quarta-feira, 8 de outubro de 2014

REVISITAR "OS MAIAS"

HÉLDER BARROS
DR
Sou felizmente da geração que leu “Os Maias”, numa altura em que, enquanto jovem estudante, a sua leitura fazia parte do currículo do ensino secundário, da disciplina de Língua Portuguesa, ou Português, como se dizia na altura.

Recentemente, estreou-se o filme “Os Maias” realizada por João Botelho, e confesso que é muito reconfortante relembrar e fazer a analogia entre o romance escrito e o filme. Uma forma de escrita que nos remete para imagens, para um universo muito próprio devido à riqueza do seu vocabulário, que podem ou não diferir dos quadros imagéticos, para que o filme nos remete. Na arte, o que importa não é o que se vê, mas o que vai ser visto por cada um, numa experiência sempre individual, de contemplação, de choque dos sentidos... com a racionalização imanente.

O grande Escritor, Eça de Queiroz, com aquela sua narrativa muito detalhada e pormenorizada, é considerado um dos escritores mais “cinematográficos” da Literatura Portuguesa, de tal forma que, as descrições escritas que levava a cabo sobre objetos, pessoas e lugares, chegam a ser mais fotográficas que a própria realidade observável. Dizem alguns, que as fotografias ou pinturas, não descrevem o real, ou o que retiramos dele, com igual detalhe e conteúdo, que essas narrativas mágicas sempre conseguiam.

Por tudo isto e pela qualidade cinematográfica que o Cinema Português contemporâneo vai demonstrando, o interesse de que este filme se reveste para o público que leu e estudou, esta obra de Eça torna-se, para mim, ainda maior.

Se, na altura, já lá vão quase trinta anos, para um estudante do curso científico-natural, ler “Os Maias” não se pudesse considerar uma “pera doce”, que dizer da vantagem de termos a possibilidade de ver o livro transposto para o cinema. Literatura e Cinema, uma relação sempre difícil, pois apesar do poder da imagem em movimento, o poder narrativo de Eça é insuperável na minucia, no poder imagético que nos remete, com as suas frases exuberantes e magníficas.

Reconheço que fiquei curioso com este filme, porque recordo o universo de imagens para que o livro me conduziu e, é claro que, a ânsia da confrontação é grande. No entanto, são formas de arte diferentes, nem melhores, nem piores, são diferentes, embora complementares. Não há um bom filme, sem um bom guião, e nas obras de Eça, o processo de criação de um filme deve passar fundamentalmente, pela arte de saber cortar bem, tão rico e abundante é o texto. 

Enquanto docente, embora não da área das línguas, tive a hipótese de verificar a importância do estudo da obra de Luis Sttau Monteiro, “Felizmente há luar”, pelos meus alunos e a possibilidade simultânea deles assistirem à representação teatral da mesma. Pude assim, assistir dentro do sistema educativo, mas fora da disciplina de Português, à maior motivação que a obra provoca nos jovens alunos, quando apresentada em dois formatos que se complementam de forma sublime.

Isto tudo, para dizer que, na minha modesta e despretensiosa opinião, a obra de Eça de Queiroz, “Os Maias”, se constituiu como um marco literário referencial de uma geração que os leu e estudou no ensino oficial e que retrata a maneira de ser do Povo Português no final do século XIX e no dealbar do século XX, mas que deixou lastro e heranças indeléveis até hoje e nem sempre pelos bons motivos.

E o filme promete já que, João Botelho, ao que tudo indica pelo que pude antever nas criticas e antevisões, não defraudará as melhores expetativas da Arte Cinematográfica Nacional.

OS MAIAS - TRAILER from Ar de Filmes on Vimeo.

Sem comentários:

Enviar um comentário