sexta-feira, 11 de abril de 2014

INSTITUCIONALIZADOS


GABRIEL VILAS BOAS
DR
Enquanto tomava café, reparei numa pequena chamada na primeira página do Público: “Menos crianças, mas mais adolescentes acolhidos em instituições”. Li com mais atenção toda a notícia. Tratava apenas de fazer a leitura estatística dum relatório sobre crianças e jovens institucionalizados. Fria, objetiva, seca. Agora, há menos quatro mil institucionalizados que há sete anos. Só faltou escrever: mas que bom!

Ao ler o resto da notícia, percebe-se que não há nada de bom a assinalar. O número de pessoas sinalizadas aumentou em mais de mil casos, só num ano, e atinge quase os setenta mil. A maioria das crianças e jovens vivem em Centros de Acolhimento Temporário, porque não há famílias que as queiram acolher. Muitas crianças e jovens foram institucionalizados in extremis, ou seja,sãocrianças a quem não foram aplicadas medidas de promoção e proteção em meio natural de vida, antes da sua entrada no sistema.

As crianças institucionalizadas não são crianças felizes. Falta-lhes pais, afeto, referências, valores. A “Instituição” fornece-lhes um kit de sobrevivência: cama, saúde básica, comida, escola, regras de comportamento. Com prazo e data de validade. Aos dezoito anos têm de se fazer à vida. E eles fazem-se. Completamente desiludidos e descrentes. É angustiante enfrentar aqueles olhares completamente pobres de esperança. 

Não acho que o Estado possa fazer muito mais. Uma máquina burocrática não produz mães por decreto, não faz brotar pais duns tantos artigos duma lei qualquer. 

Sejamos realistas: eles precisam duma família a sério. Uma que os queira. Uma família que tenha amor para dar. E também abraços, carinhos, paciência. Um pai que os leve ao médico, um irmão que brinque com eles, uma mãe que se deite e adormeça à sua cabeceira quando a noite trouxer o medo e a angústia. 

A história destas crianças e jovens é triste e, na maioria dos casos, irrecuperável. Foram retirados aos progenitores para serem salvos. Mas uma criança ou um jovem não existe para sobreviver. Enquanto sociedade, não podemos aceitar isso. Eles têm de ser recolhidos pelas famílias existentes e integrados como membros de pleno direito num novo agregado familiar. 

E é claro que não os podemos escolher por catálogo. O bonito, o bem comportado, o que tem sucesso na escola… Nada disso! Eles são bonitos e feios, na maioria dos casos mal comportados e não tiram boas notas. Como os nossos! Precisam das mesmas coisas que os nossos. E não pode haver idade ideal. O ideal é um mito urbano amplamente derrotado pela realidade.

Não nos podemos ater a medos do género E se corre mal? Tem tudo para correr mal… Há tanta coisa que corre mal por culpa da nossa inação, do nosso medo, do nosso egoísmo, a que um pouco de arrojo, altruísmo e amor, nas nossas vidas não fazia mal nenhum.

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