sábado, 30 de abril de 2016

SUGESTÕES PARA O DIA DA MÃE

JULIANA ROCHA 

Qualquer que seja a data ou a pessoa, todos nos gostamos de ser surpreendidos. O dia da mãe é já Domingo e claro que não podemos deixar passar esse dia em branco! 



Seja com uma flor, um gesto de carinho ou um presente. 
Com tal decidi reunir algumas ideias de presentes para vos ajudar.



Uma boa dica e que é indispensável na vida de qualquer mulher é uma mala! Na Parfois encontramos variadíssimas malas e modelos a preços muito acessíveis.

Para aquelas mulheres que não dispensam um acessório e que a Pandora é um deles, uma conta é sempre uma ótima opção! Tal como a pulseira da Tous especial para o Dia da Mãe.

Para as mamãs vaidosas podem sempre optar por um batom ou um perfume. 

E claro um relógio é sempre uma ótima e bonita opção principalmente para as mais atrasadas. Por fim, uma moldura. Esta é uma opção para quem vê o dia da mãe não como um dia em que se oferece prendas de grande valor mas sim algo significativo e especial, tal como uma moldura com uma foto em Família.

SE O AÇÚCAR FAZ TÃO MAL, ENTÃO DE QUE É FEITO ESSE VENENO?

PAULO MAGALHÃES
Na primeira crónica falámos na quantidade de agrotóxicos e açúcar que certos alimentos têm mas para a maior parte das pessoas isso não é o suficiente. Por isso, nesta crónica vou aprofundar mais sobre este tema.

Mesmo depois de explicar qual a quantidade de açúcar que um néctar ou um refrigerante contém, a população não deixa de os consumir. Até eu por vezes caio nessa tentação, confesso. Então tive que mergulhar mais fundo sobre este assunto e atrevo-me a perguntar, 

“Se o açúcar faz tão mal, então de que é feito este veneno?”

A resposta seria da cana de açúcar, mas a minha resposta para si vai mais longe. O processo começa com a cana, do qual resulta um líquido acastanhado, mas o nosso açúcar é branco e para atingir essa coloração este sem de ser refinado. Até aqui também toda gente sabe, agora ficaria um pouco surpreso se lhe dissesse que para processo de refinamento, o açúcar é lavado em leite e de cal, depois é tratado com dióxido de carbono. 
AÇÚCAR À MESA?
DR JOÃO TORRES
Resultado: uma cor escura, pouco atrativa; então eis um banho de ácido sulfuroso e a seguir uma cozedura, seguido de um resfriamento e a cristalização e depois uma centrifugação. Para finalizar é filtrado e descolorado em carvão ativo.

Este é então o resultado de tudo o que adoça o seu dia. 

Uma boa noticia que tenho para vos dar, é sobre as batatas fritas, que afinal fazem bem, é verdade, as batatas fritas fazem bem. 

Calma, não vamos já todos a correr para os Fast-Food’s pedir a maior dose de batatas, porque lá são fritas em óleo de girassol e por vezes esses óleos atingem grandes temperaturas, o que faz com sejam libertados ácidos de oxidação que podem ser até cancerígenos.

“Como fritar então as nossas batatas fritas?”

Uma fritura correta permite que o óleo seja absorvido apenas na proporção de 5% e, no caso das batatas, o amido naturalmente presente torna-se na melhor barreira para travar esta absorção. 

O primeiro passo é comprar umas boas batatas, sem isso nada feito.

O segundo passo é frita-las em azeite extra-virgem ou em óleo de amendoim não devendo ser reutilizado.

Frite com bastante óleo para a fritura ser menos demorada e assim não haver tanta absorção. 

E ai está, uma batata frita saudável e uma ótima fonte nutricional.

Para concluir esta crónica, vou tentar pô-los a refletir sobre estes grandes problemas:

“Quem controla a comida controla o mundo, visto que este é um bem essencial equiparável ao respirar, mas com um custo real. Gostaria que refletissem um pouco sobre a quantidade de casos de pessoas da elite que conhecem com doenças ou até com neoplasias?”

São raríssimos, sim agora que pensam são raríssimos e a explicação está nos suplementos especiais que eles tomam que eliminam essas toxinas do corpo.

E mais uma vez deixo-vos a refletir sobre o nosso sistema alimentar, que liga política, economia e liga o mundo todo. O mais certo seria você comer e ter acesso a esses suplementos para que não morressem pessoas a cada hora por todo o planeta. Sim, seria o mais certo se as indústrias farmacêuticas não usassem propositadamente essas toxinas para que se torne dependente dos seus produtos.

E agora que reflete certamente tem vários amigos e familiares que dependem desses produtos, quer por diabetes, colesterol,....

O antigo somos nós, daqui a pouco tempo preserve-se, cultive, apoie e alimente-se do biológico, diga não a esses negócios de biliões

PLAISIR DU PORTUGAL À PARIS

ANTÓNIO REIS
(ao centro)
Um fim de tarde de sábado, em que os raios de sol, início de primavera, se confundem com o “lazer” que sai lá do ponto mais alto da Torre Eifel. A luz do dia acaba, mas a noite começa com o mesmo brilho. Um reduzido grupo de emigrantes, que gozam da felicidade que nunca poderiam ter no país onde nasceram, reunirem-se para desfrutar de umas horas de lazer. Estes que há cerca de meia dúzia de anos partiram à procurando uma vida mais prospera, em outra latitude/longitude, alegam que têm saudades do seus Portugal, mas já mais pensam em regressar definitivamente.

Laços de sabores e cheiros

POSTA À MIRANDESA
É impossível cortar laços com as origens. Pois, por todas as cidades da Europa e outras dos restantes países do globo terrestre, há sempre um cheiro, um sabor e uma palavra portuguesa ao voltar da próxima avenida. 

