sexta-feira, 30 de setembro de 2016

PRESERVATIVOS GRATUITOS NAS ESCOLAS?

MANUEL DAMAS
O grupo parlamentar do PS ocupou espaço de primeira página, recentemente, na Imprensa com um novo projeto lei, cuja primeira subscritora é a Deputada Inês Lamego, da Juventude Socialista, segundo o qual se pretende que o Governo promova a distribuição gratuita de métodos contracetivos nas escolas do ensino básico e secundário, medida já prevista desde 2009, no Decreto Lei aprovado à altura e que estabelece o regime de aplicação da Educação Sexual em meio escolar.

E, uma vez mais, ainda falta quase tudo fazer num País que não sabe, não consegue ou não quer, quando já deu mundos ao Mundo, fazer crescer-se a si próprio em Cidadania.

Voltamos, infelizmente, à vergonhosamente velha questão…a da Educação Sexual em Portugal. Até porque a mesma continua, desde 1984, vergonhosa e irresponsavelmente de remendo em remendo sem qualquer tipo de iniciativa estruturada, consolidada, sensata, refletida e acima de tudo geradora de avanços em termos de aprendizagem séria, consistente e credível em Sexualidades e Afectos, em prevenção de comportamentos de risco, em Igualdade de Género, em combate a todos os tipos de comportamento violento e/ou discriminatório nas relações psico afectivas, em controlo das gravidezes na adolescência ou não desejadas, em políticas de controlo de novos casos de HIV/SIDA ou sequer de controlo das outras Doenças Sexualmente Transmissíveis, apenas para citar as vertentes primordiais.

Pretende-se, acima de tudo, o cumprimento do binómio Informação/Formação mas também a desconstrução de estereótipos, a mudança de atitudes e o avanço e crescimento em Cidadania.

O que interessa distribuir preservativos na Escola gratuitamente se a relação dos adolescentes em Portugal com os métodos anticoncepcionais e em especial com o preservativo ainda é baseada no desconhecimento e falta de conceitos, no mito do suposto "incómodo prejudicial do prazer", na brincadeira ou no gozo por receio do desconhecido ou seja na total iliteracia no que às Sexualidades e aos Afetos se refere?

Continuo a afirmar que estas e outras questões só se alteram com a criação de uma disciplina de Educação Sexual, com um tronco comum de matérias e temas a abordar, lecionadas desde o Ensino Básico até ao Universitário e com aprofundamento dos temas, consoante a evolução da faixa etária.

Uma disciplina obrigatória e com avaliação.

Lecionada por Docentes com formação específica e voluntária, pós graduada, na área.

Até porque é nas mais jovens idades que se instalam os preconceitos, que se inculcam os estereótipos que se vão perpetuar pelo futuro.

E quanto mais cedo estes conhecimentos forem ministrados, menores serão os comportamentos de risco, menor será a atração pelo desconhecido/proibido, menos precoces serão as relações sexuais e mais informadas e responsáveis serão as decisões e as atitudes em Sexualidades e Afetos...assim o comprovam, à exaustão, os mais diversos estudos de avaliação efetuados nos numerosos países que têm a Educação Sexual (por vezes também designada Educação Sexual e Reprodutiva) instituída e no terreno.

Se necessário fosse provar algo basta citar que é às crianças que se diz, ainda hoje em Portugal, "Não se mexe aí que é sujo" ou "Não se mexe aí que é porco" assim se reproduzindo a noção errada de pudor, de sujo, de proibido, da vergonha e do pecado que até hoje ilustra a relação dos portugueses com as Sexualidades...

Não é preciso inventar...basta ouvir quem sabe.

CONVERSAS PRIVADAS COM... VIOLÊNCIA DOMÉSTICA

MANUELA VIEIRA DA SILVA
Relatos de acontecimentos jorrados em jornais em absorvente papel pardo, e nas notícias da Tv com imagens e pormenores da vida alheia, ocupam o espaço deixado vazio pela indiferença da própria vida, e pelos tantos afazeres, repetidas rotinas, teimosas algumas, que fazem o tempo parar para não pensar. Chuva miudinha calada desliza húmida na alma, através das paredes da razão, pintadas de bolor com aromas de malícia e perfídia. As partículas no tempo suspensas, aguardando a brisa, um sopro de deslocação que as levasse ao vento da clareza, decompuseram-se em notas compostas de múltiplas variações e o tempo da brisa jamais voltou. Tantas coisas que deveriam ter sido ditas, partilhadas, adivinhadas, e protegidas na brisa quente do amor, no íntimo, seguro e privado aconchego da família.

O centro do mundo está em cada um, no centro das emoções, no centro dos desejos, no centro da esperança de uma vida melhor, de ser melhor que o alheio, de ter mais e mais, tornando-se num infernal, obsessivo e único objectivo de vida. Tudo à volta gira em velocidade, sem a mínima percepção do invisível e do inaudível, porque não se vê, não se ouve, mas existe. E o que se vê existe porque lhe dão vida, existe pela simples necessidade de existir para alimentar, preencher o vazio crónico que está cheio de coisas vazias, que, por serem vazias, constantemente são substituídas por outras também vazias, e assim sucessivamente. Ocupam o espaço da razão, do entendimento, ocupam o espaço do afecto, da compreensão e do discernimento. Tudo isto impede o crescimento, a maturidade de homens e mulheres que hão-de gerar outros homens e outras mulheres.

Dou-me ao direito de reclamar a liberdade de me debruçar sobre este tão delicado assunto: a violência doméstica. Sempre houve, dizem uns, mas ficava dentro das portas e não se sabia. E quem o sabia, dizia: «Entre homem e mulher, não metas a colher.» E em silêncio, a mulher sofria, e os filhos assistiam. Estes filhos são hoje homens e mulheres que sofrem, perdidos no álcool, nas drogas, na luta da vida inóspita da sobrevivência entre o ser e o ter, entre o possuir e o viver. Mas também há os casos em que não presenciaram violência no seio familiar, onde, pelo contrário, houve educação, com mais ou menos abundância de bens materiais, onde nada ou quase nada faltou, ou ainda, os casos em que houve educação moral e/ou católica, embora vivendo numa situação remediada ou pobre. A violência doméstica percorre todos os extratos sociais e económicos. Será um absurdo social? 

Penso que, antigamente, estas situações surgiam, regra geral, devido ao ciúme alimentado pelo álcool, às traições, ou à falta de dinheiro. A sociedade era mais fechada, as mulheres, mais recatadas, e os homens assumiam o papel de patriarca, de mentalidade machista, cujo dever era dar segurança e alimento. E a vergonha aos olhos dos outros instalava-se, porque havia valores a proteger.

Hoje, os motivos serão os mesmos, mas há diferenças: hoje há mais liberdade e mais conhecimento, há o divórcio, «namoros» precoces de vida íntima em que tudo é aceitável e «normal». Rapazes e raparigas estudam até ao nível superior de forma igualitária, e até têm educação sexual. Vão ter preservativos nas escolas a partir dos 14 anos… Onde posso, então, encontrar semelhanças? Fico perplexa perante o número de mulheres assassinadas por violência doméstica, todos os anos a estatística a aumentar.

Muitas áreas sociais, familiares e políticas poderão estar envolvidas na causa e na solução deste problema, que não serão aqui esmiuçadas. Destaco apenas a mentalidade e a forma como estamos a criar os homens e as mulheres que constituem a sociedade. Se não é a falta de conhecimento, se não é a falta de liberdade, então só pode ser a falta de crescimento e de maturidade, que, prova-se, não é através do conhecimento e da liberdade que se consegue. Onde se aprende? Uma questão à qual muitos entendidos já deram resposta quanto à educação, uns dizem que é na escola, outros, que é no seio familiar, e ainda outros, que é de ambos os lados em simultâneo. Não cabe ao professor de Física ensinar valores sociais e morais, quanto a mim, nem qualquer outro professor de outras disciplinas, porque no meio de tantas disciplinas e cadeiras falta aquela que ensina a viver em sociedade. Mas também não é o viver em sociedade que está em causa, o que está em causa é a vida íntima entre casais, nas suas casas, ou entre namorados. 

Choca-me saber que meninos e meninas com 14 ou 15 anos andam em discotecas até às 6 da manhã. Choca-me saber que vão ser distrubuídos preservativos nas escolas para meninos e meninas a partir dos 14 anos. Qual é a moral? Onde querem os pais que os seus filhos cheguem ao autorizarem essas saídas? Onde quer o Estado chegar ao distribuir os preservativos? – Eles fazem na mesma, o melhor é protegerem-se para não engravidarem. – Isto é inverter totalmente a educação sexual. A educação sexual não pode ser dada sem as componentes de educação dos sentimentos, dos direitos e deveres, da educação na gestão emocional. As vontades gerem-se, controlam-se. O cérebro desenvolve-se na acção e no pensamento. Não é preciso fazer para conhecer. Antes de uma acção ser iniciada, no nosso íntimo, sabemos as suas consequências, em geral, positivas ou negativas. Se eu roubar, sei que me arrisco a ser apanhada. Porque é que a consciência demora a travar as acções? Poderá haver várias respostas, ou talvez apenas três: uma, ser débil mental, ou sofrer problemas do foro psíquico; outra, não ter qualquer valor de respeito por nada, nem por ninguém, por defeito; a última, estar sob o efeito do álcool ou de estupefacientes.

