quinta-feira, 5 de fevereiro de 2015

COMISSÃO PARLAMENTAR PARA LAMENTAR

HÉLDER BARROS
Recentemente, na Assembleia da República, uma comissão de inquérito ao caso BES/GES, reuniu-se à porta fechada, de modo a que o antigo contabilista desta instituição, Machado da Cruz, fosse ouvido e que a natureza sigilosa de alguns pontos da audição não fosse corrompida, mormente, os que estivessem abrangidos pelo segredo de justiça.

Para espanto de muita a gente, ou talvez não, durante a reunião, o presidente desta comissão terá pedido aos deputados presentes, mais aos seus respetivos assessores parlamentares, que desligassem os seus telemóveis e outros hipotéticos meios de comunicação, muito provavelmente por ter sido alertado a partir do exterior da sala em que decorria a sessão que, o conteúdo parcial ou integral das declarações do contabilista, estaria a ser conhecido com sincronismo temporal.

Com casos como este e quejandos, como se poderá falar em respeito pelo segredo de justiça em Portugal?… será que esta informação é facultada, designadamente aos jornalistas, de forma gratuita, ou estaremos perante um caso de corrupção, de partilha indevida de informação sigilosa a troco de dinheiro ou de favores... considero que, já não temos mais margem para acreditar na boa-fé da maioria dos políticos que nos representam; não sejamos ingénuos!

Enquanto docente, tenho o defeito de profissão de andar sempre a retirar temporariamente (durante o período de aulas) os telemóveis aos alunos, pois a nova geração usa o acessório tecnológico quase como um apêndice natural do seu corpo. É uma luta diária, por isso já se tornou rotina. Que eles tentem copiar nas provas de avaliação através de meios tecnológicos avançados, também é recorrente. Mas, os deputados da nação, cometerem de forma contínua este tipo de crime, o rompimento do segredo de justiça, ao ponto de, terem que ser repreendidos no sentido de desligarem os seus telemóveis, como se de discentes do ensino básico se tratasse é, no mínimo, lamentável!

Não vou cair na tentação fácil de dizer que todos os deputados fazem isso. Nem pensar. Acredito que muitos deles estão no seu mister com todo o sentido de responsabilidade, ético e deontológico. O problema, neste caso, é que basta um deles facilitar a fuga de informação, para que a quebra de sigilo, afete de forma estridente e vergonhosa, o funcionamento da nossa republica. Considero que é do senso comum, que um deputado deve ter uma noção de que a sua deontologia e ética institucionais, no escrupuloso cumprimento das suas funções parlamentares, se devem reger por elevados padrões a esse nível.

Quanto aos jornalistas e ao seu papel informativo, sabemos igualmente que reina “lei da selva”, mas da mesma forma que referi para os deputados, não se deve confundir a árvore com a floresta. É, no entanto, gravíssimo, que exista esta relação tão conspurcada, entre a nossa classe política e os jornalistas. Como se podem continuar a arvorar em defensores dos grandes valores (da ética, da responsabilidade pública, de nobres ideais de justiça e da honestidade), uns e outros, se eles próprios não conseguem cumprir, minimamente, o seu dever institucional de manter o sigilo numa comissão parlamentar de inquérito, ainda mais, quando o assunto tratado está sujeito ao segredo de justiça.

Ademais, há ainda aqueles políticos que, não estando já em funções e que se tornaram, entretanto, comentadores de política profissionais, nas televisões, rádios ou jornais que, numa prova cabal da sua falta de ética, estão sempre a antecipar acontecimentos em primeira mão, porque alguém do meio político lhes facultou informações privilegiadas... isto é simplesmente, lamentável, onde está a seriedade de toda esta gente?...

E uma coisa eu sei, com os meios tecnológicos atualmente ao nosso dispor, seria muito fácil descobrir os culpados e jamais possibilitar que, um cidadão que se permite ter este tipo de comportamentos, possa continuar a ser deputado da nação, ou que possa manter uma carteira profissional de jornalista. Haveria “sangue”, mas o exemplo ficaria para memória futura e talvez o modelo de funcionamento da nossa democracia, começasse a ser construído por quem mais o deveria defender... mas, se calhar, como estamos em Portugal, vai ser feito um inquérito ao assunto e vai ficar “tudo como dantes no Quartel de Abrantes”! Esta foi só mais uma comissão parlamentar e para lamentar de forma veemente por todos nós!

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