sexta-feira, 30 de outubro de 2015

HALLOWEEN

GABRIEL VILAS BOAS
Vivemos numa sociedade global. As tradições que seguimos já não são apenas aquelas que pertencem às nossas terras, aos nossos antepassados ou ao nosso país. Até porque nos tornamos muito mais críticos em relação a determinadas tradições, rejeitando algumas, deixando morrer outras, especialmente quando têm pouco que ver com os nossos valores.

Por outro lado, a vivência de qualquer tradição depende muito dos seus dinamizadores. E hoje a vida de uma tradição depende também do seu valor económico. É assim com o Natal (em detrimento da Páscoa), com o dia de São Valentim, com o Carnaval, com os Santos Populares. 

O Halloween ou Dia das Bruxas ganhou o seu espaço porque é uma mina para o comércio, mas também porque se dirige aos mais jovens e ganhou raízes na Escola, através da disciplina de Inglês. 

Não vejo nenhum mal nisso! Cada geração tem o direito a reconhecer-se em determinadas tradições e deixar no baú do esquecimento outras que pouco lhe dizem. Hoje ninguém censura o abandono da tradição taurina que Portugal teve muito arreigada durante grande parte do século XX. Não vejo porque censurar o Halloween apenas por ser uma tradição anglo-americana. As suas origens são celtas e sofreram ao longo dos séculos importantes variações, onde o pagão e o cristão se misturaram. Há, no entanto, um elemento nuclear nesta tradição, miscelânea de diversas origens: de uma maneira divertida, o ser humana quer enfrentar/afugentar a morte, espantá-la. É uma temática difícil de abordar junto dos jovens e esta festa, tão criticada por alguns por ser inglesa, acaba por fazer os jovens brincar com uma ideia que lhes podia parecer sinistra. 

Claro que a Escola foi forte dinamizadora desta tradição, promovendo atividades, eventos, festas. Mas isso nunca me pareceu mal. Mostrou uma tradição estrangeira que o marketing americano espalhou pelo mundo, como a coca-cola espalhou o pai natal vestido de vermelho e a troca de prendas no Natal. 

Gostaríamos que fossem as tradições portugueses a ter primazia? Que fosse colocadas em plano de relevância? Elas têm de valer por si e não apenas por serem portuguesas. Se os jovens não aderem a elas é porque deixaram de fazer sentido ou quem as dinamiza não as sabe promover. Mas nem sempre é assim. Por exemplo, na aldeia de Cidões, em Vinhais, que não tem mais de dezassete habitantes, são esperadas três mil pessoas durante este fim-de-semana para a festa da Cabra e do Canhoto. Com origens celtas, esta festa começa ao pô-do-sol do dia 31 de outubro e termina de madrugada com os rituais do acendimento da fogueira e a queima da cabra Matchorra num pote, com pão e vinho da terra. O ambiente é animado por música e danças tradicionais celtas e inclui a tradicional queima do bode, através do qual o povo quer simbolizar a queima das coisas más, do azar, das sombras. Como dizem em Cidões “Quem da cabra comer e ao Canhoto se aquecer, um ano de sorte vai ter!”. 

Este Halloween transmontano não se vende em lojas, não organiza bailes, mas atrai igualmente gente. Quando fazem sentido e são bem organizadas, as tradições não precisam de ter ciúmes umas das outras. Há espaço para todas e, além disso, nós pertencemos cada vez mais a um espaço cultural mais amplo.

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