GABRIEL VILAS BOAS DR |
Há pouco dias, jornais, rádios e canais de televisão noticiavam um
problema qualquer com a CPLP. Num estilo morno e desinteressado, foi o povo
informado que o nosso Presidente da República e o nosso Primeiro-Ministro
estavam muito incomodados pela adesão à Comunidade de Países de Língua
Portuguesa da Guiné Equatorial, mas acabaram por aceitar para não tirar o
brilho à organização timorense. Qualquer pessoa pode achar que isto era uma
anedota, das muitas que se contam dos políticos com baixa popularidade, mas a
trata-se duma notícia.
Acresce ainda ao insólito da situação a força da argumentação portuguesa:
a Guiné Equatorial não fala português e naquele Estado não há respeito pelos
direitos humanos.
Como??? Não falam português e pedem adesão a uma Comunidade de Países de
Língua Portuguesa? Como é que é possível admitir tal? Como é possível que um
país como Timor que conquistou a sua liberdade à custa de tanto sangue proponha
para esta comunidade lusófona um país governado por gente do calibre do senhor
Teodoro Obiang? Como é possível que dois países (Brasil e Timor) se imponham
aos restantes seis (Portugal, Angola, Cabo Verde, Moçambique, S. Tomé e
Príncipe) e decidam a adesão dum país como a Guiné que nada tem que ver com a língua
e a cultura portuguesa? Que Comunidade é esta onde as adesões se fazem por
consensos mentirosos e não por votações?
Para mim é claro que a Guiné Equatorial nada tem que ver com a CPLP nem
com os valores que esta diz defender. Por outro lado, não se pode admitir novo
membro a não ser por unanimidade. Como aceitar um novo parceiro que não é
bem-vindo por algum dos membros?
É tudo tão surreal quanto, infelizmente, verdadeiro! Se Cavaco Silva
ainda tivesse um pingo de vergonha jamais poderia pactuar com tamanho ultraje a
uma CPLP que ajudou a fundar há dezoito anos. Decente, teria sido Cavaco e
Passos Coelho perguntarem aos representantes do Brasil e de Timor, o que fazia
ali aquele ditadorzinho africano que nem português falava. Qualquer líder duma
associação de amigos teria exigido uma votação imediata ou, na ausência de tal,
levantava-se e tomava o primeiro avião para Lisboa.
O que fizeram humilhou Portugal, os portugueses e a sua cultura. Destruiu
os frágeis fundamentos da CPLP e revelou com os nossos líderes políticos são
tão fracos (apetecia escrever uma palavra começada por B) que nem num caso onde
o dinheiro não dita leis e o confronto é com países sem estatuto político
internacional, conseguem impor respeito.
Quando a 17 de julho de 1996, a CPLP nasceu fiquei com pena que não
tivesse um nome tipo “Lusomundo” em vez de daquele nome de companhia
ferroviária. Desgraçadamente, foi só o prenúncio duma atividade anémica para
não dizer virtual. Durante 18 anos não se viu intercâmbio de professores,
engenheiros ou artistas. Ninguém vislumbra trocas comerciais privilegiadas ou
relações diplomáticas intensas que aproximem os povos.
Na prática trata-se duma comunidade virtual, cuja existência, a maioria
da população de cada povo nem sabe que existe. Pensando melhor, talvez tenha
sido melhor ter ficado com aquele nome duma SA qualquer. Assim, mais dia menos
dia, entra em insolvência, passa-se a certidão de óbito e o tempo cobre o
cadáver com uma mão de esquecimento.
Sem comentários:
Enviar um comentário