J. Emanuel Queirós DR |
Senhores de uma ciência climatológica suposicional e usuários de uma inventiva sem vencimento cosmológico, progressivamente vêm reconhecendo nas dinâmicas geofísicas a Terra em mudança – como sempre esteve desde o princípio dos tempos – sem termos de esperar pelos próximos 50 anos para sentir os efeitos das suas mais significativas alterações.
Todos os dias, em cada nova aurora, estamos perante novos tempos que nos chegam, caminhantes distraídos e inocentes transpondo as limitações do tempo cronológico numa viagem insuspeita além do tempo e do espaço tridimensional. Constantemente, estamos a ser colocados diante de fenómenos físicos, naturais, alguns nunca vistos, capazes de contrariar todas as lógicas racionais e desafiar as mais inverosímeis previsões talhadas nas bancadas das ciências.
Tempestades e cheias de Verão na Europa, assim como temperaturas quase de ‘fritar’ em pleno Inverno como as que estão a ser registadas no Brasil, com o Sol ainda em migração pelo hemisfério Norte, começam a entrar no nosso quotidiano com alguma estranheza a que toda a gente se obriga a adequar por imperativo natural, adaptação e sobrevivência.
É uma redundância afirmar que estamos no Verão no hemisfério Norte. No entanto, a terceira cidade mais populosa do Canadá, Calgary (51º 5' 0'' N / 114° 5' 0" W), a sul do Estado de Alberta, com uma latitude semelhante à de Londres, na passada quarta-feira (10/11) já o Inverno foi antecipado com uma forte tempestade de neve. Dantes, jamais alguém vivo testemunhou um semelhante fenómeno de “estio”.
Embora o homem tenha vindo a posicionar-se sobre a Terra como mais um factor geofísico, gerando alguma entropia na calibração nos sistemas naturais, a verdade é que a sua influência ainda é diminuta para a afectar tanto as dinâmicas planetárias tanto quanto o bem-estar ambiental do género humano, como são exemplos a poluição irrespirável do ar em Pequim e a desertificação do mar Aral entre o Casaquistão e o Uzbequistão.
É, pois, necessário que Humanidade tenha bem aferida a consciência da sua ‘pegada’ no ambiente terrestre mais próximo e mais distante, dos efeitos directos e indirectos da sua acção sobre a Terra, a sociedade e o indivíduo, de modo a evitar posicionar-se no mundo como vítima inocente do seu próprio empreendimento civilizacional.
Os tempos do homem correm céleres e agitados, mas o tempo fisiográfico não é mais o que julgávamos que ele fosse, estático e de periodicidade regular, em repetência cíclica anos após ano como definido no conceito de clima. Nem a Terra é um espaço infinito sempre pronto a ser consumido e retalhado de acordo com a conveniência do homem.
Antes de mais, a Terra é um organismo astronómico, maternidade de toda a vida biológica sempre a dar provas muito evidentes de possuir vida própria, em todos os seus subsistemas naturais como toda a evolução da própria Vida o comprova. Repercute-se em toda a existência que o planeta comporta e sustenta, e está espelhada nas longos ciclos geofísicos marcados por cadências astronómicas nunca reincididas no palimpsesto terrestre.
No território a que damos o nome de Portugal, temos sentido o efeito de eventos a que não estávamos habituados, moderados nos seus efeitos quer no mar quer em terra, alguns com consequências imediatas outros a deixar antever os seus efeitos para o devir.
É notório que o tempo se manifesta crescentemente alterado, por vezes mais agitado, descaracterizando as convencionadas estações do ano nas temperaturas, nas humidades e nas precipitações, à passagens das massas de ar. Este ano o Verão removeu seus traços de carácter e, até, retirou-se do norte para endereços incertos com os seus mais fortes argumentos.
As alterações dos ciclos naturais e os imprevisíveis eventos tectónicos e hidrometeorológicos produzem também seus efeitos humanos, mexem com a nossa passividade, alteram as nossas dinâmicas, despertam-nos para a realidade do nosso mundo menos observado e mais esquecido em nós, embora sempre presente.
Com um Verão por acontecer assinalado no calendário e na convenção, despertam memórias imorredoiras dos estios quentes, dos dias ensolarados de canícula e das noites iluminadas de Agosto, aumentando a saudade das voltas percorridas sem preocupações e sem retorno. O tempo mudou e sem que conscientemente o queiramos ou o desejemos, nós também estamos a mudar com ele.
Belíssimo texto que deixa múltiplos alertas... e se soubessemos caminhar respeitosamente?
ResponderEliminar