terça-feira, 29 de dezembro de 2015

12 DESEJOS PARA 2016, OU TALVEZ NÃO...

REGINA SARDOEIRA
Doze desejos para o novo ano. Penso neste número e ocorrem-me os doze meses – mas não me parece fácil estabelecer um desejo (e uma responsabilidade inerente à sua formulação) se, deste modo, os distribuir. Penso, em seguida, que, se os alinhar de um a doze, estabelecerei uma hierarquia, como se o primeiro fosse mais importante que o último ou vice-versa. E tenho alguma dificuldade em determinar uma tal tábua valorativa.

É preciso, no entanto, iniciar a lista e irei fazê-lo aleatoriamente. Ou talvez não.

Acima de tudo, desejo viver num mundo de gente capaz de se entender a si própria, enquanto tal. Apregoámos desde tempos imemoriais que somos superiores à animalidade, mesmo contendo-a; e no entanto, a vida que todos levamos em conjunto de modo nenhum faz jus à racionalidade que reclamamos para nós, enquanto diferença. Este seria o meu primeiro desejo, o único, caso o novo ano tivesse poderes para tornar clarividentes todos os racionais.

Mas, caso seja pedir demais para tão curto espaço de tempo – faltam três dias para o fim de 2015 – ao menos que à minha volta (e estou a afunilar os desejos) as pessoas pudessem ter na mente ideias e projectos positivos. Sim, basta de pessimismo e de lamúrias por tudo quanto é esquina, basta de prenúncios de desgraça e cânticos fúnebres de miséria. Sejamos optimistas.

Também estou nauseada com o acréscimo da mentira que grassa de modo assustador pelos meios de comunicação social, sejam eles simples ou complexos. Por favor: deixem de elogiar a fotografia horrível dos vossos “amigos” do facebook ou a frase insípida que não quer dizer absolutamente nada ou o acontecimento absurdo com que alguém festejou o próprio aniversário. Sim, eu desejo, particularmente, a verdade.

E depois, ver como certos imbecis atingem a notoriedade, apenas porque lhes atribuem títulos ou são familiares de outros a quem atribuíram títulos, e perceber que o talento verdadeiro não consegue erguer-se deste manto de escória para enfim, florir, e que o talentoso deixa mesmo de abrir o seu talento, porque, ao ser esmagado, foi perdendo a confiança…não, não gosto de conviver com tal enormidade! Por isso, desejo firmemente que, a muito curto prazo, seja dado valor a quem o tem e que caiam, estrondosamente, os falsos ídolos.

A algazarra que ecoa por esse mundo fora, confundida com música, teatro ou cinema e a triste repetição de temas batidos e no entanto vistos como se fossem novos…ah, como desejo que a imaginação possa abrir-se para o mundo e mostrar às crianças, aos jovens e, enfim, a todos quantos vivem, que, para além destas teclas gastas, há todo um mundo de variações a desbravar e que dele devemos estar famintos. Sim, desejo ardentemente que possam emergir novas sinfonias neste pobre universo que temos e repete assustadoramente os mesmos motes, como se fossem a expressão do novo.

Desejo ainda uma nova fé. Não a das religiões ou a dos mitos ou a das ideologias – todas elas votadas ao fracasso, como resulta evidente – mas uma fé profunda nas pisadas que vamos dando no dia-a-dia, pisadas de carne, mas também de espírito, pisadas de vigor uníssono, como importa. E este desejo é, por si só, uma espécie de alínea do primeiro.

Para mim, como pessoa, desejo intensamente começar a ser. Desejo que o dia Um do próximo ano me ensine a renascer e que os meus actos falhados possam ser a condição das caminhadas certas. E eis aqui o momento de acertar agulhas com a responsabilidade, pois, ao formular este desejo íntimo e profundamente subjectivo – e ao fazê-lo em público –, começo, desde hoje, a sentir-me no dever de inventar as energias para subverter o meu caminho.

Subverter, é claro, é necessário subverter. E eu desejo poder realizar a suprema tarefa de me reinventar, mesmo que o mundo seja o mesmo e as pessoas e o tempo. Proíbo-me de ficar à espera que os tempos mudem, proíbo-me de lançar desculpas para o acaso ou para o destino, desejo ser senhora do meu próprio reino. É nele e apenas nele – no meu reino – que poderei fazer irromper a minha chama.

No meu círculo restrito desejo encontrar, acima de tudo, o nexo exacto das interacções humanas, ver com clareza o que devo fazer e de que me devo eximir – para abarcar todos e não me deixar afundar. É necessário que perceba a magnitude de todos os papéis que sou chamada a desempenhar e possa integrá-los, criadoramente, em mim.

Doze desejos?!

Paz no mundo? Solidariedade?! Fim da pobreza?! Sucesso pessoal?! Riqueza?! Felicidade?! Sonhos realizados?! Alegria de viver?! O fim da crise?! Um bom Presidente da República?! …até doze?!

Não, não me peçam que faça uma lista abstracta de sonhos, engendrados à pressa, enquanto as badaladas soam e trinco atabalhoadamente as doze passas. Desejar, realmente desejar, é estabelecer connosco mesmos um trato demasiado sério, para poder degustar-se, levianamente, num clima eufórico de festividades vãs.

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