Em que sociedade vivemos nós? Em que seres humanos nos estamos a transformar, se «por dá cá aquela palha» recorremos ao álcool para ganhar coragem, ou para diminuir a tensão emocional? E em vez de termos a razão a funcionar quando ela mais é necessária, perdemos o sentido do outro, mergulhados num egocentrismo doentio. Os jovens de hoje (que vai até aos 35 anos, dizem) nasceram no pós-25 de Abril, com a adolescência nos anos 90, no boom económico em Portugal, em que os pais tudo davam aos filhos. Estes, por sua vez, cresceram com as vontades satisfeitas sem grande esforço, ao mesmo tempo que a revolução sexual se inicia de uma forma surpreendentemente indisciplinada, com todos os recursos visuais à disposição, sem qualquer acompanhamento. Não foram formados seres maduros para a vida, com a consciência aberta, preparados para as dificuldades, muito menos para uma recusa de um namorado ou namorada; para a traição, porque hoje a traição não tem o mesmo nome para quem trai, mas tem para quem é traído. Os sentimentos não são prioridade, basta uma paixoneta, ou uma atracção física superficial, para se assumir uma relação de casal, sem medir as consequências, sem medir o grau de afectos, sem deixar amadurecer coisa nenhuma. Vivem ao sabor do vento, ao que lhes dá prazer, ou adrenalina, perdendo-se na primeira dificuldade. 



Julgar depreende-se e está subjacente sentenciar, condenar outro ser humano a ser outro, que não ele próprio, perdendo a sua autodeterminação individual, e dando lugar ao aumento das diferenças. Dar ou tirar o direito à liberdade do outro é condenar a uma prisão sem ferros, é ficar refém de desejos, caprichos de outros, que, por sua vez, estão reféns de si próprios. A dignidade humana começa na acção de cada um pela sua própria libertação.

EDUCAÇÃO: IMPORTÂNCIA DO CONTEXTO FAMILIAR

JOÃO RAMOS
Para compreender melhor quais os factores que contribuem para o sucesso dos indivíduos, um investigador norte-americano seleccionou através de vários exames rigorosos, cerca de 730 crianças com idades entre os 5/7 anos sobredotadas ou com capacidades cognitivas acima da média. O seu percurso académico e profissional foi posteriormente analisado minuciosamente durante mais de duas décadas. Quando chegados à idade adulta, foram divididos em três grupos. Os 150 do topo ou integrados no grupo A obtiveram carreiras de sucesso formando-se em engenharia, medicina ou arquitectura, dos quais 90% haviam conseguido terminar o ensino superior com uma graduação. O grupo b, composto por 60% da amostra, foram classificados como registando uma trajectória satisfatória. Os 150 restantes com carreiras de baixas qualificações, como carteiros, seguranças ou porteiros foram incluídos no grupo C. Após comparar os níveis de saúde física, os interesses, os passatempos e de medir os seus QI´s, o único factor revelante encontrado pelo estudo foi o contexto familiar. Os pais do grupo A eram esmagadoramente provenientes das classes médias e média-alta (50% possuíam uma licenciatura), ao passo que os do grupo C pertenciam à outra margem, com famílias sem qualificações ou com menos de 8 anos de escolaridade. Mesmo nos estudos de avaliação de personalidade, os estudantes do grupo A evidenciaram sempre melhores resultados, apresentando-se mais atentos, interessados e participativos. O contexto familiar moldou-lhes o comportamento. Ao grupo C faltou uma comunidade de suporte, que lhe preparasse e estimulasse a sua carreira.

Esta investigação indica que, as reformas no sector da educação devem se concentrar no contexto familiar, através de uma maior participação da segurança social no apoio aos estudantes com famílias destruturadas. Além disso, desenvolvendo actividades extra curriculares de apoio a estas crianças, as escolas estariam a preencher uma importante função, que por várias razões os país são incapazes de compreender e assegurar.

quinta-feira, 29 de setembro de 2016

COMO ESCOLHER SAPATILHAS PARA CORRER?

ELISABETE RIBEIRO
Engana-se se pensa que as sapatilhas são todas iguais. Embora um único par possa ser utilizado para praticar uma variedade de desportos, a verdade é que não estará a obter a performance máxima se calçar, por exemplo, as sapatilhas que normalmente usa para jogar ténis para fazer uma sessão de corrida. Para poder correr comece pelas sapatilhas adequadas.

Analise um par antigo. A melhor forma de decidir quais as próximas sapatilhas de correr a adquirir é analisar um par antigo, ou seja, comece por colocar as sapatilhas lado a lado e determine o seguinte: se inclinarem para o meio, as suas novas sapatilhas necessitarão de maior estabilidade; se inclinarem para fora, as suas novas sapatilhas devem permitir uma maior absorção de choque. Agora, examine as biqueiras das sapatilhas velhas – consegue ver a forma de algum dos seus dedos? Recorda-se de algum desconforto nesta zona? Se respondeu sim a qualquer uma destas questões, recomenda-se que as sapatilhas novas sejam um tamanho acima e/ou mais largas. Agora, verifique o estado das solas para saber quais as zonas mais gastas – são estas que denunciam a forma como o seu pé pousa ao correr, o que significa que o próximo modelo deve ter algum suporte extra nestas áreas.

Loja especializada. Se correr é uma atividade que leva a sério, então a compra de umas sapatilhas para esse efeito deve ser igualmente ponderada. Para começar, desloque-se a uma loja de desporto especializada – isto porque para além de encontrar prateleiras e prateleiras de modelos, estas estarão organizadas por desporto, o que por si só já facilita a seleção. Adicionalmente, contará com o conhecimento de quem trabalha no mercado para determinar qual a melhor sapatilha para si. Se tiver um par de sapatilhas antigas, leve-as consigo.

Quantos quilómetros? Quanto mais tempo dedicar à corrida, melhor devem ser as sapatilhas a adquirir. Se é uma pessoa que corre todos os dias, ou quase, e que habitualmente participa em maratonas, então o investimento feito num bom par de sapatilhas será facilmente recuperado simplesmente porque sentirá a diferença, a vários níveis. Se começou recentemente ou pensa iniciar um programa de corrida, então a primeira aquisição de sapatilhas específicas para esta modalidade pode passar por um modelo mais básico que o ajudará a começar com o pé direito, mas das quais não se arrependerá no caso de desistir ou de querer melhorar o seu desempenho e adquirir um modelo superior.

Perfeitas nos pés. Para fazer uma escolha acertada no que toca a sapatilhas para correr, vá com tempo para a loja de desporto e, sem descurar nenhuma das dicas acima apresentadas, não tenha receio de experimentar todos os modelos disponíveis! Faça questão de manter cada sapatilha no pé durante alguns minutos, passeando e até correndo um pouco pela loja para perceber como é que as sapatilhas respondem ao movimento e qual a duração do seu conforto.

A adaptação. Escolhidas as sapatilhas, segue-se outra importante fase – a adaptação. Antes de as levar para a rua, ande com elas em casa, não só para começar a “quebrá-las”, mas para se certificar que escolheu, de facto, o melhor modelo para si. Na hora de começar a correr com as sapatilhas novas, faça-o sempre com meias e comece com pequenas distâncias para reduzir o risco de bolhas e outros desconfortos provocados por sapatos novos. Por este mesmo motivo, aconselha-se a nunca estrear umas sapatilhas numa prova ou maratona.

Uma revisão adequada. Independentemente do preço e do conforto, um par de sapatilhas não dura para sempre e, no momento em que começar a sentir que lhe apertam ou magoam os pés, estará na altura de voltar a investir. Se continuar a correr com sapatilhas que já tem há anos e que já viram melhores dias, o risco de lesão torna-se cada vez mais elevado. Quando em dúvida, siga a regra dos especialistas: troque as sapatilhas a cada 700 km.

Fonte: Atletismo

CRÓNICA DE VIAGEM # MADRID

ANABELA BORGES
(MUSEU RAINHA SOFIA)
Tínhamos atravessado imensidões de searas; horas e horas de campos de cultivo; todo um “alentejo”. Um cenário trémulo e amarelo, com ondas de calor no horizonte, atrapalhava os sentidos, a ponto de parecer exactamente que, ao fundo, observávamos o mar. Pura ilusão de óptica.

Entrámos em Madrid pela Porta de Alcalá, uma das cinco antigas portas reais que davam aceso à cidade.

Não há dúvidas de que Madrid se destaca pela grande oferta cultural e pelo convite a umas boas horas de ócio. Esses prenúncios podem manter-nos ocupados desde a primeira hora da manhã até de madrugada. Mas entre o início e o fim de um dia de descoberta por Madrid, abre-se todo um leque de possibilidades, tantas que o melhor é ir logo pensando em voltar lá.

Tal como temos vindo a fazer noutras viagens, optámos por andar a pé e de Metro. O que, diga-se de passagem, é uma excelente opção em Madrid, já que a cidade é plana e o Metro, a rolar nos trinques, é sempre a horinhas. Impecável!

Plazas e mais plazas:

Naquela que é considerada a praça central de Madrid, na Porta do Sol, fica o quilómetro zero – a teus pés –, uma placa que assinala o lugar exacto onde se cruzam as seis estradas radiais de Espanha.

Mas é impossível não visitar a mais icónica de todas as praças: a Plaza Mayor. É necessário parar para apreciar cada detalhe desta carismática praça. Os edifícios apresentam praticamente todos a mesma cor vermelho-escura, dispondo-se em forma quadrangular. Visita-se a praça carregada de História, a pensar em tudo o que já aconteceu ali: touradas, festas populares, autos de fé e incêndios. Rodeada de esplanadas, fazendo apanágio ao gosto que os espanhóis têm em desfrutar do ar livre, a Plaza Mayor reúne turistas, artistas de rua, bares e restaurantes.