Foi o que encontramos nesse início de noite de sábado, na cidade “luz”. A convite de dois emigrantes portugueses, empresários de sucesso em terras “gaulesas”. Seguimos o azimute rumo ao “Plaisir du Portugal”, um restaurante com as mais originais matérias-primas portuguesas, desde os condimentos, às carnes e onde encontramos o “rei” de Portugal, “sr. bacalhau”. A manusear as iguarias nacionais encontramos meia dezena de portugueses que todos os dias transformam o produto nacional em requintados pratos a degustar pelos clientes que bem conhecem os sabores bem português. O bacalhau às mil e uma maneiras e a carne de Trás-os-Montes, a típica posta mirandesa, aconchegam o estômago e alimentam a nostalgia de quem está longe do seu país – Portugal.

Vinho português

VINHO 
Para acompanhar uma refeição bem portuguesa não poderia deixar de estar presente um vinho que corresponda ao conteúdo empatado. Assim, encontramos na garrafeira do “Plaisir du Portugal” um dos melhores vinhos que se produzem entre o Planalto Transmontano e o Douro; um vinho produzido na adega cooperativa de Freixo de Espada À Cinta, com nome bem sugestivo da sua origem e de excelente qualidade, “Montes Ermos”. Um vinho tinto jovem e frutado com notas de especiarias, com um curto estágio em madeira, ideal para momentos especiais no acompanhamento gastronómico.

Montes Ermos é o nome dado aos vinhos e azeites produzidos pela Adega Cooperativa da Vila de Freixo de Espada À Cinta, nome escolhido em honra à Senhora dos Montes Ermos, padroeira da vila. A divindade do vinho confunde-se com a qualidade quando passa pelas pupilas-gustativas, entre aromas, textura, taninos e cor rubi. Na área geográfica, onde se encontram plantadas as videiras que dão origem a tão nobre néctar, podemos observar amplas paisagens e um belo mosaico agrícola, com impressionantes fragas nos maciços rochosos escarpados de granito, xisto e quartzo, distribuídos ao longo do vale do Douro internacional e seus afluentes e meseta transmontana. Além do produto de excelência que ano após ano se produz por estas terras do mais profundo mundo transmontano, outrora abandonadas pelos povos de Roma que aí deixaram as primeiras vitis, assim como o abandono actual dos mais jovem habitantes; podemos contemplar uma natureza no seu estado mais puro e selvagem com uma fauna e flora grandiosas e outone.

No périplo pela cidade de Paris, durante o fim-de-semana, podemos encontrar outros vinhos de origem portuguesa e da região do Douro, a preços apelativos e de qualidade à sua classificação. Mas destes falaremos em próximas edições.

(SALA DO RESTAURANTE)

Restaurante “PLAISIR DU PORTUGAL”
Uma refeição completa pode custar entre €100 a €150 por pessoa
62, Avenue de Verdun 94 000 Créteil​
Téléphone / 01 48 99 20 20
Mail: plaisirduportugal@gmail.com





Vinho:
Montes Ermos Colheita DOC do ano 2014 - 5,25 € - preço referente à saída da adega cooperativa de Freixo de Espada À Cinta



RESPEITEM O DOENTE ONCOLÓGICO

ANTONIETA DIAS
Sem dúvida que o direito do doente implica ter o conhecimento de todos os procedimentos clínicos que lhe vão ser prestados e o seu livre e esclarecido consentimento para que os mesmos sejam executados de acordo com a legis artes do ato médico.

A sua decisão na aceitação dos tratamentos tem de ser livre e esclarecida, e só o homem instruído é que consegue ter liberdade para saber o que quer, escolher a direção que melhor lhe convém e determinar o seu destino.

É preciso ser suficientemente forte, estar disposto a sofrer para evitar que a doença nos agrave a fraqueza.

Se, em pleno conhecimento de causa o doente aceita e considera ser a decisão mais acertada, a sua luta e o seu esforço irão de encontro ao plano que melhor se ajusta naquele momento às propostas clinicas do tratamento que lhe é dirigido.

Os procedimentos médicos só serão tecnicamente justos e verdadeiros se conseguirem ser perfeitos.

A medicina exige a execução de planos terapêuticos científicos, com normas de orientação clinica, alicerçadas numa componente espiritual, sem a qual não conseguiremos obter o nível de excelência obrigatório para o bom desempenho profissional.

É essencial que os métodos para atingir estes objetivos estejam sempre enriquecidos pela norma universal do respeito e preservação da dignidade do ser humano.

A nossa obediência não pode ser cega, por isso é necessário que ao transmitir a verdade ao doente, temos que refletir e adaptar o conceito de acordo com as características individuais do doente que irá depender do seu temperamento, da sua personalidade, do grau de conhecimento e diferenciação intelectual e espiritual.

A prática da medicina, no contexto da transmissão da informação clinica a fornecer ao paciente deverá ser sempre baseada na verdade, na ciência, respeitando ao direito inviolável da dignidade do ser humano no seu todo (físico, espiritual e social).

É óbvio que a verdade é a mesma para todos os doentes, mas a forma como é transmitida a cada um é completamente diferente pois os pacientes são todos diferentes.

Se à partida nascemos todos iguais, não nos podemos esquecer que somos seres únicos com percursos regulares, com costumes e valores fundamentados no enriquecimento pessoal, com graus de conhecimento teórico e pratico, espiritual e social diferenciado e sustentado pela vivência individual que nos caracteriza e determina a forma de estar e de vivenciar as experiencias boas e menos agradáveis que vamos tendo ao longo da nossa vida.

O reconhecimento das características individuais dos pacientes por parte dos profissionais da saúde que direta ou indiretamente irão ser intervenientes no processo da decisão clinica é fundamental para que a aceitação por parte do doente seja livre e perfeita.

