ANABELA BORGES DR |
Entrou em vigor,
em 1 de Outubro de 2014, a lei que criminaliza os maus-tratos contra animais de
companhia.
Eu acho bem.
Acho até muito bem, num país (e numa Europa!) que se quer modernizado, evoluído
e que se julga encavalitado na crista da onda capciosa do progresso, que se
pense em formas de proteger os animais. Os animais que vieram ao mundo, como
viemos nós e todas as espécies de seres vivos, com os mesmos direitos de cá
andar em paz e sossego, não têm culpa da insanidade de muitos – que, esses, a
bem vermos as coisas, não têm (não deviam ter) o direito de cá andar.
É claro que
poderão vir a surgir casos extremos na aplicação da lei, casos de excessos,
excessos de zelo, erros ou falhas nas interpretações e acepções do que
realmente importa, do que verdadeiramente, de forma cívica e consciente, faz
falta. Há pessoas que são paranóicas no que toca aos animais de estimação, há
mesmo situações ridículas, que, na verdade, não são nada, a não ser “manias”
nas cabeças das pessoas, mas isso é porque essas pessoas já são assim delas, em
tudo o que fazem, não apenas no que toca a animais. De qualquer modo, não
acredito que os tribunais venham a ser entupidos com esses casos. Acho que
devem ser denunciados, de acordo com a lei, casos de maus-tratos a animais e de
abandono. Acredito que, lentamente e com racionalidade, as pessoas comecem, de
facto, a respeitar os animais – porque é, acima de tudo, uma questão de
respeito.
Numa frase, bem
conhecida, atribuída a Gandhi, lê-se mais ou menos isto, que “O grau de evolução de uma sociedade pode ser
avaliado pelo modo como essa sociedade trata os seus animais.” Temos muito
a evoluir, portanto.
Também devo
referir que muita coisa pode ser tida em linha de conta, quando se fala em ter
animais de estimação. Todos sabemos que há muita gente que os tem e os quer
ter, mesmo sem reunir condições. É inegável o crescimento do número de cães em
habitações, muitas das vezes sem condições físicas das próprias habitações, com
animais encafuados em espaços exíguos, sem luz ou ar; outros acorrentados às
casotas, sujeitos a todo o tipo de condições climatéricas, à chuva, ao calor,
sem água para beber... – Tudo mais parecendo uma obsessão das pessoas por terem
cães, sem haver uma preocupação em dar-lhes as condições de que necessitam.
Muitas dessas pessoas são as que acabam por abandonar os cães na rua, por
incompatibilidade de partilha de espaço, por falta de tempo, e tantas outras
razões que aqui poderiam ser evocadas, nenhuma delas válida, pois há que
procurar outras soluções – abandonar um bicho que não vai fazer queixa á
polícia é o mais fácil para essas pessoas sem dó nem piedade; e então agora, em
época de caça, é verdadeiramente reveladora a desumanidade de quem quer ter cães
só porque sim, a seu bel-prazer.
Há muitas coisas
relacionadas com animais com as quais eu não concordo, muitas por considerar
que são maus-tratos, que revelam falta de respeito pelo próximo, pelos bichos,
que são também “o próximo” em relação a nós, humanos, que não somos, em nada,
mais do que eles.
Eu já fui
excluída (neste caso o termo é “bloqueada”) numa rede social por ser contra as
touradas, por ter manifestado a minha opinião num destes textos que escrevo. O
senhor, que se sentia ofendido por eu ser a favor do fim das touradas, dizia
assim, literalmente, num comentário ao meu texto: “Ficas com o teu egocentrismo. Então achas bem condicionar as minhas
liberdades? Amanhã, às 9:00 excluo-te das minhas relações”. Ah, pois é: tão
real como vocês estarem aqui a ler este texto – pessoas más, mas, acima de
tudo, perigosas para a sociedade. Eu acho que uma pessoa com um raciocínio
assim desconcertante é capaz de tudo. Isto mostra o que muitas pessoas são –
perigosas (é o termo) –, em relação umas às outras, mas muito mais em relação
aos animais. Acabar com as touradas é, para este iníquo cidadão, privá-lo das
suas liberdades.
As touradas, os
circos (com animais), os jardins zoológicos, só para dar alguns exemplos, são
espaços / actividades com animais que condeno.
O que seria do
ser humano se se mantivessem todas as tradições? Felizmente, já fomos capazes
de acabar com muitas. Felizmente! Manter tradições é saber escrutinar o que é
bom e faz bem aos homens, à natureza, aos bichos. Para que somos, então,
dotados de racionalidade? É só para fazer o mal? Para sujeitar à nossa vontade
quem não pediu para fazê-lo? Para satisfazer caprichos ridículos? Para
humilhar? Torturar?
Experimentemos
uma revolução. Assim simples: seres humanos enjaulados, enquanto diversos
animais admiram o espectáculo do lado de fora. Pois.
A Tareca e a Rita não param de brincar |
Não vou a nenhum
espectáculo de circo que inclua animais. Ponho muitas reticências em
determinados parques de animais e jardins zoológicos. Sou (muito) a favor de
centros que estejam vocacionados para a recolha, tratamento e libertação de
animais, cujo objectivo principal seja a recuperação de animais feridos ou
debilitados, ou em vias de extinção, com vista à sua devolução ao meio natural
(libertação).
Enquanto a Xica e a Xana descansam |
Na minha última
ida a Coimbra (cidade e suas gentes que muito admiro), por aquelas ruelas e
vielas, entre o casario, as tasquinhas e as esplanadas, vi muitos gatos cegos
de um olho. Sim, gatos com um “olho à
Camões”. Eram bichos assustadiços, que logo fugiam assim que alguém se
aproximava deles. Pudera! Fiquei deveras impressionada. E não tenho dúvidas de
que se trate de alguma estúpida brincadeira, estudantil ou não, de pôr os gatos
com um “olho à Camões”, na terra onde
o poeta terá feito os seus estudos. Mas, não – poeta Luiz Vaz de Camões, “príncipe dos poetas” –, tu não aprovas a estupidez, pois não? Os
poetas não se orgulham da alma humana impiedosa que a cada passo se revela em
nós. Sejamos, pois, mais humanos, menos cruéis.
Termino com uma ideia atribuída a Leonardo Da Vinci:
“Chegará o dia
em que todo homem conhecerá o íntimo de um animal. E nesse dia, todo o crime
contra o animal será um crime contra a humanidade.”
Falta esse dia.
Sem comentários:
Enviar um comentário