D. QUIXOTE E SANCHO PANÇA
E estando na Plaza Mayor, torna-se imperativo fazer uma pausa para visitar o Mercado de San Miguel. Construído numa estrutura metálica, ao jeito do Mercado Ferreira Borges no Porto, este não é um lugar exclusivo para fazer compras, mas, antes, um ponto de encontro para tomar um café, provar vinho, comer petiscos, ou para desfrutar dos melhores produtos frescos do mercado. Um lugar muito interessante, a palpitar de gente, no coração da cidade.

Outro lugar de grande interesse e beleza é a Plaza de España, onde, com belíssimas estátuas, se homenageia Cervantes e suas maiores criações, Dom Quixote, Sancho Pança e Rocinante. Sem sombra de dúvidas, o triste fidalgo e o seu fiel escudeiro são as personagens mais fotografadas no monumento dedicado a Miguel Cervantes na Praça de Espanha.

Por la calle:

Fontes, parques, jardins, palácios, mosteiros, igrejas barrocas e sobretudo pequenos recantos cheios de encanto… Passear por Madrid é uma experiência única para conhecer os bairros carismáticos, lugares para nos sentirmos perdidos, no bom sentido, para encontrarmos lojas com séculos de história e ateliers de artesanato que dão cor e ânimo às ruas.

Fomos visitar os jardins e o Templo (egípcio) de Debod, lugar carregado de história, para relaxar durante uma tarde inteira, com a Serra de Guadarrama como fundo.

Passear no bairro La Latina, o mais famoso bairro de Madrid, o lugar perfeito para gastar as horas ociosas numa esplanada é excelente para relaxar e escapar ao ruído da cidade.

O famoso Bairro de Salamanca é uma autêntica passerelle de moda. Tanto na rua de Serrano como em todas as que a rodeiam, lojas de luxo, sapatarias, joalharias e grandes nomes do mundo da moda, nacionais e internacionais, exibem os seus sofisticados e inovadores produtos em montras que constituem uma verdadeira tentação ao mundo material(ista).

Passear e fazer compras na Gran Via é imperativo, tanto de dia como de noite. Muito agradável nas noites mornas de Verão. Os edifícios são belíssimos, de alto a baixo. É necessário ver com (c)alma.

Cultural Paseo del Prado:

Prado, Reina Sofía e Thyssen-Bornemisza formam o Triângulo das Artes em termos de museus, no Paseo del Prado. Qual é o mistério de “Las Meninas”? Não consegui desvendar. Mas garanto que, para apreciar as incógnitas e segredos que esconde a obra-prima de Velásquez, não me cansei dedicar uns largos minutos à observação d’ “As Meninas” no Museu do Prado. A viagem cultural aos três museus é uma saudável overdose de arte e cultura, permitindo-nos apreciar obras de artistas como Goya, Tiziano, Rafel, Rubens ou El Bosco, El Greco, Velázquez, Picasso, Dalí, Miró, passando por Bacon, Lucian Freud e muitos outros.

O muito bom deste passeio cultural é que existem grandes descontos e entradas gratuitas em muitos casos especiais. O que (passando a redundância) foi o meu caso e o das minhas filhas, eu, por ser docente, elas, por serem estudantes. Fantástico, não é?

Depois de tantos quilómetros de cultura, foi hora de lanchar: um café, uma bebida e uns churros.

BAIRRO DAS LETRAS
E é claro que não perdemos ocasião alguma (e foram várias) de cumprir com a deliciosa tradição de ir comer as tapas.

Um bairro especial: passeios literários, debaixo dos pés:

Se existe mesmo o anjo do amor…? Os versos de José Zorrila, autor de “Don Juan Tenorio”, acompanham os nossos passos pelo Bairro das Letras, com fragmentos de obras de grandes escritores como Cervantes, Quevedo ou Góngora, gravados no chão da rua.

Não há volta a dar: numa cidade como Madrid beleza e cultura estão por todo o lado. É mesmo importante olhar para o céu e para o chão.


Madrid fica aqui ao lado. A cada passo, hei-de lá voltar.

CUIDAR DOS OUTROS

MARIA AMORIM (esq.)
Cuidar é desde tempos remotos o papel principal dos Enfermeiros, nem sempre muito bem compreendido por toda a gente, e hoje apeteceu-me falar um pouco do contributo dos enfermeiros nos cuidados prestados às pessoas, e falar deste papel de ...gente que cuida de gente, como dizia o Frei Bernardo, meu professor há muitos anos. Para podermos chegar ao cuidar, convém pensarmos um pouco sobre o que é a saúde. A saúde tem muitas definições, segundo os autores que quisermos estudar, por exemplo segundo a OMS (organização mundial da saúde) será “um estado de completo bem-estar físico, mental e social e não apenas a ausência de doenças ou enfermidades” , apesar de ser um conceito amplo de saúde, poderá apresentar-se uma meta um pouco irrealista para quem promove a saúde, pois muito dificilmente alguém terá sempre esse estado de bem-estar completo e total, então será que poderemos dizer que está doente? No dicionário Petit Larousse a saúde é defendia como “o estado daquele que está bem, que se sente bem” e, se eu questionar alguém sobre o que é saúde, com certeza irei obter respostas muitos variadas pois saúde pode querer dizer coisas diferentes para diferentes pessoas. 

A saúde é sobretudo um estado positivo de bem-estar e desenvolvimento pessoal relativo a saúde física, equilíbrio mental e vida social que cada pessoa vivência dia a dia, sendo muito importante que, quando precisa de cuidados, quem cuida tenha presente alguns pontos tais como : o que quer dizer saúde para a pessoa que está a cuidar, como é que ela valoriza a saúde, e as suas crenças e atitudes estão a ser consideradas? Há que ter em conta que a pessoa é um ser integral com toda um historial de vida e experiências que contribuem para o seu estado de saúde que é um processo de adaptação, um estado dinâmico em permanente transformação e em constante evolução, pois o ser humano, face aos múltiplos agentes de stress tenta manter o equilíbrio e satisfazer as suas necessidades, o que torna a saúde num estado de equilíbrio constante, sendo que o equilibrio perfeito é difícil de conservar, pelo que podemos considerar que a saúde se situa num determinado ponto de um percurso que visa o bem-estar ótimo, possível naquele ponto. 

O bem-estar perfeito para todos é difícil de alcançar, mas pode-se combater a doença ou a invalidez e promover em cada pessoa um estado saudável que, tendo em conta a sua idade, lhe permita dedicar-se a um nível normal de actividades físicas, mentais e sociais. 

Os profissionais de saúde intervêm quando é necessário, a diversos níveis, na promoção da saúde, na prevenção da doença e no restabelecimento possível quando há uma rotura no estado de saúde das pessoas.

Cuidar é uma arte, a arte do terapeuta que consegue combinar destreza, saber-ser e intuição para ajudar alguém na sua situação particular de doença. A missão essencial dos vários profissionais do cuidar é servir-se dos conhecimentos estabelecidos para todos com o intuito de prestar cuidados a uma pessoa única.

QUE PAPEL É RESERVADO AO ENFERMEIRO?

O Enfermeiro é, por excelência o profissional do cuidar pois cuidar, segundo Watson (Enfermeira) …constitui o eixo central da prática de enfermagem e é mais do que uma prática orientada para a realização de tarefas, compreende aspectos de saúde, como a relação enfermeiro/doente… 

CUIDAR consiste numa relação enfermeiro/doente baseada num processo dinâmico de conhecimentos, que só tem sentido quando for uma relação efectiva de ajuda, o que implica: conhecimento de si e conhecimento do outro, pois só consegue ajudar o outro quem se conhece realmente a si. O conhecimento de si é fundamental para que o enfermeiro saiba que atitudes e habilidades possui e quais as que precisa de desenvolver, só depois pode partir para o conhecimento do outro, sem preconceitos, sem ideias feitas, à procura daquilo que ele naquele momento necessita para manter a saúde ou fazer face à doença e recuperar o controlo da sua vida.

Este conhecimento permite o desenvolvimento das competências relacionais, que forçosamente têm de estar aliadas a competências técnicas, que permitem o prestar dos cuidados físicos.

Os Cuidados de Enfermagem consistem no estabelecer de uma relação interpessoal Enfermeiro/Pessoa e Enfermeiro/Grupo, numa parceria estabelecida com o doente, no respeito pelas suas capacidades e na valorização do seu papel, na promoção dos projectos de saúde de cada pessoa;

Existem dois tipos de intervenções de enfermagem:

- as iniciadas por outros técnicos da equipa, chamadas intervenções interdependentes, em que a prescrição parte de outro profissional, cabendo ao enfermeiro a responsabilidade pela implementação - as iniciadas pela prescrição do enfermeiro, que são intervenções autónomas cabendo-lhe a responsabilidade pela prescrição e pela implementação Os cuidados significam essencialmente coisas diferentes para pessoas diferentes.

CARACTERÍSTICAS DOS CUIDADOS

• Prestar atenção à pessoa inteira com tudo o que a caracteriza • Considerar o ambiente humano e físico no qual a pessoa se desenvolve • Ajudar a pessoa a identificar o que lhe causa problemas e a impede de se desenvolver e de se actualizar no sentido da sua natureza • Identificar a forma como a pessoa toma conta de si mesma na vida diária e, consoante o seu estado de saúde, auxiliá-la no que for necessário • Ajudar a pessoa a reconhecer e utilizar todos os sinais que o seu organismo lhe fornece sobre a sua saúde para prevenir ou tratar a doença …“tudo o que resta da capacidade de vida pode e exige ser constantemente mobilizado - e isto até ao limiar da morte – a fim de que as energias vitais prevaleçam sobre os obstáculos à vida” (Collière)

Em instituição, a relação Enfermeiro/doente, revela-se, frequentemente, ser uma questão de sobrevivência, pois, na maioria das vezes é a presença constante do Enfermeiro que conforta e dá coragem, e incute na pessoa doente a vontade de manter contacto com os outros e com a vida. Ser Enfermeiro ainda é ...fazer pelo outro o que ele faria, se pudesse, quisesse ou soubesse...