Perante o aparecimento de uma doença oncológica é necessário transmitir a verdade e todas as implicações que a doença tem, porém, este procedimento clinico é sempre complexo e muitas vezes cruel cuja história por vezes não se compadece e é até imprópria, porque a sua expressão implica certamente um enorme sofrimento e por mais forte que a nossa riqueza espiritual seja para interiorizar uma notícia que poderá não ter complacência pela preservação da nossa vida cuja obediência fatual não pode ser modificada, têm de ter ciência e arte na comunicação da verdade que vamos dizer ao doente.

Por isso, é necessário transmitir a informação de forma simples, suficientemente explícita e clara, não omitindo nenhum detalhe, sem contudo esquecer que deverá ser suave para minimizar os efeitos nefastos que o impacto desta notícia gera no doente e na família.

Em suma, seja qual for o ato médico executado tem de ser sempre baseado no conhecimento científico cuja aplicabilidade é para ser exercida no ser humano que tem corpo e alma.

sexta-feira, 29 de abril de 2016

AÇÚCAR: DOCE VENENO PARA AS CRIANÇAS

JOANA MALHEIRO
Conta a história que por volta de 500 a.C terão os indianos sido o primeiro povo a conseguir extrair e produzir o açúcar, que era inicialmente usado como produto medicinal ou especiaria rara, de valor monetário tão elevado que só a nobreza possui acesso.

O açúcar, substância alimentar sem valor nutricional, e com valor calórico (4kcal/g) fornecedor de calorias vazias, de rápida absorção mostra cada vez mais ser a causa de distúrbios metabólicos, que podem conduzir a doenças graves começando na infância.

Presente nas nossas mesas há séculos, o açúcar usado ao pequeno-almoço, na preparação de refeições, como sobremesas, iguarias conventuais e até pratos principais, passou para a lista negra dos alimentos, vindo ao longo dos últimos anos a ser classificado como uma “droga”.

São poucos ou raros os que lhe conseguem resistir, está por hábito presente em todo o tipo de comemoração, é o nosso “aliado” quando nós sentimos mais tristes, pois confere-nos uma sensação de prazer, sabe bem.

Mas porquê, será que o açúcar se torna um vício?

Cada vez mais comparado ao tabaco, funciona no nosso corpo ao nível neurológico, ou seja, estimula a secreção de neurotransmissores, nomeadamente a serotonina e a dopamina conferindo-nos a sensação de prazer, contudo estudos mostras que dada a prematuridade com que é introduzido na vida das nossas crianças, os seus efeitos podem ser ainda mais nefastos que o tabaco, quando comparados. E dada a adaptação do organismo, temos necessidade de aumentar o seu consumo, para o efeito de prazer continuar presente.

Cada vez mais associado a má alimentação e usado amplamente pela indústria alimentar, para o prolongamento de prazos de validade ou intensificar o sabor dos alimentos, o açúcar está muitas vezes oculto ao olhar do consumidor, por lhe serem atribuídas outras designações (maltose, dextrose, frutose, glícidos, xarope de milho, xarope de arroz, etc). Este fato faz que desde criança haja uma elevada exposição a este tipo de alimentos, pois a grande maioria dos produtos de consumo diário, destinados as crianças, possuem teores de açúcar e até de sal muito elevados.

É então o ‘açúcar o maior veneno que damos às crianças’?

Estamos a consumir açúcar em excesso, a OMS recomenda que o consumo diário não exceda os 10% das necessidade diárias e que deveria estar abaixo dos 5%, ou seja as 25g de açúcar se falarmos num adulto saudável, mas usar o mínimo possível, em especial nas crianças, no entanto, estudos mostram que há crianças que diariamente consomem até 20 pacotes, dando uma média de 125g de açúcar.

As crianças têm uma tendência natural para os sabores doces, desde o leite materno com os açúcares naturais, até aos primeiros alimentos introduzidos na diversidade alimentar, que é feito pelas papas, cereais e frutas, daí ser fundamental o atraso das restantes fontes de açúcar não natural na sua alimentação.

Como se reflete esta realidade na nossa saúde?

Através de alterações metabólicas, patologias como diabetes mellitus tipo 2, hipertensão arterial, alterações lipídicas no sangue, ácido úrico elevado, obesidade, alterações cardiovasculares (Enfarte do miocárdio ou AVC), complicações mais frequentes nos adultos ou idosos, mas que já se verificam na pediatria e constituem o chamado Síndrome Metabólico.

Desta forma, mesmo que os pais tenham em casa filhos magros, ou com aparente ausência de alterações pela falta de massa gorda, não devem descuidar os cuidados no controlo de açúcar que permitem ou fornecem às crianças. A maioria destas patologias é silenciosa, não doí, mas causa dano a longo prazo.

No entanto a culpa não é exclusiva do açúcar, mas sim do exagero ou do excesso praticado pelos consumidores. Aparecendo de forma camuflada, está presente em quase todo o tipo de alimentos, desde os refrigerantes, néctares, molhos processados, pão, salsichas, comida para bebés, um número indeterminado de produtos já preparados, pois há poucos alimentos processados onde a industria alimentar não coloque açúcar. Assim é importantes os pais perceberem esta realidade e mudarem os hábitos e as rotinas das refeições das crianças, começando por dar o exemplo, nas boas escolhas alimentares.

Concluindo, porque a alimentação é um ponto fundamental, para o bom estado de saúde e para a prevenção da doença:

- A quantidade máxima de açúcar a usar deve ser sempre a mínima possível, em especial nas crianças e deve ser inserida na vida da criança o mais tarde possível;

- A redução drástica da ingestão de açúcar no dia-a-dia é a melhor forma de prevenir doenças metabólicas como as referidas anteriormente e para isto, a importância da leitura do rótulo dos produtos alimentares é fundamental, pois são os alimentos processados que possuem mais açúcar de adição. 

- Nos alimentos como os cereais, leite e derivados, frutas, leguminosas e hortaliças, estão presentes todos os açúcares da qual precisamos, os hidratos de carbono complexos com fibras, vitaminas e açúcares naturais de lenta absorção no organismo.


