Nuno Meireles DR |
Ontem celebrou-se o Dia Internacional do Deficiente. Sinceramente, nunca fui adepto de dias celebrativos como este o é. Numa sociedade que se diz (ou tem pretensões de ser) igualitária, não faz qualquer sentido ter dias de celebração dedicados a classes mais vulneráveis na sociedade ou a atos que não deveriam existir. É o dia da mulher, da criança, da luta contra a fome, da luta contra isto ou aquilo. Basta! Vamos abrir horizontes para uma sociedade de facto mais igual. Abula-se de vez estes dias que só acentuam as diferenças existentes entre todos nós.
Como deficiente motor, é-me muito difícil aceitar que se ande um ano inteiro sem quase falarem dos nossos problemas e só se lembrem de nós apenas um dia em todos os 365/6 dias. Neste dia, é só reportagens e programas nas televisões, jornais, páginas informativas na Internet, rádio. É aqui neste dia que se mostra o que é ser deficiente em Portugal, quais as dificuldades e necessidades que temos, as grandiosidades que fazemos. E nos outros dias será que não existimos? Nos restantes 364 dias devemos desaparecer, as barreiras arquitetónicas e sociais devem deixar de existir, as oportunidades para uma vida inclusiva – nomeadamente em matéria de emprego – são mais que muitas, a aceitação na sociedade dos cidadãos com deficiência é plena e sem descriminação nenhuma.
Sei que haverá muita gente que vai dizer ou pensar: “mas ao menos são lembrados, por pouco que seja”. Entendo e compreendo quem pensa assim mas se perguntarem a todas as pessoas – com ou sem deficiência – se preferem ser lembrados apenas um dia ou serem lembrados durante o todo o ano, a resposta será absolutamente clara. Toda a gente preferirá ser lembrada todo o ano.
Quando falo em sermos lembrados todos os dias, não quero com isso dizer que andemos na boca do mundo, em todos os jornais televisivos e impressos. Não. Nada disso. Há muitas outras formas de se lembrarem de quem é deficiente sem haver tamanho alarido. Como? Simples: abolir todas as barreiras arquitetónicas em espaços públicos, para que quem anda de cadeira de rodas não tenha nem seja obrigado a fazer malabarismos que nem nos circos se fazem; colocar tudo o que é objeto transacionável (e não só) com zonas escritas em braile, para que os invisuais saibam o que estão a comprar e em que sitio estão; colocar sinais visuais em pontos estruturantes que envolvam sons, assim quem é surdo não é apanhado de surpresa; haver respeito pelos locais destinados aos cidadãos com mobilidade reduzida, por exemplo nos parques de estacionamento; que não olhem para nós como uns “coitadinhos” incapazes de realizar qualquer tarefa útil à sociedade; que nos deem oportunidade de trabalhar e com isso provar que afinal podemos ser úteis…
Estes são apenas alguns dos exemplos de como a sociedade se pode lembrar de nós um ano inteiro sem haver dias celebrativos ou de avivar memórias.
Tal como referi no início do texto, a existência destas datas só acentua a descriminação de quem é mais frágil na sociedade. Que se acabem de vez tais dias.
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