JORGE NUNO |
Há dias assim! Quantas vezes já acordámos a trautear uma canção e já depois de almoço a canção ainda teima em persistir na cabeça, os lábios a mexer e uns sons a sair, mesmo que em tímida surdina? Mas não, desta vez eu acordei com algo estranho: “Teorema do Soutien”. Como não me tem saído da cabeça e como não tenho por hábito rejeitar ideias que surgem do “nada”, mesmo que à partida pareçam estúpidas, achei por bem fazer com que desse título a esta minha crónica, claramente ainda sem saber o que fazer com o título.
Em boa hora aceitei o convite e desafio, do editor da BIRD Magazine, para escrever crónicas quinzenais. Escrever por “obrigação” e com regularidade, parece algo estranho, mas para quem gosta do que faz tudo flui com normalidade e qualquer obstáculo é facilmente ultrapassado. A verdade é que a primeira crónica que escrevi, para esta revista on-line, foi publicada em 3 de janeiro de 2015 e totalizaram 73 crónicas até agora! Nunca me faltou motivação, nem temática. Fazendo uma retrospetiva, deparei-me com títulos algo estranhos, insólitos ou, simplesmente, apelativos… o que pode motivar a uma leitura do conteúdo, já que é aguçada a curiosidade. Entre muitos outros, lembro-me de: “A cigarra alegre e a formiga preguiçosa”; “A morte, o insólito e a prostituição”; “Quando a raposa guarda o galinheiro”; “Vacas que riem… vacas felizes”; “As minhas cuecas Channo”; “O Pai Natal escondeu o Menino Jesus”… Normalmente, parto para a escrita sem me preocupar com o título, ou até mesmo sem a ideia-chave da mensagem, que vai aparecendo à medida que se vai caminhando. Desta vez, antes de ligar a ignição para arrancar, já tinha título!
Neste caso, começo por dizer que não sou especialista em soutiens, não irei falar dos enormes peitos da auxiliar de ação educativa da escola, nem irei dar destaque ao encerramento da fábrica da conceituada marca de roupa interior feminina – Triumph –, embora nesta última parte houvesse muito que abordar, que passaria por palavras como “desemprego”, “crime económico”… Sim, já que o secretário-geral da CGTP, Arménio Carlos, considerou tratar-se de “um crime económico, preparado premeditadamente pela Triumph Internacional, no sentido de fechar a fábrica, passando por uma fase intermédia, que foi entregar por um ano a produção à Gramax”; ou então a entrega, no Conselho de Ministros, de uma peça de lingerie pelos trabalhadores da mesma fábrica, com uma dirigente do sindicato dos têxteis do sul afirmar: “Nós levámos um cinto de ligas para simbolizar a ida do senhor ministro da Economia [Caldeira Cabral] à empresa, quando apadrinhou todo este processo, a passagem da Triumph para a TGI – Gramax”. Como está expresso, foi um “cinto de ligas” e não um “soutien”, o que obrigaria a mudar o título de “O Teorema do Soutien”, para “O Teorema do Cinto de Ligas”, que deixaria de fazer sentido, face ao ocorrido neste meu acordar.
Lembrei-me que talvez o Diogo Piçarra tenha acordado a trautear uma canção que não existia, tal como eu com “O Teorema do Soutien”. Como é um compositor e cantor que está na berra, com muito sucesso, terá entendido, naquele dia do ano de 2016, que valeria a pena desenvolver a ideia e transformar o seu trautear numa verdadeira canção, digna desse nome, guardá-la e apresentá-la na altura certa, o que aconteceu no Festival da Canção – agora revitalizado com a surpreendente vitória de Salvador Sobral na Eurovisão. E valeu mesmo a pena, pois Diogo Piçarra teve a pontuação máxima do júri e dos espectadores, na segunda semifinal, e seria uma das canções favoritas à vitória final. Dois dias depois, senti o estrondo enorme da uma “bomba” ao ouvir falar da sua desistência deste festival, após pairar no ar a ideia de plágio. Tive conhecimento que o maestro António Vitorino de Almeida se apressou a ouvir as duas canções – “Canção do Fim” e “Abre os Meus Olhos” – e a afirmar que a canção levada ao Festival “não é um plágio, mas igual”, argumentando ainda que “a música é muito simples, é elementar e nestes casos é mais fácil acontecer plágios. Mas felicito o músico por nunca ter ouvido um cântico da IURD”. A Igreja Universal do Reino de Deus, numa nota enviada à agência Lusa, também se apressou a esclarecer que “não detém qualquer direito sobre a música [‘Abre os Meus Olhos’] que tem sido comparada com a ‘Canção do Fim’ e que Diogo Piçarra não tem qualquer ligação à IURD”. Li também que o cântico da IURD é plágio de uma terceira canção, indicando qual.
Fixando-me nestas duas, ouvi a versão pelo pastor Walter, no vol II de “Cânticos do Reino” e novamente a “Canção do Fim”, pelo Diogo Piçarra, e a estrutura musical é a mesma, com uma letra diferente. Fui à página do Facebook do Diogo Piçarra e li que decidiu terminar a sua participação no Festival da Canção. Atentamente, apreciei o que escreveu:
– “Não quero deixar de dizer o orgulho que poderia ser representar o meu país num concurso como a Eurovisão, mas já não faz sentido nenhum sequer tentar ganhar essa oportunidade. A minha carreira e vida não depende disto (…)”;
– “A simplicidade tem destas coisas e só quem não cria arte estará nesta posição. Faz parte da vida de um compositor e é algo que todos nós iremos ’sofrer’ a vida toda (…);
– “A minha consciência está tranquila na medida em que eu próprio sou quem está mais surpreendido no meio disto tudo: nasci em 1990, não sou crente nem religioso, e agora descobrir que uma música evangélica de 1979 da Igreja Universal do Reino de Deus se assemelha a algo que tu criaste, é algo espantoso e no mínimo irónico (…)”.
Mais tarde, numa entrevista na TV, gostei da sua postura, do seu ar sereno, a mostrar elevação.
Para não vir também a ser acusado de plágio, fui pesquisar “Teorema do Soutien”, no Google, e encontrei coisas dispersas, ora relacionado com “Teorema” ora com “Soutien”, mas não a junção dos dois. Intimamente, esperava que alguém já tivesse descoberto esse teorema, o que me levaria a dizer que “já não faz sentido nenhum ganhar a oportunidade de criar o teorema” e punha um ponto final no assunto. Assim, estou à vontade para prosseguir com a minha investigação, quem sabe… relacionando tamanho e peso dos seios com a elasticidade do material, para chegar a conclusões mais profundas relacionadas com a própria vida. Até lá.
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