[NOTA: Calorias vazias: designamos por fornecedores de calorias vazias os alimentos que nos fornecem energia através das calorias, mas que não contém ou não são fornecedores de nutrientes, indispensáveis ao organismo; OMS:Organização Mundial de Saúde]. "

AS BARATAS, LEONARDO DA VINCI E O FUTURO DA ROBÓTICA

NORBERTO PIRES 
Sempre gostei muito de baratas porque são máquinas fantásticas de locomoção e porque são estúpidas. Na verdade, elas andam tão bem um pouco pelas duas razões: têm uma estrutura mecânica otimizada (e muito simples) para a locomoção e quando encontram problemas resolvem-nos sem pensar e sem ativar de imediato o seu sistema nervoso central.

Quando disse isto, em tempos, à minha mulher Martha, que esteve uns meses em Macau a trabalhar num jornal, ela não achou grande piada porque as baratas vivem aos montes naquele clima e são impossíveis de extinguir.

Mas na verdade, por incrível que possa parecer, a robótica está a aprender muito com seres vivos como as baratas. Não para chatear jornalistas a precisar de descanso, mas para aprender como construir sistemas mais eficientes. A nossa forma de pensar tende a adicionar sensores a tudo, bem como dispositivos de processamento de dados (processadores), que permitam observar tudo, processar e corrigir. Ora, se observarmos o comportamento da natureza não é bem assim que as coisas se passam, verificando-se que em muitas tarefas se deixa à solução mecânica a maior parte das respostas e só muito mais tarde, em casos extremos, é que o sistema nervoso central é ativado e chamado a intervir. Um bom exemplo é a barata. Mecanicamente é um excelente projeto de uma máquina capaz de andar. Para além disso, como demonstram experiências feitas na Universidade do Michigan, e muitas outras, se o seu movimento é perturbado a barata resolve isso recorrendo às suas capacidades mecânicas: ou seja, o sistema de locomoção é, em grande medida, passivo. Não reage de forma ativa, disparando o sistema nervoso, a todas perturbações. As mais simples são resolvidas de forma passiva. O resultado geral é uma excelente máquina de locomoção.

Isso significa que no curso da evolução a natureza achou que um bom sistema de locomoção não precisava de ser reativo e deveria era depender de um bom sistema mecânico, pois isso tornava-o bem mais previsível e fácil de controlar. Isto é importante não só para a robótica, mas também para a biónica. Se quisermos perceber aquilo que faz um sistema de locomoção fiável e seguro, talvez isso implique observar como fez a natureza durante vários milhões de anos em vários dos-seres vivos que temos hoje, incluindo o homem.




Mas isto não é nada de novo na forma de pensar. Um dos maiores engenheiros de todos os tempos, o fantástico Leonardo da Vinci dizia que a melhor forma de realizar dispositivos eficientes era observar a natureza. Devo confessar que descobri o génio de Leonardo quando iniciei em 2002 uma compilação de uma nota de revisão histórica para um livro que estava a escrever. Fiquei abismado com as capacidades, interesses e universalidade deste homem do renascimento. Dotado de um intelecto superior, o artista Leonardo da Vinci percebeu que a visão era um meio fundamental para adquirir conhecimento, estudar e perceber os fenómenos naturais: Saper Vedere (“saber ver”) era a chave para desvendar as criações naturais e, com esse conhecimento, imaginar e projetar mecanismos que tentavam reproduzir as características naturais em que estava interessado. Desenvolveu um invulgar poder de observação que, aliado à sua enorme e reputada capacidade para desenhar objetos tal como eram, se tornou no seu principal instrumento de investigação. Anotava os seus estudos de forma gráfica (o texto servia para complementar os gráficos e esquemas) nos seus cadernos de apontamentos (Codex Atlanticus, Ms.B. Ms.I., …, hoje guardados no Museu da História da Ciência - Florença, Itália, ou pertencentes a colecções particulares como é o caso do Codex Leicester que pertence a Bill Gates, cofundador da Microsoft). 


Figura 1 – Estudos de Leonardo da Vinci para um robô antropomórfico.

Teve acesso aos desenhos e projetos dos Gregos, documentados pelos Árabes em publicações que estavam já traduzidas. Fez estudos de anatomia humana e animal (nomeadamente de aves, na tentativa de reproduzir o seu voo), tinha conhecimentos de mecânica e projetou e, provavelmente, construiu mecanismos que reproduziam movimentos e funções humanas. No entanto, poucos desses desenhos chegaram até hoje e muito poucos sobre o projeto secreto de um robô foram encontrados. Do seu maior livro de apontamentos, o Codex Atlanticus, faltam algumas páginas precisamente na altura em que parecia preparar-se para projetar um robô (Figura 1). Isso levou alguns investigadores a especular que as páginas em falta continham os estudos para um robô espetacular de aspeto humano (um cavaleiro andante com uma armadura germano-italiana típica do século XV). Teria sido projetado entre 1495 e 1497, mais ou menos na altura em que pintou A Última Ceia e elaborou a decoração da Sala delle Asse do castelo da família Sforza em Itália. O ambiente retratado nos tetos e paredes da sala, uma floresta de árvores altas, com as cúpulas pintadas no teto e os troncos nas paredes, parece ser o ambiente adequado para um cavaleiro andante mecânico. Era, ao que se pensa, capaz de mover a cabeça e braços, levantar-se e sentar-se, abrir e fechar o maxilar da armadura, emitir sons, etc. Teria, pelo menos, dois sistemas de juntas diferentes: pernas com três graus de liberdade (joelhos, tornozelo e anca) e braços com 4 graus de liberdade (ombro, cotovelo, pulso e mãos). A fonte de energia era hidráulica, recorrendo a canais que passariam por debaixo da sala. Mas ele poderia ter pensado em usar também molas e/ou contrapesos. Este projeto seria o corolário lógico dos seus estudos de anatomia e mecânica.

