terça-feira, 15 de novembro de 2016

DA DEMOCRACIA NA AMÉRICA E OUTROS ARRANJOS!

DANIELA FONSECA
Já muito foi escrito sobre o tema, pouco restando, por isso, ao cronista mais desatento, para ser esmiuçado. É com efeito uma das grandes perplexidades dos nossos tempos, esta coisa das eleições americanas. Não deixamos, porém, de receber os impactos das ondas de choque que o 9 de novembro trouxe aos EUA e ao resto do mundo. 

Arrotamos, com facilidade, meia-dúzia de chavões de progresso e de evolução dos tempos, quando se procura caracterizar a sociedade em que nos situamos. Os direitos civis — achamos nós — ficaram devidamente esclarecidos nas décadas de 60 e 70 do século passado. — Estamos um passo à frente —. E, todavia, é novamente a perplexidade que nos ocorre. — Não, não, meus amigos, estamos em rota decrescente! A civilização continua em modo avestruz: cabeça na areia. 

Pensávamos nós que questões como o racismo, a xenofobia, os ataques ambientais, a corrida ao armamento, entre outros, eram temas tratados na pasta do “nunca mais”; pois, na verdade, somos todos os filhos da liberdade e das diferentes liberdades que foram sendo conquistadas ao longo dos tempos. E eis-nos aqui! Novamente no processo de esmagamento social e político, orquestrado sabe-se lá bem por quem, prestes à hecatombe coletiva. 

A culpa não é do Trump, ou pelo menos, não é apenas dele: que fizeram as universidades? Que fizeram as elites? Que fizeram os sucessivos governos de aquém e d’além mar pelos valores universais que os constituem? Que foi feito da ética? Da meritocracia? E a União Europeia, esse colosso das boas intenções (de que o Inferno está claramente tão cheio): que foi feito dos princípios fundadores? 

Estão todos muito chocados com o Trump, com o Brexit, com a potencial LePen que se avizinha para a França, mas ocorre saber: que investimento foi feito na Educação? Que foi feito em prol dos europeus, do povo, das pessoas? — Ai agora a Nato é um problema? — Que estratégia global europeia foi efetivamente adotada em matéria de segurança? Pois é, aqui, como lá, andámos a brincar aos bonzinhos, quando na verdade, cresciam, daninhas, as sementes do mal. 

Depois os meios de comunicação social é que têm a culpa pelo balde de água fria! Mas aqui entre nós, se as sondagens oscilavam entre os dois candidatos, nos momentos finais da eleição, qual era a dúvida de que um dos dois podia seguramente ganhar? 

Os media americanos são enganadores e produziram o engodo global? — Devem ter, os media nacionais, muita moral para falar, depois do espetáculo Sexta às Nove, diretamente da toca do “alegado” lobo. Pois é: deontologia 0, infortainment 1. 

E para terminar, sob pena de realmente falar das eleições na América, coisa para a qual não estou habilitada, há realmente duas ou três questões que me chocam nos meios de comunicação social nacionais: que alguém coloque um programa de tarot no ar, logo pela manhã, quando a concorrência está a dar notícias sobre o país e sobre o mundo; que os jornais continuem a publicar os classificados de índole sexual a troco de dinheiro (há muitas formas de prostituição); e que o principal canal do Estado se tenha rendido a Bollywood, brindando-nos com um filme indiano todos os domingos na sessão da tarde. Não me interpretem mal, até gosto de algumas escolhas, mas questiono-me que critério de diversidade cultural estará a ser adotado, quando o próprio cinema português não consegue usufruir desse privilégio. 

Democracia na América: 0; Outros arranjos: 1!

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