E, no momento da morte, quando muitas vezes todos os outros se foram, é ainda o Enfermeiro que permanece...

O FUTURO PRÓXIMO DOS EUA

LUÍSA VAZ
Tivemos oportunidade de, na madrugada da última segunda-feira, assistir ao primeiro confronto político entre Hillary Clinton e Donald Trump em directo para cerca de 80 milhões de pessoas. Pretendia-se com este debate que os intervenientes apresentassem as suas propostas, medidas e ideias para a Presidência que ora disputam.

Ao assistir ao debate, consegui aperceber-me dos ataques directos à pessoa de Donald Trump por parte de Hillary Clinton. Trump que se tem apresentado durante todo este processo como alguém “ sem papas na língua”, que se dirigiu de forma muito dura a aspectos bastante fracturantes no país e no Mundo, vem agora apresentar um discurso mais comedido e nota-se que encaixa sem fazer grande barulho bastantes ataques à sua índole por parte da Sra. Clinton.

O que me espantou no entanto e tendo a Sra. Clinton sido Primeira-Dama, Senadora e Secretária de Estado, tenha optado por jogar em antecipação no jogo que Donald Trump tão bem conhece em vez de usar a sua experiencia política para o “ encostar às cordas” com projectos políticos sólidos. Tentar apenas denegrir Trump, aflorando somente questões tão importantes como a Economia e o seu desenvolvimento, a Segurança Social e o Emprego e outras questões de política interna e externa nas quais deveria ter um plano traçado e ideias bem definidas optando por confrontá-lo em posicionamentos racistas e xenófobos ficou aquém das minhas expectativas.

Trump teve, segundo o que disse no debate, um apoio avultado do seu pai para iniciar o seu império. Estará agora falido e resiste a mostrar a sua declaração de IRS às finanças norte-americanas, isto de acordo com as declarações de Hillary e que o próprio não desmentiu. Tudo isto pretende demonstrar as intenções de Trump que culminam na sua candidatura e alertar os norte-americanos do perigo que seria elegê-lo, ele que apresentava um confortável empate técnico face a Hillary antes do debate que as mais importantes agências noticiosas dizem que ela ganhou.

Mas e as ideias? E os projectos? Tudo isso ficou por debater. Tudo o que era o mais importante, tudo bem que um público de 80 milhões de potenciais votantes seria a oportunidade perfeita para desmistificar a pseudo-frontalidade e patriotismo de Trump mas deveria servir também para que esses mesmos eleitores ficassem esclarecidos quanto à forma como cada um dos candidatos pretenderia usar a sua influência enquanto futuro/a Presidente dos Estados Unidos e isso ficamos sem saber.

Foi portanto um debate sem ideias, sem projectos e que visou apenas o ataque à honra. Se Trump se tem posto a jeito com as várias posturas públicas que tem assumido e discursos que tem proferido? Sim, de facto tem e demonstrou que seria perigoso dar-lhe tanto Poder.Poderia a sua experiência empresarial ser benéfica no desempenho do cargo? Seria uma gota no oceano do que são as responsabilidades maioritariamente diplomáticas do Presidente da nação mais poderosa do Mundo.

Poderia Hillary ter ido mais longe e elevado o debate ao verdadeiro confronto político demonstrando tudo o que aprendeu nos últimos 30 anos? Sem dúvida, exigia-se mais honestidade intelectual à candidata que deveria ter aproveitado esta oportunidade para demonstrar que é a pessoa mais qualificada para o cargo.

Pese embora todos os escândalos que sempre a acompanharam aos quais se junta este último dos “e-mails desaparecidos”, era de esperar que ela tivesse maior jogo de cintura e pudesse recorrer à experiencia de Estado e de gabinete para demonstrar que vontade só não chega, que falta de educação não é frontalidade e que experiência empresarial não é suficiente quando se pretende governar um país com as idiossincrasias dos Estados Unidos.
Na minha opinião e de acordo com tudo o que tem sido dito e escrito, Hillary Clinton é o mal menor mas sem dúvida que acredito que os Partidos norte-americanos tinham assets de maior valor para apresentar a estas eleições.
Teremos que esperar para ver quem ganha mas uma certeza já temos neste momento: mais uma vez não vão ganhar as ideias e os projectos. Mais uma vez os problemas que a América atravessa vão ficar na sua grande maioria sem resposta e quem vai ganhar será a pessoa que conseguir conquistar a confiança dos americanos.

Que seja uma escolha feita em consciência e não uma que nos traga consequências nefastas a todos.

quarta-feira, 28 de setembro de 2016

OS RICOS PODEM PAGAR MAIS OU NÃO?

MIGUEL TEIXEIRA
No passado dia 25 de Setembro, o “insuspeito” Paulo Baldaia , um comentador que está longe de poder ser considerado um “ perigoso esquerdista”, (uma semana depois da sociedade portuguesa ter debatido um suposto imposto sobre o património imobiliário em 2017, que poderá afetar em cerca de 1%, os 1% mais ricos (8143 contribuintes, com património para cima de 1 milhão de euros) escreveu no Diário de Notícias um interessante artigo de opinião em que procura encontrar uma resposta para esta pergunta: “Os ricos podem pagar mais ou não?”

Na reflexão constante do artigo, Baldaia refere: “Não vejo nas palavras de Mariana Mortágua o perigo de um regresso a um socialismo contra os ricos. Não percebo esse medo e não percebo que gere tanta confusão uma proposta que visa apenas um por cento dos contribuintes. Não é preciso ser de esquerda, e menos ainda da extrema-esquerda, para saber que a crise afetou mais as classes de baixos rendimentos e menos os de maiores rendimentos. Mas não fiquemos apenas pelo que nos parece, olhemos para o recente estudo da Fundação Francisco Manuel dos Santos, que nos diz que, durante a crise, "os 10% mais pobres perderam 25% do rendimento, enquanto os 10% mais ricos apenas perderam 13%". E mais à frente: “Não é ser de esquerda, nem de direita defender mais justiça fiscal. Os mais ricos podem pagar mais ou não podem? O estudo que revela que os mais pobres perderam 25% do rendimento e os mais ricos apenas 13% sugere que sim. Mas o que sabemos é que os contribuintes de maiores rendimentos vão ganhar mais no próximo ano, com o fim da sobretaxa. Não é demagogia, ordenados brutos superiores a dez mil euros vão recuperar mais de 500 euros líquidos, o equivalente ao ordenado mínimo que é pago a 600 mil portugueses. Não há ninguém disponível para se indignar com esta realidade com metade da força com que muitos se indignaram com o novo imposto de um por cento para um por cento dos contribuintes?”

Meditando nas palavras de Baldaia e na sua conclusão óbvia, ocorre-me uma entrevista do ex. Diretor Geral dos Impostos, José Azevedo Pereira, à SIC/Notícias (a memória da Internet é tramada) onde a dado passo esclarece que “em 2014, quando saiu da Autoridade Tributária (depois de sete anos à frente do organismo”, uma equipa especial por si chefiada tinha identificado cerca de 1.000 famílias ricas – os chamados "high net worth individuals" – que, por definição, acumulavam 25 milhões de euros de património ou, alternativamente, recebiam 5 milhões de euros de rendimento por ano” e rematava: "em qualquer país que leva os impostos a sério", este grupo de privilegiados garante habitualmente cerca de 25% da receita do IRS do ano. Por cá, os nossos multimilionários apenas asseguravam 0,5% do total de imposto pessoal. Ou seja, como refere Elisabete Miranda em artigo no Jornal de Negócios no passado dia 12 de Setembro, denominado “as 1000 famílias que mandam nisto tudo e não pagam impostos”, “como estamos em Portugal, onde estas coisas da igualdade perante a lei e a equidade tributária são aplicadas com alguma flexibilidade, os "multimilionários" pagam 500 vezes menos do que seria suposto”. Sem nunca se querer comprometer muito, na mesma entrevista, o ex. Diretor Geral dos Impostos (que agora pode falar porque saiu) descreve que, em Portugal como no resto do mundo, estamos perante grupos de cidadãos que têm acesso fácil aos decisores políticos e grande capacidade de influenciar a feitura das leis. Mas se, como assinala e bem, este não é um fenómeno exclusivamente nacional, e lá por fora os ricos sempre vão pagando mais impostos, presume-se que em Portugal a permeabilidade dos nossos governantes e deputados tem sido bem maior (conclusão nossa). A situação não é uma fatalidade, pode remediar-se "desde que haja vontade política", sendo certo que o grupo de funcionários do Fisco que estava a trabalhar neste tema até 2014 foi entretanto desmantelado (palavras de Azevedo Pereira). Em conclusão, quando se sabe que há 1,6% de portugueses que têm rendimentos anuais entre 40 mil e 80 mil euros e 0,2% de portugueses com um rendimento anual para cima de 80 mil euros, quando se percebe que neste último estrato de portugueses “há 1.000 famílias ricas – palavras de Azevedo Pereira - os chamados "high net worth individuals" – que, por definição, acumulam 25 milhões de euros de património ou, alternativamente, recebiam 5 milhões de euros de rendimento por ano” é justo e razoável pedir a estes nossos compatriotas, que por uma questão de Justiça e equidade fiscal , possam abdicar apenas um “bocadinho”, “uma percentagenzinha de 1% de aumento de imposto sobre o muito que possuem em termos de património imobiliário, (não será pedir muito penso eu) para que o governo possa redistribuir pelos que menos têm, aumentando as pensões mínimas na proposta de Orçamento Geral do Estado para 2017.