Pode ser que ainda um dia sejam encontradas as folhas perdidas do Codex Atlanticus numa qualquer biblioteca europeia ou coleção particular. No entanto, Leonardo da Vinci é conhecido pelos seus estudos incompletos e pela forma peculiar como escrevia os seus apontamentos da direita para a esquerda, como a imagem num espelho, de uma forma em que parece falar consigo próprio e não para eventuais leitores. Os seus apontamentos são uma espécie de monólogo, que ele não sentiu a necessidade de publicar, embora isso fosse já possível na sua época. Por qualquer razão pode ter destruído essas páginas e desmontado todos os mecanismos relacionados com elas, de forma a que não fossem reproduzidos. Ou outros o fizeram por ele, por razões políticas ou religiosas.

O que quero dizer com tudo isto é que a imaginação da natureza é muito, muito maior do que a imaginação do homem. Em 2007 escrevi um texto que publiquei no blogue “De Rerum Natura” e que reproduzo aqui no essencial. O watt é a unidade de potência (energia/tempo), e é usada para especificar a variação de energia de um sistema por unidade de tempo. A energia é aqui apresentada como trabalho, ou seja, a energia consumida na realização de uma determinada tarefa. Por exemplo, enquanto escrevia este texto estive a ouvir a música “Safe from harm” dos Massive Attack (do álbum Massive Attack Collected). Durante esse tempo o meu ouvido interno esteve a realizar o equivalente a um bilião de operações em vírgula flutuante por segundo. Fazendo equipa com o meu cérebro, o meu ouvido interno (assim como o de um qualquer ser humano normal) consegue distinguir sons até 120 dB, e identificar uma conversa particular no meio de uma multidão de pessoas (não é que eu seja cusco, mas é verdade). Nenhum sistema artificial atual, construído com a nossa mais sofisticada tecnologia, consegue fazer algo que se aproxime. E o que é verdadeiramente espantoso é que o ouvido interno consegue esse processamento de forma muito eficiente consumindo somente 14*10-6 watts, isto é, poderia trabalhar durante 15 anos consecutivos com a energia fornecida por uma pequena pilha AA.

De facto, o corpo humano consome 100 watts, e o nosso cérebro somente 50 watts. Todo o nosso sistema biológico é altamente eficiente do ponto de vista energético, e nós sabemos que tem capacidades muito avançadas, muito para além daquilo que conseguimos fazer com a nossa tecnologia. Só para terem uma ideia, o meu PDA que também é telefone consome 21.6 *10-3 watt em standby (ou seja, sem fazer nada) e esgota a bateria de 3.6 volts (1200 mAh) em 200 horas (8.3 dias). Se estiver a ser usado para telefonar dura poucos dias (3 a 4 dias), ou seja, consome cerca de 60 * 10-3 watts. E é um dispositivo limitado, com capacidades de processamento muito inferiores ao meu ouvido interno.

Ou seja, estamos muito longe de construir sistemas comparáveis com o nosso cérebro, ou sistema auditivo, visão, tato, locomoção, sentido de orientação, etc. Se fossemos capazes de copiar a sua eficiência resolvíamos os problemas energéticos mundiais, para além de termos capturado a forma como os sistemas biológicos processam informação, o que constituiria em si uma enorme revolução.

É interessante notar que grande parte do processamento realizado pelos nossos sistemas neuronais é analógico, sendo a informação posteriormente digitalizada. O ouvido, por exemplo, realiza operações de filtragem, análise de frequência, compressão, etc., antes de transmitir a informação ao cérebro. As células do cérebro (neurónios) podem ser entendidas como um conversor analógico para digital (ADC - analog to digital converter) especial. Recebem informação de outros neurónios, integram essa informação de forma analógica, e disparam (1), ou não (0), impulsos nervosos para outros neurónios.

Consequentemente, o nosso procedimento atual de digitalizar tudo e aplicar à informação obtida técnicas de processamento digital parece estar errado: a natureza não foi por aí. Sempre usamos como argumentos para evitar o processamento analógico a falta de precisão, a flutuação e variância com a temperatura, etc., e consequentemente optar pelo processamento digital, mais estável e menos dependente da precisão dos componentes elementares. No entanto, os nossos olhos e ouvidos proporcionam informação de alta qualidade usando elementos analógicos pouco precisos. Como resolveram esse problema? Que mecanismo(s) engenhoso(s) realizaram para interligar esses elementos produzindo um resultado muito eficaz e verdadeiramente fabuloso?

Temos muito a aprender com a natureza para projetar soluções mais eficazes e eficientes, nomeadamente aprendendo como os sistemas biológicos fazem funcionar a estratégia de utilizar o processamento analógico (energeticamente muito eficiente) antes de procederem à digitalização da informação. Temos de perceber como conseguem ser eficientes e robustos usando dispositivos pouco precisos e com muito ruído, quando usados em larga escala. Temos de perceber como são capazes de trabalhar em vários períodos de processamento (que variam entre milissegundos e dias) e com distâncias variáveis (que variam do micrómetro ao centímetro). Hoje, com a nossa eletrónica sofisticada, não conseguimos nada que se aproxime e seja estável. Precisamos de perceber como fazem esse processamento paralelo tão maciço.

Uma célula humana do cérebro é capaz de integrar informação de várias outras células, e produzir informação para várias células numa cadeia de processamento paralelo em larga escala. A nossa capacidade atual é muito inferior e limitada pelo número de ligações que conseguimos colocar num chip eletrónico. Mas também porque não sabemos como funciona o nosso cérebro, como podemos passar informação de forma segura e efetiva às zonas do cérebro que processam esta informação. Talvez porque a nossa imaginação seja muito mais limitada. Por exemplo, existem vários trabalhos e projetos que tentam devolver a audição ou a visão a pessoas que perderam esses sentidos. Mas os resultados são dececionantes, nomeadamente quando comparados com as capacidades do sistema original (nem é possível uma comparação, dada a enorme diferença de qualidade). Mesmo coisas aparentemente mais simples, como devolver alguma mobilidade (substituição de membros, por exemplo), têm resultados dececionantes quando comparados com o original. Há algo errado, talvez um erro sistemático, na forma como abordámos estes assuntos. Talvez seja altura de parar e ver como fez a natureza, que caminhos seguiu, e quais os que tiveram mais sucesso.

