quarta-feira, 29 de abril de 2015

SEXO COM ALUNO

PAULO SANTOS SILVA
Ponto prévio – esta crónica parte do princípio sagrado de qualquer estado de direito, a presunção de inocência de qualquer cidadão, até prova em contrário. Não pretendo com ela, nem acusar nem defender qualquer um dos intervenientes, uma vez que os factos que poderiam concorrer para qualquer uma destas posições ainda se encontram por provar. Pretendo, sim, refletir sobre alguns aspetos que considero importantes e que foram suscitados, quer pela notícia, quer pela entrevista da professora Liliana Costa à CMTV.

Comecemos, então, pelo princípio. O professor vê a sua conduta profissional regida pelo Estatuto da Carreira Docente. Este estatuto, na sua secção II – artigo 10º, define os deveres gerais do professor.
Nas alíneas c) e d) do artigo 10º - A, deveres para com os alunos, pode ler-se:

c) Promover o desenvolvimento do rendimento escolar dos alunos e a qualidade das aprendizagens, de acordo com os respetivos programas curriculares e atendendo à diversidade dos seus conhecimentos e aptidões;
d) Organizar e gerir o processo ensino-aprendizagem, adotando estratégias de diferenciação pedagógica suscetíveis de responder às necessidades individuais dos alunos;

Por outro lado, as alíneas a) e b) do artigo 10º - C, deveres para com os pais e encarregados de educação, lemos:
a) Respeitar a autoridade legal dos pais ou encarregados de educação e estabelecer com eles uma relação de diálogo e cooperação, no quadro da partilha da responsabilidade pela educação e formação integral dos alunos;
b) Promover a participação ativa dos pais ou encarregados de educação na educação escolar dos alunos, no sentido de garantir a sua efetiva colaboração no processo de aprendizagem;
Estamos, pois, perante conceitos que pela sua amplitude se tornam difíceis de concretizar uma vez que e a título de exemplo, estratégias de diferenciação pedagógica suscetíveis de responder às necessidades individuais dos alunos, é algo que permite muitas e variadas interpretações.

Atualmente, a avaliação dos alunos do ensino básico tem como suporte legislativo o Despacho Normativo nº 13/2014, de 15 de setembro. Este despacho normativo, regulamenta:
a) A avaliação e certificação dos conhecimentos adquiridos e das capacidades desenvolvidas pelos alunos do ensino básico, nos estabelecimentos de ensino público, particular e cooperativo, bem como os seus efeitos;
b) As medidas de promoção do sucesso escolar que podem ser adotadas no acompanhamento e desenvolvimento dos alunos, sem prejuízo de outras que o agrupamento de escolas ou escola não agrupada, doravante designados por escola, defina no âmbito da sua autonomia. 
No que respeita às medidas de promoção do sucesso escolar que podem ser adotadas no acompanhamento e desenvolvimento dos alunos, dizer que estas se encontram vertidas no artigo 20º da Secção VI e que se consubstanciam na elaboração de um Plano de Atividades de Acompanhamento Pedagógico. Este plano, por norma, é elaborado pelo Conselho Pedagógico e é constituído por duas partes distintas – uma primeira em que os docentes das disciplinas intervenientes no mesmo identificam as dificuldades demonstradas pelo aluno e uma segunda parte em que são definidas as medidas a implementar e que se dividem pelos três grandes intervenientes no plano, as que são da responsabilidade da escola e dos professores, as que são da responsabilidade do aluno e as que são da responsabilidade do encarregado de educação. Este plano que pode ser de turma ou individual, “é traçado, realizado e avaliado, sempre que necessário, em articulação com outros técnicos de educação e em contacto regular com os encarregados de educação”, ao mesmo tempo garante “aos alunos que revelem em qualquer momento do seu percurso dificuldades de aprendizagem em qualquer disciplina é aplicado um plano de acompanhamento pedagógico, elaborado pelo professor titular de turma em articulação com os restantes professores da turma, quando existam, no 1.º ciclo, ou pelo conselho de turma, nos 2.º e 3.º ciclos, contendo estratégias de recuperação que contribuam para colmatar as insuficiências detetadas”.