NOVAMENTE, OS PROGRAMAS DE TALENTOS…

PAULO SANTOS SILVA
O tema já não é novo e já foi aqui abordado nestas páginas. Também já vem com algum atraso, relativamente ao “acontecimento” que despoletou esta crónica, mas valores mais altos se levantaram, relativamente ao tema da crónica anterior. 

Na altura, questionei os leitores se estes programas seriam um princípio, um meio ou um fim. Hoje, a abordagem será mais contextualizada num programa em concreto, que neste momento passa na nossa televisão pública. Estou a falar, obviamente, do “The Voice Portugal”.

Qual foi, então, o “acontecimento” que despoletou esta crónica e quais as questões que me suscitou?

O “acontecimento” foi a interpretação de uma Ave Maria de Caccini. Surge, logo aqui, o primeiro grande reparo. A produção de um programa deste tipo, não pode cometer um erro de palmatória como o de inserir como autor do tema, um “tal” de Caccine. Uma pesquisa básica e rápida no Google, demonstraria facilmente que tal compositor não existe. Falha grave.

Posto isto, a principal questão que a interpretação da concorrente me suscitou foi, muito simplesmente, até onde é que a liberdade interpretativa pode ir num tema como este. Será que pode ser interpretado em qualquer estilo, tendo como único limite a vontade do cantor em mostrar o máximo de dotes vocais no pouco tempo de que dispõe, tentado que se vire uma cadeira que seja?

Na minha modesta e pessoal opinião, não. Claramente que não. 

Giulio Caccini, foi um compositor que viveu entre 1551 e 1618, ou seja, em pleno Renascimento. Mas Bach, expoente máximo do período Barroco, funciona lindamente interpretado de uma forma “jazzística” ou misturado com ritmos africanos (pesquise no Youtube por Lambarena…). É verdade, mas a questão não esteve no estilo, esteve no caráter. Uma Ave Maria, como cântico religioso que é em honra de Nossa Senhora, não pode ser interpretado aos “berros”, como na minha opinião foi. Ainda que pudesse não ser cantado de forma lírica, deveria ter respeitado a essência da música e da sua mensagem.

Pior do que isso, foi perceber que para os jurados tudo isto foi absolutamente irrelevante, uma vez que alguns carregaram no botão para virar a cadeira, o que se por um lado, confirmo as minhas suspeitas de que pouco ou nada entendem do que estão ali a fazer (basta ouvir os “chavões” que alguns utilizam sistematicamente nas apreciações que fazem…), em relação a outros a quem reconhecia algum mérito e conhecimentos musicais, me dececionou.

Valha-nos, no entanto, que as alternativas nos canais generalistas a este programa se resumem a novelas ou reality shows onde se revelam segredos de malta que, aparentemente, só tem dois neurónios e um deles já deixou de funcionar há algum tempo!... 

Bendita RTP2 e todos os outros canais das operadoras por cabo, fibra e satélite!!!

No caso de ter ficado curioso relativamente ao tema, deixo-lhe um link para o ouvir numa interpretação “à séria”, de entre as muitas que felizmente se podem encontrar.


SER FARMACÊUTICA, UMA PAIXÃO SEM REMÉDIO

CRÓNICA DE VERA PINTO
Filhos de Cláudio Galeno, os farmacêuticos são os profissionais de saúde que fazem parte do dia a dia de uma comunidade. Ir à farmácia aviar a receita, passar na farmácia para medir a tensão arterial, deslocar-se à farmácia na busca de um conselho farmacêutico ou simplesmente para saber as últimas novidades em saúde são hábitos quase tão banais como ir ao supermercado. Por se tratar de algo tão comum tende muitas vezes a ser desvalorizado. Esquecemo-nos que estamos a entrar num espaço de saúde e que temos à nossa frente profissionais altamente capazes de melhorar a nossa qualidade de vida e, não apenas aquele profissional que se limita a dispensar “caixinhas” e nos nega um antibiótico sem prescrição médica. É de uma injustiça tremenda reduzir a profissão a este nível, pois na verdade vai muito além disso.

A farmácia tem feito parte da vida humana desde o começo da humanidade. Já no período pré-histórico, as pessoas colhiam plantas com propósitos medicinais. As curas eram alcançadas através dos conhecimentos práticos do quotidiano, e as doenças tinham explicações místicas. O desenvolvimento, manipulação e dispensação de fármacos constituem as tarefas mais antigas atribuídas aos farmacêuticos. Daí serem muitas vezes apelidados de “mestres dos medicamentos”. Atualmente, o trabalho farmacêutico foca as necessidades do doente, por isso é emergente consciencializar a sociedade que o medicamento enquanto produto farmacêutico é direcionado para um paciente específico, com a preocupação de que os riscos inerentes à utilização deste produto sejam minimizados.

“Tão importante quanto conhecer a doença que o homem tem, é conhecer o homem que tem a doença” Osler

Chamamos a isto personalização da terapêutica. O melhor conhecimento das patologias,das alergias, e mesmo de eventuais reações adversas que o utente tenha apresentado, garante uma maior segurança no momento da dispensa com um aconselhamento direcionado para as necessidades específicas de cada doente e contribui para uma maior efetividade da terapêutica.Garantir a qualidade e a eficácia do medicamento, orientar o doente quanto ao uso correto do mesmo, promover a adesão à terapêutica e prevenir efeitos adversos ou interações medicamentosas é educar a sociedade, é promover saúde, é compromisso farmacêutico.

“O papel do Farmacêutico no mundo é tão nobre quão vital. O Farmacêutico representa o órgão de ligação entre a medicina e a humanidade sofredora. É o atento guardião do arsenal de armas com que o Médico dá combate às doenças. É quem atende às requisições a qualquer hora do dia ou da noite. O lema do Farmacêutico é o mesmo do soldado: servir.
Um serve à pátria; outro serve à humanidade, sem nenhuma discriminação de cor ou raça. O Farmacêutico é um verdadeiro cidadão do mundo. Porque por maiores que sejam a vaidade e o orgulho dos homens, a doença os abate - e é então que o Farmacêutico os vê. O orgulho humano pode enganar todas as criaturas: não engana ao Farmacêutico. O Farmacêutico sorri filosoficamente no fundo do seu laboratório, ao aviar uma receita, porque diante das drogas que manipula não há distinção nenhuma entre o fígado de um Rothschild e o do pobre negro da roça que vem comprar 50 centavos de maná e sene." Monteiro Lobato

No passado dia 26 de setembro assinalou-se mais um dia Nacional dos Farmacêuticos e como membro desta classe não podia deixar passar esta data em branco. Esta é portanto, a minha forma de prestar homenagem aos profissionais altamente qualificados, dotado de conhecimento técnico/científico e habilidades que contribuem para o bem-estar da sociedade. Os farmacêuticos continuam a ocupar os lugares do pódio entre as profissões que as pessoas mais confiam e estes dados só nos podem deixar orgulhosos e motivados a desempenhar eficazmente o nosso papel de educador/cuidador da população. Por tudo isto, só me resta dizer um “Muito obrigada”

AS REGIONAIS ESPANHOLAS E O PSOE

RUI SANTOS
A Galiza e o País Basco escolheram no passado domingo os respectivos parlamentos regionais. Estas eleições podem ser vistas como a resposta dos eleitores não só à forma como as suas regiões estão a ser governadas, como também ao actual impasse político do Estado espanhol. Os socialistas foram os grandes derrotados das regionais galegas e bascas. Foi sem margem para dúvidas o partido que mais votos perdeu relativamente às eleições anteriores realizadas em 2012.

Na Galiza, tal como as sondagens previam, o Partido Popular (PP) venceu com maioria absoluta ao eleger 41 deputados (em 75), mais 3 que o necessário para governar em maioria. Alberto Núñez Feijóo, o líder reconduzido nos destinos da Galiza, foi o grande vencedor das eleições. No cargo desde 2009, Núñez Feijóo já anunciou que este será o seu último mandato e já se fala que poderá suceder a Mariano Rajoy, um outro galego, à frente do PP espanhol. Não terá sido por acaso que Núñez Feijóo se distanciou de Rajoy durante toda a campanha, não querendo aparecer ao lado do líder do governo espanhol. Com certeza que esta atitude não foi tomada levianamente. A coligação En Marea (Podemos, Esquerda Unida, Anova e vários movimentos de cidadãos) elegeu 14 deputados, os mesmos que o Partido Socialista da Galiza (PSdG), o braço galego do Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE), mas este obteve menos 17 mil votos que a En Marea. O Bloco Nacionalista Galego concorreu coligado com a Federación Obreira Galega e o Partido Comunista do Pobo Galego, sob a sigla BNG-NÒS, e elegeu 6 deputados.

Relativamente às eleições regionais de 2012, o PP manteve o mesmo número de deputados, a votação da En Marea manteve os eleitores da força política que a antecedeu – AGE – e foi buscar votos ao PSOE e ao BNG.