Perceber os mecanismos da natureza, a forma com resolveu os problemas que se lhe colocaram, nos vários seres biológicos, criando soluções robustas e eficientes, é o objetivo de uma nova área da engenharia que se denomina “neuromorphic engineering”.

Imaginem uma simples célula humana; o conjunto de interligações químicas que lá ocorrem formam um fabuloso computador que regula o seu crescimento, estrutura, reprodução, ligação com outras células, etc. Imaginem que percebíamos como funcionava, que eramos capazes de reproduzir pelo menos algumas dessas funcionalidades. Imaginem que dominávamos esse poder. Poderíamos criar redes de computadores capazes de aplicações que estão ainda fora da nossa imaginação.

Pois é, a imaginação da natureza é bem maior que a imaginação humana. Que o digam as… baratas!

Leitura suplementar:

1. Instantaneous kinematic phase reflects neuromechanical response to lateral perturbations of running cockroaches, S. Revzen, Springer Biological Cybernetics, Abril de 2013 

2. Leonardo Architect, C. Pedrettii, New York: Rizzoli International Publications, 1981.

3. Robots Robots Robots, H. Geduld e R. Gottesmann, Boston: New York Graphic Society, 1978.

4. The Genius of Arab Civilization, J. Hayes, Cambridge, Massachusetts: MIT Press, 1983.

5. In the Footsteps of Leonardo, M. Rosheim, IEEE Robotics and Automation Magazine, June 1997.

6. Robot Evolution: The Development of Anthrobots, M. Rosheim, New York: John Willey & Sons, 1994.

7. Robot Hands, M. Rosheim, New York: John Willey & Sons, 1996.

8. The Imagination of Nature is Far, Far greater than the Imagination of Man, J. Norberto Pires, “De Rerum Natura”, 2007 - http://dererummundi.blogspot.pt/2007/05/imagination-of-nature-is-far-far.html

A MENTALIDADE CULTURAL DOS PORTUGUESES ESTÁ A MUDAR

GABRIEL VILAS BOAS
Um jornal titulava «Já é nosso», outro agradecia com um sentido «Obrigado» - no mundo da cultura portuguesa vai uma alegria pueril e incontida pelo sucesso do peditório nacional para a compra, por parte do Museu Nacional de Arte Antiga, do quadro de Domingos Sequeira “A Adoração dos Magos”.

É, de facto, uma boa notícia, mas a satisfação generalizada que perpassa nos jornais e nas redes sociais é cruelmente esclarecedora quanto à realidade da cultura portuguesa.

O sucesso desta operação pública desta de mecenato popular mostra que a sensibilidade artística dos portugueses tem uma base social mais alargada, que a sociedade se consegue mobilizar economicamente para aquisição de uma obra de arte de autor português. E não há nada de melhor quando o público “constrói” o espólio dos seus museus porque isso revela interesse, amor à arte, capacidade de decisão quanto aquilo que é importante para o bem comum.

No entanto, a “salvação” do quadro de Domingos Sequeira expõe também toda a fragilidade económica do mais importante museu português assim como a inexistência de uma política cultural, por parte do governo, que evitasse este espetáculo deprimente de um peditório nacional para comprar um quadro de pouco mais de meio milhão de euros. Pode até ser enternecedor, mas certamente também é caricato e humilhante.

Estamos a falar de 600 mil euros! Como é possível um ministério da cultura não ter um plano de investimentos que permita aos museus nacionais adquirir obras de arte com algum valor de mercado, de molde a enriquecer o seu acervo e assim atrair mais visitantes? O valor em causa era tão baixo que que o MNAA nem deveria precisar de qualquer ajuda estatal ou privada para fazer esta aquisição, mas a nossa realidade económica, quando falamos de cultura, é esta.

Quando comparo este heroísmo popular na aquisição da tela de Domingos Sequeira com os “azares” dos nossos bancos privados (que fomos obrigados a resgatar), não deixo de sentir uma enorme revolta, porque Portugal só não tem dinheiro para investimentos necessários e úteis, já que para acorrer a trafulhices que correram mal há sempre verba.

Hoje passam 151 anos que nasceu o grande pintor naturalista José Malhoa. A sua obra-prima, Fado, datada de 1910 ilustra bem o seu génio e essa mentalidade pequenina e submissa dos portugueses, que os impede de avançar.

Mantemos aquele fatalismo e saudade que Malhoa pintou há cem anos e por muito cosmopolitas que sejam os nossos banqueiros não deixamos de ser uns pobres magos enganados que continuam a adorar o menino errado.

quinta-feira, 28 de abril de 2016

É MESMO IMPORTANTE TRATAR ESTES DENTES. «MAS NÃO SÃO DE LEITE?»

SILVIA TEIXEIRA
Esta é uma pergunta frequente nas consultas de Odontopediatria. Realmente, os pais nem sempre estão convencidos da importância de tratar estes dentes que, afinal, vão acabar por ser substituídos pelos dentes definitivos. A explicação é simples.

Um dente de leite, quando cariado, dói. E devido à sua anatomia em que o feixe vasculo-nervoso está mais próximo da superfície, uma cárie num dente de leite progride e provoca dor até mais rapidamente que num dente definitivo. Uma criança com dores de dentes vai dormir mal, vai estar irritada, vai ter dificuldades de concentração na escola e dificuldades na mastigação dos alimentos, comprometendo também a sua digestão. Se já teve dor de dentes sabe como é insuportável e não quer certamente que o seu filho passe pelo mesmo.

