GABRIEL VILAS BOAS |
No entanto, a famosa pergunta encerra outra questão, mais subtil, mas que também vale a pena discutir: O meu projeto de vida é a minha profissão?
“O que queres SER…?” tem que ser muito mais que uma profissão, porque somos Pessoa e o trabalho é só um instrumento e não um fim. Todavia, desde crianças somos condicionados a construir uma identidade através do trabalho. De uma maneira sub-reptícia ou declaradamente, procuram engavetar a nossa vida no espartilho de uma profissão, especialmente no caso de termos algumas qualidades profissionais que nos aconselham determinada opção.
O problema é que não estamos preparados para contrariar este paradigma na altura devida, porque, raramente ou só muito tarde, pensamos no que somos e no que queremos de nós, como um todo.
Quando a mecanização da ditadura do trabalho nos desumanizou, quase por completo, de tal maneira que deixou de haver amigos, percebemos, claramente, que não queríamos ser nada daquilo em que nos tornámos.
E então sofremos! Sofremos muitíssimo, porque nos dirão que a escolha foi nossa. E, na verdade, foi… e não foi, porque, neste mundo tão diverso e tão democrático, só havia uma escolha. Desde as primeiras conversas em família às opções escolares.
Ninguém pergunta na escola ou em casa: “Olha lá rapaz, que tipo de pessoa queres tu ser?” Se esta pergunta fosse feita a uma criança ou a um adolescente ou até a um jovem adulto, em 90% dos casos, o interlocutor gaguejaria, surpreendido.
E há tanto para ser além do tradicional e esperado “Quero ser boa pessoa! Quero ser feliz!”
Quero ser tolerante, decidido, audaz, fraterno, simpático, paciente, trabalhador… E cada um poderia ir construindo a sua personalidade a partir dos seus valores de base. Seria uma escolha sua e consciente, onde a profissão se haveria de enquadrar, mas nunca impor.
Provavelmente evitaríamos interrogações angustiadas do género “Quem sou eu fora do trabalho?”, por volta dos quarenta. Saberíamos que somos o projeto de vida que quisemos ser, que não nos conhecem apenas pela profissão, porque o trabalho que exercemos é só o trabalho que exercemos.
Então as pessoas que cruzarem a nossa vida apreciarão as nossas qualidades profissionais, intelectuais e físicas do mesmo modo que valorizarão as nossas qualidades pessoais. Nessa altura seremos grandes, como estava destinado a ser, e seremos a Pessoa que quisemos ser.
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