As sondagens atribuíam a vitória no País Basco aos conservadores nacionalistas moderados do Partido Nacionalista Basco (PNV) e o mesmo veio a acontecer. O PNV elegeu 29 deputados (em 75), mais 2 do que em 2012. Em segundo lugar ficou a coligação EH Bildu (composta por vários partidos de esquerda e independentistas) com 17 deputados, menos 4 que os conquistados em 2012. Depois de ter vencido no País Basco as eleições legislativas de 26 de Junho, o Podemos surgiu coligado sob a designação Elkarrekin Podemos (Podemos, Ezker Anitza e Equo) e obteve 11 deputados. Como não existe histórico de participação anterior em eleições regionais, a comparação face às últimas eleições tem de ser feita recorrendo às legislativas de Junho. Sendo assim, o Podemos perdeu 177 mil votos no País Basco. Enquanto isso, o PSE-EE (socialistas bascos; designação pela qual concorre o PSOE nas eleições no País Basco) elegeu 9 deputados quando em 2012 tinha eleito 16 deputados. Foi a força política mais penalizada pelos eleitores bascos. O PP ficou-se pela quinta posição também com 9 deputados – perdeu 1 relativamente às eleições de 2012 – e menos 17 mil votos que o PSOE. A abstenção foi de 37.74%. em 2012 foi de 34.17%

A vitória de Núñez Feijóo consagra-o como politicamente e dá ânimo a Mariano Rajoy que luta para reabilitar a sua imagem junto do eleitorado espanhol, capitalizando para si a vitória do PP galego. Resta saber se os processos judiciais em curso contra dirigentes do PP, alegadamente envolvidos em casos de corrupção, irão estragar o plano de Rajoy para ampliar o seu eleitorado.

A situação dos socialistas na Galiza é terrível para o PSOE espanhol. Sem militância activa por parte dos seus membros e ultrapassado em número de votos pela coligação En Marea. No País Basco a situação não é muito diferente. Desde 2009 que o PSOE tem visto grande parte do seu eleitorado fugir para o EH Bildu.

Todos estes factos mostram a crise que o PSOE atravessa. Pode-se falar numa «pasokização» do PSOE? Este é um desafio que Pedro Sánchez tem pela frente: estancar a perda de eleitorado para partidos à sua esquerda. E se o PSOE perde eleitores para partidos à sua esquerda, não consegue atrair eleitores vindos do centro.

Por sua vez, a situação do Podemos é diferente. Pablo Iglesias, o seu líder, elogiou a ascensão do partido na Galiza e no País Basco. Utilizando o Twitter, afirmou que a coligação galega En Marea se tinha transformado na «primeira força da oposição» naquela região espanhola, ao passo que no País Basco o Podemos é «a primeira força de âmbito estatal», atrás do PNV e do EH Bildu, mas à frente dos socialistas e dos populares. Pode-se dizer que muita da comunicação realizada pelo Podemos gira em torno do fim do bipartidarismo espanhol e tem cativado eleitores descontentes com os partidos mais «tradicionais».

Espanha já teve duas eleições gerais e vai a caminho de uma terceira no espaço de 1 ano. Se a situação não for debloqueada até 31 de outubro próximo, o rei Felipe VI terá de dissolver o parlamento nacional e convocar novas eleições.

Perante os resultados na Galiza e no País Basco, o PSOE vê a sua posição enfraquecida junto do eleitorado e dos dirigentes de outros partidos, incluindo aqueles com quem, hipoteticamente, poderia coligar-se. Agora, Pedro Sánchez, pede ao partido umas eleições primárias para obter um voto de confiança junto dos seus militantes e apoiantes. Tal acto eleitoral deverá ocorrer dia 23 de Outubro mas antes terá que ser aprovada pela direcção socialista numa reunião a ter lugar no próximo sábado.

Sánchez esta muito desgastado junto dos líderes regionais que veriam com bons olhos uma mudança na direcção do PSOE. Pela primeira vez, assume que a sua liderança é questionada no seio do partido e que existem diferenças entre os militantes sobre qual o projecto político que deve ser apresentado pelo PSOE. Contudo, o tempo que vai de 23 a 31 de Outubro é curto para que Sánchez consiga encontrar parceiros para oferecer uma alternativa de governo a Espanha.

Os espanhóis anseiam por um governo e o PSOE, caso persista na sua posição, poderá pagar caro a sua teimosia ao opor-se a um governo do PP, ou liderado pelos populares. Após as eleições de Dezembro de 2015 era natural que o PSOE procurasse uma solução «à portuguesa», isto é, mesmo perdendo as eleições poderia encontrar parceiros políticos que viabilizassem o seu governo. Contudo isso não se verificou. A mesma situação foi criada no escrutínio de Junho deste ano. O PSOE não vence as eleições nem consegue arranjar apoio parlamentar junto de outras forças partidárias. Sánchez faz lembrar um menino mimado que só brinca com os outros se puder escolher o brinquedo que quiser. Parece-me difícil, para não dizer impossível que Sánchez consiga uma solução até 31 de Outubro e só lhe restará abster-se quando um governo liderado pelo PP, mais que provável vencedor de umas novas eleições, for sujeito a aprovação no parlamento espanhol. Caso contrário, poderá ser o fim da sua liderança. O PSOE não ganha as eleições, não forma governo com o PP e não consegue coligar-se com outros partidos políticos para viabilizarem um governo socialista. Sánchez ainda não percebeu que a sua teimosia fará com que cada vez mais socialistas espanhóis passem a votar Podemos, entrando o PSOE num caminho idêntico ao do grego PASOK que foi «devorado» pelo Syriza. É preciso saber perder e por os interesses do país à frente dos interesses partidários e Pedro Sánchez, com toda a sua arrogância e vaidade, não o sabe fazer.

terça-feira, 27 de setembro de 2016

LES AMIS QUI VOUS CHERCHERAIENT?

Considérer quelqu'un comme ami est être à l'aise pour partager tous nos défauts, nos qualités, avoir une certaine vision des choses pour fonder des liens , mettre en avant notre altruisme et être présent dans tous les moments.

Qui n'a jamais été déçu avec un ami ? Selon Publius Syrus "La prospérité fait abonder les amis. L'adversité les jauge et les passe au tamis".

ANUNCIADA CARAMELO
En plein siècle XXI, avec les réseaux sociaux , beaucoup de personnes disent avoir beaucoup d'amis, pourtant il y a eu un temps ou l'on pouvait compter les amis par les doigts des mains.Il est évident que personne n'a autant d'amis comme on peut voir dans les réseaux sociaux.

Une vraie amitié est soutenue par des valeurs telles que la loyauté , le partage , l'honnêteté , le respect et le soutien inconditionnel.Le statut, financier, sentimental ou altérations de la santé, tous ces états aléatoires ne doivent pas influencer l’opinion d’une personne se disant proche de vous.
Ami nous amène à ceux avec lesquels nous avons une relation , affection pure et désintéressée personnelle, quelqu'un qui est en effet concerné par votre réussite, un ami est une personne qui n’a pas « besoin » de vous matériellement, c’est une personne à qui on peut tout dire sans crainte d’être jugé ou catégorisé.

Certains traits de notre caractère sont présents dans nos amis et nous rapprochent d'eux au niveau affectif, intellectuel et psychologique et est une relation de complicité.

En plein siècle XXI, quand nous ouvrons les pages des journaux nous sommes choqués avec tant de cas de personnes qui disparaissent , qui apparaissent mortes, dont personne ne connaît l'identité, ou les cas des personnes qui étaient mortes à la maison et qui étaient introuvables.

La question que je me pose est si beaucoup de ces inconnus, qui parfois avaient des centaines d'amis dans les réseaux sociaux, n'avaient manqué à aucun ami.

L'entrée de nouveaux individus au sein du groupe d'amis implique généralement la perte de contact avec d'autres, et les réseaux sociaux ont changé le périmètre de notre étreinte, mais il est inévitable que les amitiés doivent être nourries en personne, autrement le titre "amis" dévalorise et celle-ci est la seule justification pour que tant de personnes se retrouvent seules.

Avez-vous déjà réfléchi combien d'amis vous chercheraient dans un moment moins prospère ?