Além disso a saúde dos dentes permanentes é uma consequência direta da saúde dos dentes de leite. A cárie é transmissível e na dentição mista ela pode passar de um dente de leite cariado para um dente definitivo saudável. É importante relembrar que o primeiro dente definitivo erupciona por volta dos 6 anos e que alguns dentes de leite só serão substituídos por volta dos 11-13 anos de idade.

Não podemos esquecer que os dentes definitivos se estão a formar por baixo dos dentes de leite, estimulando o crescimento do osso alveolar que suporta os dentes. São os dentes de leite que servem de guia e mantêm o espaço apropriado para os dentes permanentes. Se cariado e não tratado, o dente de leite vai acabar por ser extraído precocemente e, se nada for feito, o espaço fecha e o dente permanente pode erupcionar fora de posição ou ficar retido dentro do osso e não erupcionar. É indiscutível por isso a importância que uma troca de dentes de forma natural tem para o correto desenvolvimento das arcadas dentárias e consequentemente dos ossos e dos músculos da mandíbula contribuindo para um crescimento harmonioso da face.

Os dentes de leite desempenham um importante papel no desenvolvimento da fala e a sua perda precoce provoca alterações na articulação de alguns fonemas.

Um sorriso saudável contribui para a estética da criança e embora não pareça importante, isso tem um grande valor psicológico e influencia o desenvolvimento da sua confiança e da sua auto-estima.

Por todas estas razões, uma boca sem cáries é sem dúvida um estímulo para o correto desenvolvimento da criança e da sua saúde em geral.

A Odontopediatria é a área da Medicina Dentária responsável pela promoção da saúde oral em bebés, crianças e adolescentes. Tem como principal objetivo a manutenção de uma dentição saudável e funcional até à idade adulta. O Odontopediatra dispõe de técnicas de abordagem ao paciente e de manejo de comportamento que visam desmistificar a ida ao dentista e tornar os tratamentos dentários numa experiência positiva. Ainda assim, o ideal é que a primeira consulta seja realizada de forma preventiva, sem cáries e sem dor. O Odontopediatra tem um papel importante na orientação de crianças e pais no controlo de placa bacteriana e na aquisição de corretos hábitos de higiene oral. Realiza também tratamentos preventivos que aumentam a resistência dos dentes para que as crianças possam crescer com uma boca sem cáries.

“A infância é o período de construção de hábitos e valores”. Daí a importância de intervirmos precocemente para que as crianças possam crescer dando o devido valor à sua saúde oral e, acima de tudo, possam sorrir.... Sorrir sem dor, sorrir com confiança, sorrir com um sorriso saudável.... nesse sorriso único, sincero e especial que é o Sorriso de uma Criança.

E NÃO SE SAUDARAM NA PAZ DE CRISTO...

ANABELA BORGES 
Desta vez, decidi dar-vos a conhecer, em “tranches”, o meu conto A Tundra (cemitério de memórias), premiado e publicado em 2011 pela editora Alfarroba. É um conto pelo qual tenho um apreço especial, já que, além de se tratar da minha primeira publicação, constitui um verdadeiro epítome do que são as minhas raízes, as pessoas e o lugar onde nasci; o meu norte e o Norte; raízes do profundo Portugal. Aqui vai:

