sábado, 17 de dezembro de 2016

UM ROSTO DA DEMOCRACIA



MÓNICA AUGUSTO
Ao longo da semana foram surgindo as notícias sobre o débil estado de saúde de Mário Soares, que nos vão dando conta de que aos 92 anos a resistência continua a ser uma das suas características. Todos “conhecemos” Mário Soares, desde os mais velhos, e arriscaria mesmo a dizer, até aos mais novos e guardamos na memória a imagem do Presidente. Será certamente esta a imagem que mais se conserva, a de ter sido Presidente da República. Mas muito antes de exercer este cargo, a capacidade de resistência, que agora demonstra no que se refere à saúde e longevidade, já se fazia sentir. 

Mário Soares cumpriu recentemente o 92º aniversário, a 7 de dezembro, licenciou-se em Ciências Histórico-Filosóficas em 1951 e em Direito em 1957. Desde os seus tempos de estudante universitário se destacou na luta contra a ditadura salazarista tendo sido membro do Movimento de Unidade Nacional Anti-Fascista e do MUD – Movimento de Unidade Democrática, união entre diferentes correntes de oposição ao Estado Novo, republicanos, socialistas, alguns monárquicos, alguns católicos e militares descontentes, que pretendeu concorrer às eleições para a Assembleia Nacional de 1945. Soares foi também Secretario da Comissão Central da candidatura de General Norton de Matos à presidência da República em 1949, candidatura que representou uma importante oportunidade para derrubar o regime, mas que saiu gorada. Em 1958 pertenceu à Comissão da Candidatura do General Humberto Delgado à Presidência da República o “candidato independente” que ficou conhecido como “o General sem medo” e foi ainda advogado da família do General após a morte deste. Ao longo da sua carreira de advogado representou vários presos políticos detidos pelo regime fascista. Em 1965 foi candidato a deputado pela Oposição Democrática. Fruto da sua ação política e profissional, em 1968 foi deportado para S. Tomé. Mas em 1969, na “Primavera Marcelista” foi novamente candidato a deputado pela CEUD Comissão Eleitoral de Unidade Democrática, constituída por vários cidadãos ligados ao Partido Socialista, numas eleições que pareciam livres mas que novamente não respeitaram as regras democráticas. Em 1970 Mário Soares parte novamente para o exílio, desta feita em França, onde leciona no ensino superior. Em 1973 foi eleito Secretario Geral do Partido Socialista, partido também por ele fundado em 1969, cargo que exercerá durante 13 anos. 

Regressou a Portugal após o 25 de abril de 1974, no dia 28 do mesmo mês, naquele que ficou conhecido como “o comboio da liberdade”. Em 1976 com a vitória do Partido Socialista nas eleições legislativas, Mário Soares assume as funções de Primeiro-Ministro do I Governo Constitucional, cargo que ocupa novamente no II Governo Constitucional, liderando os destinos do país num momento de grave crise financeira, negoceia o programa de estabilização com o FMI. Entre 1983 e 1985 ocupa novamente o cargo de Primeiro-Ministro e prepara a adesão de Portugal à CEE. O processo iniciado em 1977, com o pedido de adesão culmina com a assinatura do Tratado de Adesão a 12 de junho de 1985, no Mosteiro dos Jerónimos, mais uma das imagens que muitos de nós teremos certamente em mente por constituir um marco fundamental na História de Portugal.

Em 1986 Soares candidata-se pela primeira vez à Presidência da República e vence, sendo reeleito em 1991. Defensor da ideia europeia e concretizador do sonho europeu, entre 1999 e 2004 é Deputado ao Parlamento Europeu. A sua carreira política ativa termina em 2006 quando concorre novamente à Presidência da República perdendo para Cavaco Silva.

Considerado por muitos “o pai da democracia portuguesa”, independentemente da ideologia político partidária, Mário Soares é uma figura marcante na História de Portugal Contemporâneo. O seu espírito de luta e resistência levaram-no ao exílio e à cadeia por várias vezes. Tendo sido reconhecido internacionalmente, é após o 25 de abril que Portugal lhe reconhece os méritos. Das várias imagens que a memória e a história vão eternizar ficam, entre outros, o regresso do exílio, a assinatura do Tratado de Adesão, o slogan “Soares é fixe” e o famoso debate com Álvaro Cunhal, marcado pela afirmação sublinhada do seu interlocutor “Olhe que não Sr. Doutor”, também ele um marco na resistência contra a opressão e a ditadura. 

Certamente todos os portugueses acompanham o estado de saúde do “Presidente Soares” relembrando o percurso singular do homem que deu e continua a dar rosto à liberdade e à democracia.

Bibliografia:
- www.fmsoares.pt – última consulta dezembro 2016
- www.presidencia.pt - última consulta dezembro 2016~
- Mattoso, José (1994): História de Portugal, 8º vol. Portugal em Transe. Lisboa: Círculo de Leitores.

- Vieira, Joaquim (2013): Mário Soares: uma vida. Lisboa: Esfera dos Livros.

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