sexta-feira, 26 de junho de 2015

PROCRASTINAR

GABRIEL VILAS BOAS
Procrastinar! É pecado que toda a gente já cometeu!

A palavra é difícil de pronunciar e o significado não é dominado pela maioria. Eu acho que é uma maneira chique e simpática de dizer engonhar. Claro que podia dizer “adiar”, “protelar”, mas acho que não era tão assertivo.

Procrastinar é uma arte que não está o alcance de qualquer um!

Os procrastinadores são pessoas analíticas, pois pensam em mil e uma maneiras de não fazer o que tem de ser feito. São igualmente bem relacionados já que fazem inúmeros contactos devido ao seu gosto de conversar. Numa empresa, revelam-se líderes natos na medida em que possuem uma retórica exemplar, falam com propriedade nas reuniões, findas as quais procuram distribuir as suas tarefas pelos colegas. Ficam com a mais simples para disfarçar, ao mesmo tempo que apregoam o grande esforço necessário para realizar tamanho encargo. Todos temos que concordar que são esforçados porque se empenham o máximo que conseguem para não trabalhar. Intensos como poucos. Descrevem uma tarefa banal como um projeto, um e-mail como uma sugestão de melhoria dos negócios da empresa e pedem duas semanas para concretizar uma atividade que outros fazem em duas horas. São ainda verdadeiramente empreendedores. Tão seriamente concebem a empresa como a sua segunda casa que abusam do telefone, da internet, dos táxis para tratar de assuntos particulares. E convém não esquecer uma última qualidade: são astutos. Quando percebem que foram apanhados, abrilhantam o currículo e procuram novo emprego onde possam voltar a tentar ascender a um cargo de gestor. A partir de então tornar-se-ão defensores da moral e do trabalho árduo, passando esses valores à sua equipa para que eles próprios não precisem de aplicá-los.

Procrastinar é um conflito entre o dever e o querer, em que a pessoa se dispõe a realizar várias tarefas, exceto aquelas que tem de fazer.

E por que procrastinamos? Fazemo-lo sempre que sentimos não ter recursos para realizar uma determinada tarefa, por falta de treino, inabilidade ou formação. Sempre que não nos sentimos seguros em relação às nossas prioridades, metas ou objetivos, fazemos uma gestão inadequada do tempo. Contudo convém deixar claro que o procrastinador não é um preguiçoso. O preguiçoso não quer fazer um trabalho, o procrastinador só quer adiá-lo.

Procrastinar traz um alívio imediato, mas não raras vezes esse prazer desaparece rapidamente e dá lugar à ansiedade, à culpa e à vergonha. A isso acresce o facto de tornarmos o dia seguinte mais stressante. É quase um dado científico a ideia de que procrastinar dá mais trabalho do que executar a própria tarefa. Mas na hora de procrastinar ninguém quer saber.

A vida é feita de pequenas e grandes tarefas que são agradáveis de executar, pelo que convém avaliar constantemente os custos do que atrasamos, antecipar benefícios futuros e superar o vício de adiar. Pequenos momentos de procrastinação são naturais; mais do que isso pode prejudicar relações pessoais e carreiras.

Que atitude deve ter, então, o procrastinador consciente?

O truque é estruturar, colocar outras tarefas que pareçam significativas e urgentes no topo da lista de afazeres, de modo a realizar as tarefas necessárias. Depois há que perder o medo de errar. Muitas pessoas procrastinam porque exigem tanto de si mesmas numa tarefa que acabam com receio de enfrentá-la. Aplique a regra dos cinco minutos e avance. Qualquer tarefa, por mais ingrata que seja, perde peso se decidir fazê-la apenas durante esse tempo. Se depois disso ainda se sentir motivado, continue.

Estabeleça prioridades. Por maior que seja o fluxo de trabalho, há que saber distinguir entre o que não deve ser adiado e as coisas menos urgentes ou importantes. Mantenha uma agenda realista e organizada. Sirva-se de post-its para lembrá-lo do que tem de ser feito impreterivelmente. Desenvolva a sua própria disciplina e não subestime o tempo necessário para a realização das tarefas. Desdobre o trabalho em tarefas menores e mais simples. Procure o lado positivo das coisas.

Se é um viciado em procrastinação e este tema deixa-o triste consigo, lembre-se que o mundo produziu muitos génios procrastinadores. Leonardo Da Vinci terminou poucos projetos em vida, pois saltava de projeto em projeto, sempre preocupado com um pormenor perfecionista que só ele via. Nem a Mona Lisa entregou. O famoso jornalista literário norte-americano Truman Capote demorou quase vinte anos a escrever o romance Answered Prayers, sem nunca chegar a terminá-lo. O escritor francês Vítor Hugo vencia a tendência para procrastinar ficando em casa nu, com as roupas escondidas pelo criado a seu pedido, de modo a não ter como sair e dedicar-se à escrita.

E Mark Twain orientava-se por uma máxima muito sui generis: «Nunca deixe para amanhã o que pode deixar para depois de amanhã.» Eu próprio procrastinei este texto durante dois meses!

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