E não se saudaram na paz de Cristo.
Lisinha baixava os olhos. Afligia-se por dentro numa aparente quietude, cruzava os braços curtos, os ombros ligeiramente encolhidos, esperava que o padre encerrasse a celebração, fazia o sinal da cruz e saía, muito lesta, a cabeça levantada, sem um pinto de cabelo branco à vista, no volume preparado com mise.
Até mais ver, senhores”, era o adeus apressado, atirado para os que se demoravam em conversas, no frescor indolente de mais um domingo acabado de nascer.
As missas assim não eram a mesma coisa. Não eram completas. Não se podiam as pessoas benzer com água benta, nem beijar, nem mesmo podiam comungar. Não, não eram verdadeiras missas.
Lisinha caminhava pensativa, as ancas a rolarem sobre as pernas curtas, “Bom dia, como está?”. Caminhava. Movia-se pela berma da estrada, passando, primeiro, pelas casas afidalgadas, devidamente gradeadas, exalando o cheiro adocicado do jasmim, que subia lentamente como se por ali rondasse mulher distinta e misteriosa, e do alecrim, que espalhava em redor o seu poder contra o mau-olhado, competindo com as malcheirosas arrudas, a esticar as suas pontas finas como dedos em direcção às portas das casas baixinhas, em pedra de cantaria, degradadas, com as chaminés a expelirem os cheiros untuosos do assado de domingo, ou dos rojões, ou do cozido, pelos caminhos de terra que Lisinha atravessava a seguir, “Até mais ver, se deus quiser”, metendo-se, por fim, pelo comprido canelho que a conduzia a sua casa, ligeiramente inclinado, escondido entre as ladeiras das talhadas irregulares dos quintais, exigindo cautela nos passos, por causa das pedras soltas e das finas raízes contorcidas que se espalhavam como gadanhas traiçoeiras, a sussurrar quem se mete por atalhos.
Passada a estreita vereda, Lisinha chegava ao seu domínio: o terreiro espaçoso, a casa robusta, as escadas largas em granito a subir para o quinteiro e daí para o sobrado, as grossas portas de madeira carcomida. Não era nenhum palacete. Era uma casa de muita lida, uma casa de comércio. Era o seu domínio. E era-o sobretudo ao domingo, quando se encontrava a sós com os seus pensamentos, na sua paz de espírito. E Lisinha vinha, o dissemos, particularmente pensativa, nesse dia, “Até mais ver, se deus quiser”, sem parar, sem se deter com a vizinhança, mais que fosse para dizer “Diz que vai estar bom, hoje. Disse no tempo. É bom para as vindimas. Até mais. Vamos tratar do almoço, que são horas”.            
Eram as missas que lhe andavam a fazer confusão. Sim, ela ouvia o que diariamente, na televisão, se dizia sobre esse diabo à solta, que tinha vindo do estrangeiro. Ouvia o que dizia a ministra da saúde, a senhora que tinha um ar de quem sabe sempre o que diz, com um sorriso sereno nos lábios; ouvia os doutores, de semblante carregado, que nem sempre pareciam tão seguros nos dizeres como a ministra; ouvia, enfim, os noticiários.
Lisinha sabia o suficiente sobre o bicho. Sabia que ele veio dos porcos e que dos porcos passou para as pessoas. Escondia-se atrás delas e punha-se-lhes às cavalitas, assim de um jeito que elas não o viam nem davam por ele, mas estava , imprevisível como a vida. Era negro como a noite e um tanto arroxeado, tinha cara de macaco e era um pouco felpudo. Mostraram uma imagem na televisão. E ela viu. Tinha uns braços fininhos, muito compridos e com muitos dedos para se agarrar bem. Assim andava, passando de pessoa para pessoa, multiplicando a sua figura, de tal forma que, por todo o mundo, era possível encontrar gente com ele às cavalitas. Depois, pesava-lhes como chumbo, dobrava-as, empalidecia-as, tirava-lhes as forças e atirava-as para os corredores dos hospitais, muito corcovadas, de olhos vermelhos como o diabo em pessoa, e daí para a cama. Alguns, mais tolhidos, mais fracos de físico, ou doentes dos órgãos, não resistiam ao ataque do malvado e vinham a falecer, pela força com que lhes comprimia os pulmões, ferindo-as com chios e arranhões de gatos, com amarfanhos de unhas aguçadas e invisíveis.
De demos, satanás, belzebus, tinhosos e mafarricos sabia Lisinha desde pequena. Figurou-se-lhe, desde cedo, que as fisionomias com que se apresentavam são as muitas de um anjo, um anjo negro e poderoso, o mais temido de todos os anjos. E não tinha medo. Cruzara-se muitas vezes com ele. Ele aparecia na forma de diferentes caretas, e Lisinha foi-o percebendo ao longo da vida, juntando visões atrás de visões, episódios atrás de episódios. No princípio, não sabia que ele podia andar por , no meio do povo, sem mais nem menos. Depois percebeu que sim. Andava. O diabo anda sempre. Aquele que raptou a menina e a manteve presa durante tantos anos, numa cave, e fez-lhe tanto mal, era um deles. Um diabo feito gente.
Uma vez, ela foi levantada por um, quando levava à cabeça um feixe de lenha recolhido entre o mato que o seu pai andava a cortar. Era um molho de lenha fina, escura e contorcida e era tão alto que parecia não ter fim, tão alto e desconjuntado, que nem ela sabia explicar como conseguia equilibrá-lo na cabeça. Lisinha não teria mais que onze anos. Estava um tempo sereninho, uma brisa morna sacudindo as folhas das carvalhas, na berma do caminho – o caminho que agora é estrada de asfalto, que conduz à cidade, que atravessa o percurso das casas afidalgadas com cheiro de mulher misteriosa (e as carvalhas ainda estão lá). Ele veio sem avisar, levantou Lisinha com a sua mão poderosa e transportou-a durante alguns minutos no ar, sempre a rodar, exibindo sobre ela o carão avermelhado, com um sorriso de orelha a orelha, os dentes muito largos e brancos a saírem-lhe dos lábios finos, o fogo a arder-lhe no olhar. Ninguém pôde acudir a Lisinha. Por mais que ela gemesse, com os braços curtos erguidos no ar, a segurar os paus engenhosamente postos uns sobre os outros, ninguém ouviu nem viu nada. Não havia, portanto, testemunhas. Tal facto, porém, não tornava o acontecimento menos digno de credibilidade e consideração, como a seguir veremos. Aqueles eram tempos em que se respeitavam os impulsos das forças maiores, viessem elas de onde viessem. Depois, a roda parou, a mão gigante pousou Lisinha muito direitinha com o molho à cabeça e ela seguiu o seu caminho, carregando, agora também, um desconforto frio e pesado no fundo da barriga, as ancas redondas a acelerarem-lhe o passo, a perna curta. Sem olhar para trás.
Vieram dizer-lhe que fora um remoinho, um torvelinho, coisas da natureza, que vão e vêm sem se dar conta. Pois, e então. Quem disser que nãomão do diabo nos rebuliços, pés-de-vento, ou buzaranhas, pode ser doido. E tinha razão.
Mais para a tardinha, Lisinha haveria de receber uma visita inesperada, que a transformaria para o resto dos seus dias, sem perceber que aquela pingadeira de sangue, que lhe sobrevinha pela boca do corpo, era também a natureza, que, marcando o seu compasso, cumpria o seu inequívoco papel de criadora. E quempãocriação. Lisinha rogou pragas ao maldito, limpando-se a toda a hora com as ásperas compressas de estopa, torcidas em água morna num alguidar metálico pousado rente à janela por onde entravam os últimos filtros de sol, no refúgio do seu quarto, no sobrado. Um desconforto frio e pesado no fundo da barriga, que ia e vinha. Sofreu em silêncio. Ou quase. Não podia evitar as imprecações, mas fazia-as em voz baixa, em jeito de esconjuro, num quase exorcismo, para talhar a grande enfermidade a que fora condenada. Ela sabia que, daí em diante, não seria a mesma. Havia nela o pressentimento de que se haviam acabado os dias de menina de colo de seu pai. Aquilo era feio. Tinha cheiro de pecado. podia ter mão do diabo. Não devia ter-lhe acontecido, “Maldito. Eu te esconjuro.” E jamais foi a mesma.


(para continuar…)