seu discurso
proferido na Assembleia Constituinte, publicado no Diário da Assembleia Constituinte nº 118 de 12/03/1976. Dada a extensão
do mesmo, apenas referirei algumas ideias chave, as quais ainda hoje não
perderam atualidade.
Ao contrário
do que pensam alguns, os problemas do ensino e os da sociedade não se resolvem
na escola. Ilídio Sardoeira corrobora esta afirmação quando afirmou no discurso
mencionado que: “os problemas centrais da degradação do
ensino permanecem. São problemas, em grande medida, de raiz socioeconómica. Ao
cabo e ao resto problemas que têm de encontrar primeiro as soluções políticas
adequadas ao mundo dos adultos”.
Sobre a Escola, Ilídio Sardoeira,
acrescentou que era “o espelho da sociedade; esta não transforma aquela,
reprodu-la” e acrescentou: “Somos nós, os adultos, os responsáveis pelos
fracassos escolares porque não temos a coragem de modificar radicalmente as
condições, as contradições da sociedade portuguesa porque nos empenhamos em
manter uma sociedade estratificada, caduca, per omnia secula seculorum, não é
assim? E queremos depois que a escola resolva problemas que não tivemos a
coragem de resolver nas ruas.”
Teófilo Braga
(Correio dos Açores, 31209, 19 de abril de 2017, p. 17)
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