A vida tem destas grandes ironias:
durante décadas os portuenses ironizavam com os lisboetas
dizendo que Lisboa
era a capital da boa vinda, por oposição ao Porto, que era a capital do
trabalho; hoje o Porto funda a sua economia no turismo! E ainda bem que o faz,
pois a cidade tem enormes potencialidades para o turismo, mas convém não
exagerar.
GABRIEL VILAS BOAS |
O Porto é hoje uma cidade muito
diferente daquelas que existia há 10/15 anos e que ainda existe nas nossas
cabeças. A economia da cidade assenta no turismo. As viagens low-cost e o prazer de viajar que tomou
conta das pessoas de todo o mundo, fizeram da cidade do norte de Portugal um
destino de eleição para quem já conhecia as principais cidades europeias.
A cidade invicta tornou-se
rapidamente numa cidade da moda, sendo visitada diariamente por milhares de
turistas, que ficam pelo Porto e 48 a 72 horas e saem maravilhadas com a
paisagem, o rio, a comida, o vinho, alguns monumentos e, claro, as pessoas.
Gastam entre trezentos a quinhentos euros e voltam, porque ficam com a certeza
de que há ainda muito que ver e sentir.
E como conseguiu o Porto esta mudança
repentina de vida? Mudou de «chip» e mudou de pessoas, aproveitou as circunstâncias
e fez da crise uma oportunidade. A primeira coisa que esteve na base desta grande
mudança foi perceber que eram os jovens aqueles que mais viajavam e por isso a
cidade devia estar preparada para lhe satisfazer os caprichos mais básicos.
Existe a Ribeira e o cais de Gaia, mas havia um público diferente por
satisfazer e o austero Rui Rio compreendeu isso e abriu as portas das livrarias
para uns copos pela noite dentro. Como a zona estava deserta de habitantes
houve poucas reclamações quanto ao ruído.
A máquina registadora do Porto
retomava a sua atividade mas precisava de novos operadores. Gente habituada a
viajar, a falar línguas, a não censurar quem gasta em lazer. Pessoas que
trocaram a oferta do pitoresco pela oferta gourmet. Claramente renovou-se o
estilo de fazer turismo. Aproveitou-se os produtos, a hospitalidade, mas a
decoração mudou, os menus foram substituídos, o atendimento faz-se de maneira
muito diferente.
A nível hoteleiro o Porto não estava
preparado para este fast-turism, mas rapidamente se ajustou e agora corre o
risco de se desajustar, mas em sentido contrário, de tal modo que antevejo que
em breve entrará em cura de emagrecimento. As dormidas aumentaram de 67 euros
para 114, por noite, em parcos seis meses!
Hoje abrem hotéis de charme em vários
pontos da cidade, os hostels nascem como cogumelos e casas particulares
voltadas para o turismo tornaram-se na mais recente e lucrativa atividade
económica da cidade. A renovação do depauperado parque imobiliário vai chegar
por onde menos se espera.
Tudo isto são boas notícias e devemos
estar satisfeitos com elas. Dentro das nossas possibilidades devemos
aperfeiçoar a promoção e a oferta, tornando a cidade cada vez mais atrativa.
Contudo, é necessário olhar em perspetiva e refrear os ímpetos pueris.
O Porto é cidade da moda do turismo
internacional e não uma cidade âncora do turismo internacional como é o caso de
Paris, Roma, Veneza, Florença, Barcelona, Madrid, Londres, Amesterdão, Nova
Iorque. E todos sabem o que acontecem às modas: passam. Haverá um momento em
que os turistas escolherão outras paragens e o afluxo de turistas diminuirá.
Nessa altura o Porto não pode ser naquilo em que se está a tornar:
completamente dependente do turismo.
A cidade não pode abandonar outras
áreas económicas. Deve reforçar os serviços e comércio, criando lojas onde os
produtos nacionais e locais saibam emparceirar com produtos doutros países;
deve oferecer cultura que vá além de livros, criando companhias de teatro e
dança de qualidade, com uma programação capaz de atrair também os turistas. Há
uns anos a companha de Ballet da Gulbenkian ficou sem trabalho, seria uma ótima
medida convidá-la a instalar-se na cidade e a desenvolver projetos que se
adequassem ao novo público da cidade.
Falta à cidade um grande museu e
fazer aquilo que o Museu Nacional de Arte Antiga já faz: intercâmbio com
coleções doutros grandes museus europeus.
A oportunidade é única e exige o
melhor de todos. Os ganhos obtidos até ao momento devem ser reinvestidos,
tentando melhorar a oferta e promover outras áreas geográficas próximas,
nomeadamente o Minho e o Douro.
Mais do que estar na moda, o Porto tem de não passar
de moda!
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