Aqui chegados, importa refletir sobre alguns dos aspeto do caso em concreto.

Sendo eu um adepto confesso da utilização das novas tecnologias da informação em contexto escolar, posso compreender a utilização da comunicação via mail ou através de plataformas como a Moodle, para troca de mensagens, envio de trabalhos, resolução de fichas e tarefas online e/ou esclarecimento de dúvidas. Já me custa, no entanto, a entender a disponibilização do número de telemóvel pessoal. Tanto mais que, como afirma na entrevista, o fazia a “alguns alunos de confiança”. Pergunta-se, com base em que critérios é que se define um aluno de confiança? Não estaremos, potencialmente, perante um caso de descriminação de alunos em favor de outros? Igualmente questionável, é o facto de os jantares de turma que promovem o espírito de solidariedade e união, terem efeito direto na melhoria das aprendizagens e dos resultados dos alunos. Nomeadamente quando terminam com os docentes a levar os alunos a casa na sua viatura. Não esquecer que estamos a falar de alunos de 14/15 anos e lembrar, também, que qualquer atividade realizada fora da escola carece de uma tomada de conhecimento e autorização prévias, por parte do encarregado de educação. Pergunta-se, também, se todas estas estratégias que a professora enumera, foram presentes e validadas pelos órgãos pedagógicos competentes, ou seja, grupo disciplinar, departamento curricular, conselho pedagógico,… Outra questão que foi levantada ao longo da entrevista, tem a ver com a disponibilização de tempo de almoço para dar explicações. Quem é (ou foi) professor, sabe perfeitamente que é bastante habitual esta situação acontecer, caso contrário muitas atividades que se realizam nas escolas não teriam condições para acontecer. É um facto, e isso também é referido na entrevista, que o fim de áreas curriculares não disciplinares como o Estudo Acompanhado, não veio trazer benefícios aos alunos. Bem pelo contrário. Uma das maiores dificuldades que os alunos têm e que era resolvida nesta área, tem a ver com o “saber como estudar”, para as diferentes disciplinas.

Claro que o paradigma social e educacional mudou de uma forma radical nos últimos anos, nomeadamente com a introdução das novas tecnologias. Esta mudança, veio tornar as pessoas mais próximas, deixando-as à distância de um clique. Também a linha que separa o que é público do que é privado se tornou mais ténue, sendo cada vez mais difícil de definir onde é que se encontra. Torna-se por demais evidente, que o fator motivacional dos alunos é um aliado precioso do professor que terá de ter a sabedoria e competência necessárias para lidar com as expectativas dos alunos, bem como com as suas alegrias, frustrações, emoções, etc.

Muitas outras questões se levantaram ao longo da entrevista, sendo algumas na minha opinião, bastante sensíveis. Uma vez que a prosa já vai longa, termino com mais um esclarecimento e um voto. O esclarecimento é de que “a suspensão preventiva é proposta pelo órgão de administração e gestão da escola ou pelo instrutor do processo e decidida pelo director regional de educação ou pelo Ministro da Educação, conforme o arguido seja docente ou membro do órgão de administração e gestão do estabelecimento de educação ou de ensino”, conforme consta do nº 7 do artigo 115º do Estatuto da Carreira Docente. Desconheço se foi essa a fundamentação, mas posso até entendê-la como uma forma de proteger os intervenientes no processo e acalmar o alarme social (penso que será esta a tradução mais correta para o termo sururu, tantas vezes utilizado na entrevista) que estas situações sempre provocam. O voto que pretendo formular, é que se proceda da forma mais célere possível ao apuramento cabal dos factos e, assim, possa ser concluído no mais curto espaço de tempo, o processo disciplinar que terá sido instaurado. A bem da verdade.

PS – A escolha do título da crónica decorre do rodapé que esteve presente no ecrã, ao longo de grande parte da entrevista. Deixo aos meus leitores a avaliação da qualidade jornalística da escolha do mesmo, por referência ao teor daquilo que foi dito na entrevista e que poderá ver aqui.

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