A FAMÍLIA PRUDÊNCIO NO SÉCULO XXI

JOÃO PAULO PACHECO
- Boa tarde!
- Boa tarde, como vai o senhor?
- Bem, obrigado.
- Sabe, eu penso que o estou a reconhecer, mas não me recordo de onde…
- Muita gente me diz a mesma coisa, sabe? No final dos anos cinquenta, no início das emissões da RTP, em 1957, eu e a minha família ficámos conhecidos de quase todo o Portugal, devido ao programa TVRural, do engºSousa Veloso, que era transmitido em horário nobre, sobre os cuidados a ter com o manuseamento dos pesticidas e dos lixos gerados nas explorações agrícolas. Naquela época, qualquer programa de televisão chegava à quase totalidade da população. Só havia um canal e toda a gente via a mesma coisa.
- Exactamente, é mesmo daí que eu o reconheço. E como vai a família?
- Tudo bem, felizmente. O meu filho já está reformado. Trabalhou uma vida inteira como condutor de pesados, não quis seguir as minhas pisadas, de forma que a agricultura foi sempre sobrando para mim e para a velhota. A minha mais nova casou e foi para a Alemanha com o marido já há mais de 30 anos e nem pensa em voltar…está por lá, também já se reformou, nunca teve filhos mas ela e o marido têm uma vida boa, desafogada, e ainda nos vão ajudando de quando em vez, e no Natal, ano sim ano não, passam cá uma temporada.
- E o marido dela…
- É alemão! Por isso é que dividem os natais entre um ano cá e outro lá.
- Ah, entendo…e então o senhor não tem netos? Ninguém para tomar conta da casa agrícola?
- Olhe, o meu rapaz, agora com quase setenta, teve dois filhos. A mais velha formou-se em História.
Claro está que o destino foi ir dar aulas…mas não foi fácil! Nos primeiros anos da carreira só conseguiu colocação nos Açores. Depois, passados uns cinco ou seis anos, lá conseguiu colocação numa escola perto de Bragança, a quase 500km de casa. Agora, e já vai para quatro anos, está desempregada, não tem conseguido colocação em lado nenhum, já nem nas ilhas. O rapaz, esse felizmente está bem. Continua solteiro; deixou a escola depois de fazer o nono ano, foi trabalhar para um amigo da família ligado à construção civil, depois instalou-se por conta própria e ainda é o que faz, e tem tido êxito, pelo menos não lhe tem faltado trabalho, o que nos dias que correm…
- É bem verdade, haver trabalhinho já não é nada mau. Agora a sua neta é que deve estar numa situação complicada, pois… 
- Olhe, vive connosco, sabe? Quando lhe acabou o subsídio de desemprego, há coisa de ano e meio, e como ainda estava com menos de quarenta anos, decidiu ela instalar-se como jovem agricultora, fizemos uns melhoramentos na quinta, montámos umas estufazitas e a rapariga sempre tem com que se entreter e vai dando para sobreviver. Na verdade, quem acaba por fazer o trabalho todo sou eu e a minha velhota, que a rapariga não tem mesmo queda nenhuma para a agricultura. Enfim, foi o que se pode arranjar, e sempre se aproveitaram uns subsidiozitos.
- Pois muito bem, muito bem, o tempo passa…não é verdade senhor Prudêncio? E diga-me, o que o traz por aqui?
- Olhe, vinha buscar uma embalagem do “mata-sete” para botar na vinha. A marca do costume.
- Já não temos esse produto, já saiu do mercado vai para dois anos. O que temos agora é este aqui ( e mostrou-lhe um frasco que tirou duma prateleira mesmo ali por baixo do balcão). Mas repare, este mata tudo o que o outro matava, até mata mais, tem um espectro mais amplo, compreende-me? E é mais baratinho do que era o outro…
- Quer dizer que o “mata-sete” custava dez e este “mata-dez” só custa sete? Isto até parece uma história mal contada.
- É verdade, Sr Prudêncio, disse o lojista rindo-se. E então, vai levar só uma embalagem ou quer mais?
- Não, não. Levo só uma e quando precisar de mais, volto cá a buscar, que até é um pretexto para vir à vila.
- Sim senhor, disse o homem da loja enquanto metia o frasco dentro dum saco de plástico. E o cartãozinho, trouxe consigo?
- Mas qual cartãozinho? Vou pagar em dinheiro! 
- Não me refiro ao Multibanco, preciso é de tirar o número do seu cartãozinho de aplicador de pesticidas. Sabe que agora somos obrigados a pedir o cartão e a registar tudo.
- Oh homem, mas eu não tenho cartão nenhum disso. Realmente na cooperativa perguntaram-me se eu não me queria inscrever num curso desses de aplicação dos venenos, mas eu tenho mais o que fazer, disse-lhes a eles que essas coisas agora eram com a minha neta.
- E ele fez o cursinho?
- Fez, teve que fazer…não lhe pagavam a última fatia do prémio do projecto sem ela fazer o curso e ela teve de fazer.
- Ah, bom, então agora é ela que percebe destas coisas e que faz as aplicações?...
- Acha que sim? Não percebe nada…nem sabe fazer as contas ao que deve “botar” na calda, quanto mais pegar no pulverizador e andar ela a aplicar…
- Compreendo, compreendo. Realmente, estes cursos é mesmo só para cumprir com as regras da comunidade e mais nada. Mas olhe, fazemos assim: o senhor leva o frasquinho, faz lá a aplicaçãozinha que tem de fazer e peço-lhe o favor de, assim que possa, passar aqui com o cartãozinho da menina para eu guardar aqui uma cópia e emitir-lhe a facturinha no nome dela, pois imagino que agora tenha a contabilidade no nome dela por causa do projecto…
- É isso mesmo, ‘tou a ver que o senhor está a par destas coisas…
- Temos de estar…senão somos ultrapassados e lá se vai o negócio! Fico então à espera que passe cá com o cartão da sua neta, combinados?
- Combinados, muito obrigado e tenha uma boa tarde!
- Igualmente para o senhor…e a si eu nem precisava de dizer isto, mas não se esqueça de ler primeiro o rótulo, eh eh….

(Mesmo depois de uma vida de cigarritos a acompanhar a aplicação dos pesticidas, o avô Prudêncio ainda é quem empurra a exploração prá frente!)

DEFINIÇÃO DO PLANTEL - CARACTERÍSTICAS INDIVIDUAIS EM FUNÇÃO DA IDEIA DE JOGO

ANDRÉ QUEIRÓS
Quando o treinador tem a possibilidade de escolher os jogadores que vão fazer parte do plantel da sua equipa este deve fazê-lo em consonância com a direcção, o orçamento disponível e em função dos seguintes factores:

Ideia de Jogo do Treinador

Toda e qualquer ideia de jogo requer um perfil de jogador para cada posição. Uma equipa que tem como objetivo a manutenção no campeonato que disputa terá uma Ideia de Jogo que prioriza aspetos defensivos pois vai passar muito tempo sem a bola, logo, os seus Avançados, por exemplo, devem ter características, tais como: interpretação do momento defensivo e o que fazer quando não tem bola; agressividade nos duelos e capacidade para condicionar o adversário no 1º momento de construção; velocidade para transitar rápido para o ataque… entre outras tão importantes como as mencionadas anteriormente. Agora vamos ter como referência os Avançados de uma equipa desse mesmo campeonato, mas que tem como objetivo ser campeã, os jogadores devem ter as mesmas características? Na minha opinião, não! Devem ser igualmente fortes nos aspetos defensivos, pois numa equipa que quer ser campeã todos têm que participar quando não têm a bola, mas devem ter outras características como por exemplo: boa relação com bola; capacidade para jogar entrelinhas; boa ocupação das zonas de finalização e capacidade para finalizar de diferentes formas, entre outras.

Qualidade Individual do Jogador



Na minha opinião este é o fator mais importante na escolha de um jogador. Havendo qualidade o treinador tem a possibilidade de moldar o Homem á sua imagem e ao funcionamento do grupo, depois cabe ao jogador adaptar-se e cumprir com aquilo que é pretendido, ou não. Caso o jogador não tenha a qualidade que é requerida, ou as características necessárias, dificilmente o treinador vai conseguir encaixá-lo na sua Ideia de Jogo, e poderá ter que começar a pensar ao contrário, criar uma Ideia em função dos jogadores que tem, o que será sempre mais complexo visto que o treinador é forte a operacionalizar a sua equipa para um determinado jogar, no qual inconscientemente acredita mais e é mais competente a transmitir ás suas equipas.

Para que fique claro qualidade individual do jogador não é apenas a sua técnica (relação com bola) como a maioria das pessoas pensa. O jogador de futebol deve ser avaliado á luz de quatro aspetos: Técnico, Táctico, Psicológico e Físico. Tendo isto em conta, o jogador até pode ser muito bom tecnicamente, mas não cumpre os requisitos físicos para a posição específica, a partir daqui o treinador pode assumir que o jogador não tem qualidade para integrar o plantel.

Carácter do Jogador

Um aspeto igualmente importante na escolha do atleta é o seu caráter e os valores pelos quais rege a sua vida. Por muita qualidade que tenha qualquer jogador e encaixe na Ideia de Jogo do treinador se este não tiver um bom caráter para com o grupo ele vai ser um elemento “tóxico” e prejudicar a sua coesão da equipa, fator importantíssimo na perseguição de qualquer objetivo. Com disse Eva Coimbra: “Você jamais será um bom profissional, se antes você não for um bom Ser Humano!”.

A FAMÍLIA E A FUGA

REGINA SARDOEIRA
É preciso ser capaz de escrever de modo sintético, ir direito ao assunto, esquecer metáforas e outras figuras de estilo e dizer somente o que há para dizer. 

Nascemos todos de um pai e de uma mãe, irrefragavelmnente. Eles são os motores da nossa vida e deles colhemos as marcas físicas que nos identificam e ainda a educação e os valores que nos transmitem. Os pais dão-nos irmãos; e, se eles próprios tiverem irmãos, dão-nos tios e muitas vezes primos e também os avós que foram, que são, os seus pais. 

Nesta rede de inter-relações gera-se a família, na qual encontramos a nossa razão de ser e com a qual buscamos identificação. E tudo estaria certo, não fosse o caso de inúmeras vezes a família, da qual somos parte, os pais, de quem somos oriundos, os irmãos, que connosco partilham essa mesma génese e todos os outros poderem ser a condição do nosso sofrimento e desequilíbrio. 

Nascemos, enquanto filhos, de um homem e de uma mulher que nada sabem da paternidade e da maternidade, no que nos diz individualmente respeito. Eles não exploram a nossa peculiaridade porque acreditam firmemente terem que nos carimbar com a sua marca e levar-nos por caminhos que são deles - e não nossos. Fazem-nos entrar no círculo já construído das suas próprias relações de parentesco, crendo que o melhor para nós é sermos unos com eles - por força do sangue. 

Quando, um certo dia, viermos a perceber que aquele pai e aquela mãe, aquele irmão, primo ou avô não representam nada para nós e a eles estamos obrigatoriamente ligados, por causa do parentesco sanguíneo, num nó demasiado apertado, nada podemos fazer. E vamos vivendo, desse modo convictos de que a família é o nosso melhor arrimo e o nosso grande consolo, quando, afinal, os elementos que a constituem podem ser-nos estranhos, podem ser-nos perniciosos e a causa suprema da nossa infelicidade. 

Falo assim porque observo o mundo das pessoas e as relações urdidas sob o signo do sangue; encontro aí muita perversão, falsidade e compromissos firmados apenas no alicerce genético - que pode significar muito pouco. E depois observo ainda que fugimos, constantemente, para a companhia de outros que não são pais, irmãos ou primos mas outras pessoas que, vindas da estranheza, se tornam mais íntimos e nos dão mais felicidade do que aqueles de quem nascemos na circunstância biológica da existência. 

