JORGE NUNO |
A história poderia acabar na cerimónia, com o padre a dizer – “Na presença da família, dos amigos e de Deus eles irão trocar os seguintes votos: que se apoiarão mutuamente a partir de hoje, na riqueza e na pobreza, no melhor e no pior, na saúde e na doença (…)” –. Desculpem se vos transmiti essa ilusão, mas esta crónica não se baseia numa história que acaba em casamento; que regra geral começa bem e tantas vezes acaba mal; ou, embora menos frequente, que começa mal e acaba bem!
Também não terá a ver, unicamente, com excessos ou defeitos de interpretação decorrentes da nossa personalidade e do nosso modo de olhar; por isso é que terá surgido o rótulo de pessoas otimistas e pessimistas. Sobre estes, muito novo, aprendi que “os otimistas são patetas alegres” e “os pessimistas são patetas tristes”, embora passado 50 anos apenas não tenha dúvidas: que os pessimistas são patetas tristes; e que eu continuo a não gostar de ver atribuídos rótulos em pessoas.
Indo direito ao assunto, sem mais demoras, esta crónica aborda, sumariamente, alguns feitos de que somos capazes – “no melhor” – e que nos faz sentir uma pontinha de orgulho, mesmo que diretamente o esforço não seja nosso, assim como aqueles aspetos que deixam um sabor amargo, por representarem o lado negativo e nos colocarem numa posição delicada, por oposição – “no pior” – onde, mais uma vez, não deixamos indícios de ter feito qualquer esforço direto para evitar.
Recentemente, fiquei muito agradado por saber que:
– O Mercado do Livramento, em Setúbal, foi incluído pelo USA Today na “lista dos mais famosos mercados de peixe do mundo”;
– Através do “Readers’ Choice”, em “10 Best’s” – uma divisão do mesmo USA Today –, por votação, Portugal foi escolhido como o melhor país europeu;
– Segundo The Gardener’s Garden, da Phaidon Press, há cinco jardins em Portugal entre os melhores 250 jardins do mundo, sendo eles: Serralves, no Porto; Palácio da Fronteira, em Lisboa; Quinta da Regaleira, em Sintra; Quinta do Palheiro, no Funchal e o Parque Terra Nostra, nas Furnas, Açores;
– Foi aprovado pela UNESCO a criação da Reserva da Biosfera, após candidatura conjunta englobando as regiões de Bragança, Zamora e Salamanca; será considerada a maior reserva transfronteiriça da Europa e equivale a ter “um selo de qualidade”, pelo uso e preservação da biodiversidade;
– O jornal online norte-americano The Hufftington Post, através da sua secção de viagens, considerou o Douro o melhor itinerário turístico fluvial da Europa;
– A cidade do Porto foi eleita, por dois anos seguidos, o Melhor Destino Europeu; foi também colocada, pelo Finantial Times, na lista das dez cidades do sul da Europa mais atrativas para o investimento estrangeiro;
– O chairman e fundador da Fosun – de nome Guo Guangchang – terá influenciado os investidores, particularmente chineses, ao considerar Portugal como melhor país da Europa para investir;
– Cinco treinadores portugueses brilharam ao sagrarem-se campeões nos respetivos campeonatos nacionais de futebol, na época 2014/2015, pelo Chelsea (Inglaterra), Basileia (Suíça), Zenit de São Petersburgo (Rússia), Olyimpiakos (Grécia) e S. L. Benfica (Portugal);
– Três atletas portugueses brilharam ao serem considerados: o melhor jogador de futebol do mundo, pela 3.ª vez (pela FIFA); o melhor jogador de futsal do mundo, pela 2.ª vez (através de votação no Site Futsal Planet) e o melhor jogador de futebol do Europeu Sub-21, em 2015 (através de um painel de especialistas da UEFA);
– Portugal esteve no pódio dos Jogos Europeus de Baku, Azerbaijão, em diversas modalidades, obtendo dez medalhas: ouro – nas modalidades de Ténis de Mesa, Taekwondo e Judo; prata – em Triatlo, Tiro e Canoagem K1 1000 m e 5000 m; bronze –em Futebol de Praia, Taekwondo e Trampolim Sincronizado Feminino;
– Um grupo de investigadores portugueses foi premiado por terem vindo “a desenvolver estratégias de luta contra a infeção por VIH (escolha efetuada por um vasto painel de cientistas internacionais que integram o programa “Partnering for Cure”);
– Uma investigadora portuguesa, da Universidade de Coimbra, viu atribuído, em Roterdão, um prémio internacional pelo seu trabalho de “investigação sobre a osteoporose após a menopausa, devido à redução dos níveis da hormona estradiol”;
– Um inventor português foi premiado, com a medalha de ouro, na 43.ª edição do Salão Internacional de Invenções de Genebra (o mais importante do género em todo o mundo), ao criar um sistema que permite ajudar os invisuais a atravessar as passadeiras, sem semáforos e com recurso ao telemóvel.
Quanto ao “pior” (porque a crónica já vai longa) relato apenas duas situações:
– Segundo um relatório da ONU, com previsões para 2015, aponta que “Portugal vai ter a segunda pior taxa de fecundidade do mundo”, apenas será ultrapassado pela Bósnia-Herzegovina, sendo que esta previsão pode agravar-se por não ter em conta a forte emigração de jovens portugueses;
– Segundo a ONG Transparency Internacional (TI), baseando-se no Índice de Perceção de Corrupção de 2014 (o último conhecido), que engloba 175 países, Portugal é um dos países preocupantes, encontrando-se ao nível do Botswana, Chipre e Porto Rico. Comparativamente com os países europeus, consegue ser mais transparente do que a Itália, Grécia, Hungria, República Checa, Polónia e Roménia, com o senão de neste ranking ainda não estarem refletidos os casos: “Visto Gold”; “Duarte Lima e “José Sócrates”. Paralelamente, surge a informação que “Portugal é o 25.º país do mundo onde é mais fácil fazer negócios” e onde “funcionários de empresas públicas são os que mais aceitam subornos internacionais”.
Entretanto, vou ouvindo comentários jocosos, do tipo:
– Ah... não acredito que o mercado de peixe em Setúbal seja um dos mais famosos do mundo; alguém deve ter dado uma caixa de robalos ao jornalista!
– O chinês lá sabe a razão que o leva a dizer que Portugal é muito bom para investir!
– Alguém no Porto anda a untar as mãos ao que escreve para o jornal.
(…)
Tantas vezes somos nós próprios a desacreditar as coisas boas que temos em Portugal, que não valorizamos, mas que são realçadas por outros olhares, vindos de fora. Tantas vezes nem damos conta do mérito dos portugueses, ou se damos, reagimos com indiferença ou com uma pontinha de inveja. Tantas vezes deixamos passar, impunemente, atos reprováveis, e na nossa habitual bonomia… até ficamos com pena dos prevaricadores e à espera de um bom desfecho; mas se os inquéritos são arquivados ou os processos judiciais ficam em “águas de bacalhau”, dizemos, aparentando um ar zangado – Isto é sempre a mesma coisa!... Eles safam-se sempre!
Ao longe ouvem-se uns cães a ladrar e nós continuamos a marcha, com o “siga a rusga”, tal como nas de São João.
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