Qualquer um pode corroborar o que acabo de escrever, se o desejar. E talvez possa perceber que a família, de que somos parte, é a condição necessária para a não menos necessária fuga em busca da nossa condição de seres individuais.

segunda-feira, 26 de setembro de 2016

AS FRONTEIRAS ENTRE A PROSA E A POESIA: O VERSO LIVRE


«Perguntando ao poema pelo ser da poesia, não confundimos arbitrariamente poesia e poema? Já Aristóteles dizia que "nada há de comum, excepto a métrica, entre Homero e Empédocles; e por isso com justiça se chama de poeta o primeiro e de filósofo o segundo". E assim é: nem todo o poema - ou, para sermos exactos, nem toda a obra construída sob as leis da métrica - contém poesia. (...)
Um soneto não é um poema mas uma forma literária, excepto quando esse mecanismo retórico - estrofes, metros e rimas - foi tocado pela poesia. Há máquinas de rimar mas não de poetizar. Por outro lado, há poesia sem poemas; paisagens, pessoas e factos podem ser poéticos: são poesia sem ser poemas. (...)
O poético é poesia em estado amorfo; o poema é criação, poesia que se ergue. Só no poema a poesia se recolhe e se revela plenamente. (...) o poema não é uma forma literária, mas o lugar de encontro entre a poesia e o homem.»

Octávio Paz in O ARCO E A LIRA


ALVARO GIESTA
___________O texto, infra, que é longo e do qual aqui pretendo deixar, para já, apenas a introdução, como crónica, não pretende ser ensaio; é, antes de qualquer classificação que se lhe queira apor, o resultado, em palavras escritas, duma profunda reflexão minha após a leitura, atenta e especulativa, de obras críticas de outros autores sobre as quais em estudo me debruço, dia a dia, no tempo que me sobra livre. Mais especulativa, ainda, e com a acidez crítica que me é própria, se me afigura a necessidades de tal reflexão, a publicar, depois da leitura que, quase diariamente, faço de uma multiplicidade de textos publicados nas redes sociais e em livros editados por pequenas editoras de ocasião, que a todo o custo querem ser designados de poesia pelos seus autores que, seguramente, depois da observação atenta a esses versos, concluo que nunca leram os grandes mestres do séc. XX que sobre a poética se debruçaram. ___________


INTRODUÇÃO

A fronteira entre a prosa e a poesia, perde a sua rigidez após o modernismo que alargou as possibilidades a outras vias de pensamento na definição da prosa e do verso; problematizou as normas literárias até aí em uso abrindo horizontes a novas formas de interpretar o poético. É Octávio Paz, crítico literário e poeta chileno quem, na sua famosa obra "O Arco e a Lira" discute a questão relacional entre prosa e verso, exemplificando e concluindo que «a poesia moderna da nossa língua (refere-se à Espanhola, estendida, como as evidências vêm a demonstrar, à Portuguesa - com Pessoa a dar o arranque) é mais um exemplo das relações entre prosa e verso, ritmo e metro». (pg 117, O Arco e a Lira). Já Ramon Gómez de La Sernap (que não é um poeta em verso, mas em prosa) rompera com a poesia anterior, sendo o primeiro a realizar a fusão entre linguagem falada e a imagem.

E Paz, quando reflecte sobre a linguagem e a sua relação intrínseca com o ritmo, afirma que este não é exclusividade da poesia. E o ritmo não é, efectivamente, exclusivo da poesia porque em toda a linguagem verbal há ritmo. Estará, até, mais próxima da poesia a linguagem verbal que a própria prosa: a prosa a que aqui me refiro, que será tratada mais adiante em capítulo específico, é a forma mais alta dos prosadores - o discurso, no sentido estrito do termo; o texto escrito, já que «não se fala a prosa: escreve-se» (Alfonso Reyes), é onde «as palavras aspiram a constituir-se em significado unívoco» (Paz, pg. 25). Porém, o ritmo da poesia é diferente, e único, é singular porque está articulado com o essencial do significado que a poesia deve ter sempre: a imagem. Porque, como nos diz Paz (pg. 118) «ritmo e imagem são inseparáveis» na construção do poema. Seja ele rimado ou branco, seja ele metrificado ou (verso) livre. A linguagem verbal tem limites; mas, quando damos à palavra o sentido que ela oculta, atribuímos-lhe o valor poético que a palavra tem: é o essencial da sua significação - a imagem; aliando-a ao ritmo temos o poema que vai de encontro à poesia. Drummond dizia que «sob a pele do poema há cifras e códigos» que se articulam entre o ritmo e a imagem. Cada código na natureza, seja objeto ou pessoa, seja animal ou planta, tem seu próprio ritmo. Para o poeta, o ritmo, aliado à imagem, é o pulsar do sangue que circula nas veias do poema. É movimento; é emoção; é vida. Tal como para o artista, das mais variadas expressões de arte, o ritmo expressa movimento. «A poesia é a emoção expressa em ritmo através do pensamento, como a música é essa mesma expressão, mas directa, sem o intermédio da ideia». (Fernando Pessoa)

A imagem, no verso, separa realidades e cabe ao leitor interpretá-las quando o poema deixa de pertencer ao poeta. O poema deixa de ser seu quando o dá à luz. É nesta dialéctica de pluralidade de significados da imagem que o leitor chega ao sentido ambíguo e paradoxal que a imagem poética tem no verso: «O sentido da imagem é a própria imagem (...) nada pode dizer o que (ela) quer dizer» (Paz, pg. 130). Paz procura provar que «um poema não tem mais sentido que as suas imagens» (Paz, pg. 133) e, tal como o sentido da imagem é a própria imagem, «o sentido do poema é o próprio poema» (Paz, pg. 134), garantindo ao poema uma certa autonomia naquilo que expressa, dando-lhe uma certa forma de metalinguagem.

Desmaterializando-se a imagem - como em Ángel Crespo -, o verso tem uma linguagem abstracta levando-nos a um metarrealismo quando os signos se elevam a um nível superior dentro do poema. Nesta itinerância o poeta transcende a própria realidade, transcendendo-se enquanto ser-poeta, conferindo ao poema na palavra-imagem-ritmo que o integra o saber de um "não-poema". É o saber mais profundo do poético nestas formulações contraditórias e ambíguas que compete ao leitor desmistificar - e cada um, e a cada um, a e na sua forma de interpretação. Cabe, contudo, ao poeta, estabelecer no poema, com a imagem, um movimento suspensivo que oscile - e faça o leitor oscilar e questionar, questionando-se - entre o abismo do saber e do não-saber. Porque, se todo o poema é um "não-poema" sê-lo-á, nesta medida, um "não-saber": um ficar suspensivo na interpretação pela ambiguidade que o poema, não o sendo pela força do significado da palavra mas, sendo-o, pela não-significação que lhe atribui a imagem (à mesma palavra) na especulação contraditória do leitor. Por alguma razão Ángel Crespo nos diz: «Se sabes perfeitamente o que estás dizendo, não continues o poema: rasga-o».

Aqui cabe realçar a diferença e a semelhança entre Paz e Ángel: o primeiro diz que «o poema não nasce do nada»; e que «um poema não tem mais sentido que as suas imagens» (Paz, pg, 133); o segundo, que é «sobre o nada que o nada se veste de miragens de todas as coisas vivas e inanimadas» (Melo e Castro, em Prefácio ao A Realidade Inteira de Ángel Crespo). Refira-se, contudo, que «a realidade poética da imagem não pode aspirar à verdade. O poema não diz o que é e sim o que poderia ser. Seu reino não é o do ser, mas o do "impossível verosímil" de Aristóteles». (Paz, pg. 120-121)

A palavra poética exprime-nos a pluralidade e ambiguidade do real experienciado e vivenciado pela essência do ritmo e da imagem - o que confere ao poema linguagem transgressora permitindo-lhe ultrapassar as fronteiras da própria palavra. O que é o poema se não «linguagem em tensão»? (Paz, pg. 135). O que diz o dizer poético para além do indizível? Nada e tudo. Absolutamente nada mas, também, absolutamente tudo: «o dizer poético diz o indizível» (Paz, pg. 136); nesta simbiose de ritmo e imagem, o poeta «recria, revive nossa experiência do real» (Paz, pg. 132) quando nomeia a coisa e é. O Poeta está no seu «reino onde nomear é ser», um reino - a Poesia - onde «retorna à linguagem para ver como a linguagem pode dizer o que, por natureza, a linguagem parece incapaz de dizer». (Paz, pg. 129)

Se me é permitido, aqui honro, como fecho da introdução daquilo que pretende ser obra, a palavra poética, onde o ritmo casa numa simbiose perfeita com a imagem na construção do poema "A PALAVRA CERTA" do poeta EDGARDO XAVIER, inserto no seu livro ESCRITA ROUCA:

De ti me nasce clara a voz das ruas
o grito do corpo, o fogo
a água da enxurrada.

De ti corre excessivo o rio em que mergulho
e onde sou o dizer atormentado da sede.
É minha a vez da terra que rompe, acerta e erra
a tua porta.

De ti, liberdade espúria, me chegam os beijos
os caminhos
os insultos de falsa guerra.
Vem, traz-me insana e livre a tua praia
e deixa que me estenda no areal do teu espanto
e que me lamba o mar ao chamado do sol.

Estarei então na tua boca
e no cântico ardente do sangue
direi a palavra certa.

Edgardo Xavier © Escrita Rouca (Insubmisso Rumor, 2016)